MARCOS AURÉLIO MOTA JORDÃO[1]
MARIA BEATRIZ DOS SANTOS[2]
(coautores)
RESUMO: O presente artigo busca analisar o crime de feminicídio no Brasil e a (in)eficácia das políticas públicas de proteção às mulheres. Embora a promulgação de legislações como a Lei Maria da Penha e a Lei do Feminicídio tenham representado avanços significativos no combate à violência de gênero, os índices de violência letal contra mulheres continuam alarmantes. Este estudo investiga as lacunas na implementação dessas políticas públicas, destacando a ineficiência das redes de proteção e a persistência de fatores estruturais, como o machismo e a impunidade, que dificultam a erradicação do feminicídio. A pesquisa também explora a necessidade de uma abordagem interseccional quanto as desigualdades que afetam mulheres negras, indígenas, LGBTQIAPN+ e aquelas em situação de vulnerabilidade social. Por meio de uma análise crítica das normas legais e de dados estatísticos, o artigo busca identificar os principais entraves na aplicação das políticas públicas e propõe medidas que podem fortalecer o combate ao feminicídio, promovendo uma resposta mais eficiente e eficaz na proteção das mulheres.
Palavras-chave: violência; feminicídio; mulher; crime; proteção.
ABSTRACT: This article seeks to analyze the crime of feminicide in Brazil and the (in)effectiveness of public policies to protect women. Although the enactment of legislation such as the Maria da Penha Law and the Feminicide Law have represented significant advances in combating gender-based violence, rates of lethal violence against women remain alarming. This study investigates the gaps in the implementation of these public policies, highlighting the inefficiency of protection networks and the persistence of structural factors, such as machismo and impunity, which make it difficult to eradicate femicide. The research also explores the need for an intersectional approach to address inequalities that affect black, indigenous, LGBTQIAPN+ women and those in situations of social vulnerability. Through a critical analysis of legal standards and statistical data, the article seeks to identify the main obstacles in the application of public policies and proposes measures that can strengthen the fight against feminicide, promoting a more efficient and effective response to protecting women.
Keywords: violence; femicide; woman; crime; protection.
INTRODUÇÃO
O crime de feminicídio, definido como o assassinato de uma mulher em razão de seu gênero, é uma das formas mais extremas de violência de gênero e reflete a desigualdade estrutural que as mulheres enfrentam em sociedades patriarcais. Essa triste realidade que é altamente brutal, envolve o assassinato de mulheres, frequentemente motivado por dinâmicas de controle e dominação masculina, continua a ser um dos maiores desafios para a promoção dos direitos humanos e a igualdade de gênero no Brasil.
O Brasil, embora tenha avançado no reconhecimento legal da gravidade desse crime com a tipificação do feminicídio no Código Penal e a criação da Lei Maria da Penha, ainda apresenta corriqueiramente índices alarmantes de violência contra mulheres, demonstrando que as políticas públicas não têm sido plenamente eficazes em reverter esse quadro de violência sistêmica.
O movimento feminista e a sociedade civil têm se mobilizado em busca de justiça, destacando as deficiências no sistema de proteção às mulheres, a ausência de recursos adequados e o baixo índice de responsabilização dos agressores. Embora a Lei Maria da Penha tenha sido um marco importante, que visa coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, e a tipificação do feminicídio tenha trazido visibilidade para o assassinato de mulheres em contexto de violência de gênero, a realidade das vítimas frequentemente é caracterizada pela impunidade e pela falta de efetividade nas medidas de proteção. O sistema de justiça, por muitas vezes, falha em garantir que as mulheres ameaçadas ou em risco de morte sejam adequadamente protegidas, resultando em tragédias que poderiam ter sido evitadas.
Este artigo visa analisar a (in)eficácia das políticas públicas de proteção às mulheres, com ênfase na prevenção e enfrentamento do feminicídio, abordando as lacunas nas estratégias de combate à violência de gênero, destacando a resistência cultural à mudança, a persistente visão patriarcal de algumas autoridades e a escassez de recursos e apoio adequado às mulheres. A falta de uma rede de proteção integrada, que envolva desde a polícia até a assistência social e justiça, tem se mostrado um obstáculo considerável para garantir que a mulher em situação de violência consiga acessar os direitos e o apoio de que necessita para romper o ciclo de violência. Ressalta-se a importância da implementação de políticas públicas de caráter preventivo e de acolhimento das vítimas, com capacitação dos profissionais da rede de atendimento, visto ser um ponto crucial para a efetividade dessas políticas.
Faz-se necessário analisar as políticas públicas de forma reflexiva a fim de averiguar sobre as necessidades específicas das mulheres que se encontram em situações de maior vulnerabilidade, como as mulheres negras, indígenas, LGBTQIAPN+, em situação de rua, e aquelas que vivem em contextos de extrema pobreza. Essa abordagem interseccional[3] e decolonial é essencial para garantir que todas as mulheres, independentemente de sua classe, raça, etnia ou identidade sexual, possam acessar políticas públicas que efetivamente as protejam e as possibilitem viver sem medo de violência.
Assim, para que haja a construção de uma sociedade livre de violência, que respeite os direitos das mulheres, é necessário um compromisso social contínuo com a mudança estrutural das políticas públicas, garantindo que todas as vítimas de violência de gênero sejam atendidas com dignidade e justiça.
1. O FEMINICÍDIO NO BRASIL: CONCEITO, CAUSAS E CARACTERÍSTICAS
O feminicídio, antes de mais nada, é uma decorrência progressiva de atos de violência contra a mulher. Bitencourt e Adorno trazem a melhor definição para violência contra a mulher destacando a habitualidade e durabilidade das condutas reprováveis de um agressor contra a mulher (2016, p. 102), conforme trecho abaixo:
Destacamos, em especial, a violência contra a mulher, por ser mulher, uma das mais graves formas de agressão ou violação, pois lesa a honra, o amor próprio, a autoestima, e seus direitos fundamentais, apresentando contornos de durabilidade e habitualidade; trata-se, portanto, de um crime que deixa mais do que marcas físicas, atingindo a própria dignidade da mulher, enquanto ser humano e enquanto cidadã, que merece, no mínimo, um tratamento igualitário, urbano e respeitoso por sua própria condição de mulher.
A culminância de tais atos, quando o Estado não consegue preventivamente impedir, é justamente o feminicídio.
Antes de conceituar-se feminicídio[4], contudo, é necessário distinguí-lo de femicídio. Espíndola (2018, p. 167-168) leciona que ambas as palavras já foram comumente aplicadas como sinônimas. Contudo, hodiernamente, femicídio é colocado como o simples homicídio de uma mulher. Já a expressão feminicídio, que foi cunhada pela antropóloga e feminista mexicana Marcela Lagarde[5], justamente a partir do termo femicídio (em inglês, femicide), é utilizado, assim como idealizado por Diana Russell, para descrever o assassinato de mulheres pelo simples fato de serem mulheres. O que denota sua torpeza.
Lagarde, entretanto, ampliou o conceito – conferindo “[...] ao termo um caráter político, considerando-o como um crime de Estado” (Silva; Chaves, 2024, p. 5) – revelando, assim, as mortes de mulheres ocorridas em um contexto de impunidade e conivência do Estado. Para a referida autora[6], o feminicídio não se limita ao ato individual de matar uma mulher, mas envolve a omissão, a negligência e a conivência das autoridades estatais, que falham em garantir segurança à vida das mulheres, configurando-se como um crime de Estado (Campos, 2015, p. 106).
Na visão jurídica brasileira, contudo, feminicídio refere-se ao assassinato de mulheres em razão do gênero, “[...] tanto no contexto doméstico de subordinação, quanto naquele provocado por pessoa desconhecida” (Silva; Chaves, 2024, p. 6). Trata-se de uma manifestação extrema de violência de gênero, caracterizada pelo ódio, desprezo ou sentimento de perda de controle sobre a mulher. Conforme explica Silva e Silva (2021, p. 68), “feminicídio é o homicídio doloso praticado contra a mulher por ‘razões da condição de sexo feminino’, ou seja, desprezando, menosprezando, desconsiderando a dignidade da vítima enquanto mulher, como se as pessoas do sexo feminino tivessem menos direitos do que as do sexo masculino”. Essa definição destaca o caráter discriminatório do feminicídio e evidencia sua conexão com a desigualdade de gênero historicamente imposta às mulheres.
Tal conceito foi introduzido no nosso ordenamento jurídico, após “pressão social exercida pelos movimentos feministas” (Silva; Fernandes, 2024, p. 4), pela primeira vez com a Lei nº 13.104, de 9 de março de 2015[7], que alterou o Código Penal Brasileiro para incluir o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio, além de o incluir no rol dos crimes hediondos (Brasil, 2015). O antigo § 2º-A do artigo 121, do Código Penal Brasileiro, considerava feminicídio o homicídio praticado contra a mulher por razões da condição de sexo feminino. Ou seja, trazia apenas uma qualificadora ao tipo do homicídio, que dava um caráter secundário a pena. Apesar das razões do fato delituoso serem a condição de sexo feminino e perpetrarem-se com violência doméstica e familiar ou menosprezo e discriminação à condição de mulher, o juízo de reprovabilidade da conduta tinha por base apenas o “matar alguém”.
Com a Lei nº 14.994, de 9 de outubro de 2024, – passando o feminicídio a ser “[...] tratado com a seriedade e a gravidade que merece, considerando a vulnerabilidade das mulheres e a necessidade de prevenção e punição efetivas” (Silva; Chaves, 2024, p. 5) –, destarte, o legislador elevou-o de mera qualificadora para tipo penal previsto no novel art. 121-A, passando a reprovar de forma primária a conduta de “matar mulher” por razões da condição do sexo feminino, trazendo uma penalidade mais rigorosa.
Assim, o feminicídio é um crime hediondo previsto no Código Penal brasileiro, no artigo 12-A, trazendo em seu §1º norma interpretativa que esclarece quando há razões da condição do sexo feminino para caracterizar referido tipo. Apresentando-se, ainda, as agravantes do delito disciplinadas no parágrafo 2º. A Lei 14.994/2024, conhecida como "Pacote Antifeminicídio", aumentou a pena para este crime, que passou a ser de 20 a 40 anos de reclusão, conforme se expõe a seguir:
Art. 121-A. Matar mulher por razões da condição do sexo feminino:
Pena – reclusão, de 20 (vinte) a 40 (quarenta) anos.
§ 1º Considera-se que há razões da condição do sexo feminino quando o crime envolve:
I – violência doméstica e familiar;
II – menosprezo ou discriminação à condição de mulher.
§ 2º A pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime é praticado:
I – durante a gestação, nos 3 (três) meses posteriores ao parto ou se a vítima é a mãe ou a responsável por criança, adolescente ou pessoa com deficiência de qualquer idade;
II – contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos, com deficiência ou portadora de doenças degenerativas que acarretem condição limitante ou de vulnerabilidade física ou mental;
III – na presença física ou virtual de descendente ou de ascendente da vítima;
IV – em descumprimento das medidas protetivas de urgência previstas nos incisos I, II e III do caput do art. 22 da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha);
V – nas circunstâncias previstas nos incisos III, IV e VIII do § 2º do art. 121 deste Código. (Brasil, 1940).
A inclusão do feminicídio no ordenamento jurídico brasileiro, pois, reflete o reconhecimento do Estado quanto à gravidade da violência de gênero e à necessidade de mecanismos legais específicos para combatê-la (Campos; Fonseca, 2018). O tratamento jurídico diferenciado tem por objetivo coibir práticas que historicamente foram naturalizadas pela sociedade patriarcal, impondo penas mais severas para quem comete esse tipo de crime.
As razões que levam ao feminicídio são múltiplas, mas de forma unânime sabemos que é uma consequência da cultura machista e patriarcal[8] que acomete a sociedade até os dias atuais. A ponto de já ter sido defendido de forma frequente, na perspectiva de um “discurso jurídico-patriarca” (Silva; Fernandes, 2024, p. 8), em Sessões do Tribunal do Júri de todo o país, a tese defensiva da legítima defesa da honra com o intuito desconcertante da absolvição de feminicidas (Silva; Fernandes, 2024, p. 2). Tese esta que, felizmente, foi declarada inconstitucional[9], pelo STF (Supremo Tribunal Federal), na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº. 779 – ADPF nº 779 –, proposta pelo PDT – Partido Democrático Trabalhista – em 2021.
No mais, Gerda Lerner (2019, p. 290) leciona que o patriarcado significa a manifestação e institucionalização da dominância masculina sobre as mulheres e crianças na família e a extensão da dominância masculina sobre as mulheres na sociedade em geral. Tal denominação propõe que os homens têm o poder em todas as instituições relevantes da sociedade e que as mulheres são privadas de acesso a esse poder.
Assim, desde parceiros excessivamente ciumentos aos motivos como rompimentos de relacionamentos; masculinidade tóxica; dependência econômica; controle e posse junto com a ideia de que a mulher é “propriedade” do companheiro; e, principalmente, a normalização da violência, são fatores determinantes para que haja o crime de feminicídio. A normalização da violência, pior dentre tais fatores, se dá quando a sociedade minimiza a violência doméstica, tratando, por exemplo, a briga entre marido e mulher como algo que não seja crime. Essa naturalização da violência permite que agressões se agravem até chegar ao ponto de se tornar um feminicídio.
Contudo, entre as vítimas mais vulneráveis estão as mulheres negras, que representam a maioria dos casos de feminicídio no Brasil. De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (2023), essas mulheres são as principais vítimas de homicídios decorrentes de violência de gênero. Isso se deve ao racismo estrutural, que, aliado ao sexismo, coloca as mulheres negras em uma situação de maior vulnerabilidade social e econômica, dificultando o acesso a redes de proteção, oportunidades de emprego e mecanismos de justiça (Almeida, 2019).
Além disso, mulheres indígenas, que muitas vezes vivem em territórios com pouca ou nenhuma presença do Estado, também são vítimas recorrentes de violência extrema e letal. A ausência de políticas públicas efetivas nas terras indígenas agrava a situação, expondo essas mulheres a múltiplas formas de violência (Brasil, 2023).
Outro aspecto que muitas vezes é omitido[10] no que se refere ao combate à violência de gênero é o relativo as mulheres trans e travestis que, por sua vez, enfrentam a transfobia estrutural e a marginalização social, devido a sua vulnerabilidade social[11], tornando-se alvos de uma violência extrema que frequentemente resulta em morte. Segundo o Dossiê da ANTRA (2024), o Brasil lidera o ranking mundial de assassinatos de pessoas trans pelo 15º ano consecutivo, revelando um padrão de violência que se mistura à intolerância e à tentativa de controle dos corpos e existências dissidentes.
Para a população LGBTQIAPN+, a violência de gênero é atravessada por uma violência de ódio. Sabe-se que as violências sofridas por travestis e mulheres trans são também marcadas por processos de exclusão e criminalização das suas identidades, tornando-as vítimas potenciais de feminicídio social e institucional. Neste sentido, plenamente viável torna-se defender-se a subsunção do tipo feminicídio às condutas que ceifam as vidas de referido grupo vulnerável, haja vista que há “[...] precedentes doutrinários para aplicabilidade da Lei do Feminicídio para pessoas trans, ampliando a possibilidade de apoio a esse público no sistema de justiça”[12] (Santos; Nobrega; Beiras, 2024, p. 165).
Apesar da existência da Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) e a Lei do Feminicídio (Lei nº 14.994/2024), a efetivação dos direitos e a proteção das mulheres ainda enfrentam muitos obstáculos. As falhas na implementação de políticas públicas, a insuficiência de delegacias especializadas e de casas de acolhimento, além da morosidade do sistema de justiça, postergam um cenário de vulnerabilidade e impunidade.
É de extrema essencialidade que o combate ao feminicídio e à violência de gênero tenham por primazia tornar adequadas e suficientes as estruturas institucionalizadas de concretização dos preceitos legais de proteção da mulher. Do contrário, conforme enfatiza Almeida (2024, p. 206-207), a Lei Maria da Penha – e aqui inclui-se todo o sistema legislativo de proteção à mulher contra violência – passa a correr o risco de se tornar predominantemente simbólico.
2. AS POLÍTICAS PÚBLICAS DE PROTEÇÃO ÀS MULHERES: AVANÇOS E LIMITAÇÕES
Sabemos que para que haja efetividade no enfrentamento a violência doméstica e consequente combate ao feminicídio, é necessário que as políticas públicas voltadas para a proteção das mulheres sejam mais eficazes. A aplicação da Lei Maria da Penha deve acima de tudo buscar resguardar as vítimas da extremidade da violência, que pode ser letal.
O movimento feminista atuou de forma estratégica para denunciar, politizar e dar visibilidade à violência doméstica e familiar contra as mulheres, historicamente silenciada e tratada como um problema privado, sendo de intensa importância para a criação da Lei nº 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha (LMP). Assim, o movimento feminista no Brasil passou a denunciar publicamente a violência de gênero, criando espaços de escuta e acolhimento para mulheres em situação de violência. É de suma relevância destacarmos que o protagonismo das mulheres feministas foi essencial não só para a criação da lei, mas também para a mudança de paradigma que ela representa no ordenamento jurídico brasileiro.
O movimento feminista foi um ator fundamental no processo de elaboração e aprovação da lei denominada Maria da Penha. A Lei Maria da Penha tipificou a violência, denominando-a violência doméstica e a definiu como qualquer ação ou omissão baseada no gênero que cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual, psicológico e dano moral ou patrimonial às mulheres, ocorrida em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. […] A Lei Maria da Penha trouxe a possibilidade de instaurar medidas mais rigorosas em relação aos agressores, não havendo mais a possibilidade de julgamento das violências de gênero como crimes de menor potencial ofensivo e as punições corresponderem a cestas básicas ou serviços comunitários como previa a Lei 9099/5. Esse endurecimento que a Lei representou instigou um intenso debate no cenário nacional, no qual o movimento de mulheres considera que não se pode deixar de responsabilizar os autores e enfatiza o aumento da vulnerabilização das vítimas em situações de impunidade, enquanto outros atores argumentam que os conflitos de gênero não podem ser tratados somente no âmbito criminal. (Meneghel; Mueller; Collaziol; Quadros; 2013, p. 693)
A Lei Maria da Penha foi um marco importante no ordenamento jurídico brasileiro. Segundo Santos (2024, p. 15), a referida lei, ao instituir medidas protetivas de urgência e prever penas mais severas para os agressores, visou garantir a proteção das mulheres e criar mecanismos para prevenir a violência doméstica. A eficácia dessa legislação foi, em parte, alcançada com a criação de novos instrumentos como as Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs) e a implementação do serviço de "Ligue 180", que funciona como um canal de denúncias e orientações.
Já a Lei do Feminicídio, por sua vez como vimos, define como homicídio qualificado o assassinato de mulheres motivado por questões de gênero, ampliando o reconhecimento jurídico de que a violência contra a mulher não é apenas um ato isolado de brutalidade, mas uma manifestação de relações desiguais de poder. Tal previsão legal – implementada pela Lei nº 13.104/2015 – tornou-se essencial pois enfatiza a conduta do feminicídio como crime qualificado, buscando, além de punir, dar “visibilidade” (Santana, 2019, p. 53) à grave violação dos direitos humanos que envolve a morte de mulheres em contextos de desigualdade de gênero.
Apesar dos avanços legislativos e da criação de programas voltados à proteção das mulheres, a implementação dessas políticas encontra obstáculos significativos. A efetividade da Lei Maria da Penha encontra barreiras pela ausência de estrutura nas áreas mais afastadas do Brasil, principalmente em municípios de menor porte, onde os recursos são escassos e consequentemente a infraestrutura para atender as vítimas de violência doméstica são precárias. Some-se a essa conjuntura a morosidade do sistema judiciário brasileiro, que diante de decisões tardias, não garantem a proteção imediata que necessitam as mulheres.
Outro ponto relevante é o desafio do contexto social e cultural em que a mulher está inserida. Onde a possessividade exercida pelo companheiro e as práticas machistas e a ideia de posse sobre o corpo da mulher ainda prevalecem em muitas regiões do país. Dessa maneira, o contexto cultural machista e patriarcal no Brasil não pode ser desconsiderado na análise das políticas públicas de proteção às mulheres.
Ainda que existam avanços no campo legislativo, como a implementação da Lei Maria da Penha e a Lei do Feminicídio, e institucional, sem uma mudança profunda nas estruturas sociais e culturais, a eficácia das políticas públicas será limitada. É necessário que haja um grande avanço das estruturas sociais para que não haja falha na aplicação dessas leis, a ausência de subnotificação de casos de violência doméstica, a cultura machista enraizada e a ineficácia do sistema de justiça. Assim, faz-se necessário um investimento contínuo em educação para a igualdade de gênero, campanhas de conscientização, formação dos profissionais do sistema de justiça e o fortalecimento das redes de apoio, com o objetivo de desconstruir os padrões de dominação que legitimam a violência contra a mulher, além de garantir que as mulheres tenham acesso a uma rede de proteção eficiente e que a violência de gênero seja efetivamente combatida.
3. O IMPACTO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS NA PREVENÇÃO DO FEMINICÍDIO: UMA ANÁLISE CRÍTICA
O feminicídio constitui uma das formas mais extremas de violência patriarcal. Sua ocorrência revela falhas estruturais no sistema de proteção às mulheres, bem como a insuficiência de políticas públicas de prevenção e combate à violência de gênero (Rodrigues, 2024, p. 12). A Lei nº 14.994/2024, que incluiu o feminicídio no rol dos crimes hediondos, representou um avanço legislativo importante, mas, como vimos, ainda é necessário que haja um avanço maior nas políticas públicas voltadas à proteção das mulheres vítimas de violência doméstica.
Isso porque os índices de violência letal contra mulheres permanecem alarmantes no Brasil. Em 2022, por exemplo, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (2023), foram registrados 1.437 feminicídios, com um aumento de 6,1% em relação ao ano anterior, o que indica desafios persistentes na efetividade das políticas públicas.
Embora o Brasil conte com um arcabouço normativo robusto, incluindo a Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) e a Lei do Feminicídio (Lei nº 14.998/2024), a implementação dessas normas tem se mostrado desigual e insuficiente. Como aponta Saffioti (2015, p. 146), " a violência é constitutiva das relações entre homens e mulheres, na fase histórica da ordem patriarcal de gênero (Saffioti, 2001), ainda em curso", o que exige uma atuação do Estado que vá além da simples penalização dos agressores. É necessário criar uma estrutura capaz de prevenir a violência de forma eficaz.
Os dados revelam que onde há maior investimento em políticas de proteção, há uma redução nos índices de feminicídio. E isso se constata com os dados da taxa de homicídios femininos referentes a cada 100 mil habitantes e que teve queda entre os anos de 2004 e 2018, devido a ampliação da rede de Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs) (Arroyo; Signor, 2024, p. 150).
Entretanto, essa realidade não se repete de forma uniforme no território nacional. Estados da Região Norte e Nordeste apresentam altas taxas de feminicídio, evidenciando a carência de recursos, infraestrutura e capacitação de profissionais no enfrentamento à violência (Silva, 2025, p. 17). A ausência de políticas públicas eficazes nesses locais compromete o acesso das mulheres aos serviços de proteção e acolhimento.
Nem se repetiu na Pandemia da Covid-19, conforme denunciou o Ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes ao relatar que “[...] 66% dos feminicídios ocorreram na casa da vítima e 3% na do agressor. Em 97% dos casos, afirmou, não havia qualquer medida protetiva contra o agressor” (STF, 2022). O que revela ainda mais a deficiência estrutural do Estado para suprir as demandas de proteção à mulher.
A despeito dos avanços legislativos, a implementação efetiva das políticas públicas de prevenção ao feminicídio ainda é um desafio no Brasil. A Lei Maria da Penha, embora seja considerada pela Organização das Nações Unidas (ONU) uma das legislações mais avançadas do mundo, sofre com falhas na aplicação. Piovesan (2015, p. 128) argumenta que “a legislação inovadora não é suficiente sem a estruturação adequada dos serviços e sem a formação contínua dos agentes públicos envolvidos”.
Outrossim, entre as principais limitações, podemos destacar: a insuficiência das Delegacias Especializadas de Atendimento À Mulher (DEAMs), tendo em vista que em muitos municípios brasileiros, essas delegacias não existem ou funcionam de forma bastante precária, contando com a ausência de uma equipe que proporcione atendimento multidisciplinar à mulher vítima de violência doméstica, somando-se a carência de abrigos e casas de acolhimento temporário para mulheres em situação de risco. De acordo com o IBGE, em 2018 o Brasil contava com apenas 2,4% de seus municípios com casas de abrigo, número insuficiente frente a demanda nacional (IBGE, 2019).
Além disso, um dos pontos principais que compromete a eficácia das políticas públicas voltadas ao combate à violência doméstica é a precariedade da integração entre os serviços de justiça, saúde, assistência social e segurança pública. Diante da complexidade do fenômeno do feminicídio, torna-se fundamental adotar uma perspectiva interseccional na formulação e implementação de políticas públicas. Ribeiro (2021, p. 41), alarmando-se com o aumento da violência contra a mulher divulgado pelo Mapa da Violência 2015 relata que “esse aumento alarmante nos mostra a falta de um olhar étnico racial no momento de se pensar políticas de enfrentamento à violência contra as mulheres, já que essas políticas não estão alcançando as mulheres negras”.
Por se saber que a maioria das mulheres que são acometidas pelo feminicídio no Brasil são negras e indígenas, evidenciando-se sua maior vulnerabilidade, torna-se imprescindível realizar uma análise interseccional no estudo da violência de gênero. Essa perspectiva permite compreender que o feminicídio, mais do que um crime de gênero, é também um fenômeno marcado por desigualdades raciais e socioeconômicas. Conforme o Atlas da Violência (Cerqueira; et al., 2023, p. 95), 65,5%, das mulheres vítimas de feminicídio, em 2021, eram negras, e em 2023, o percentual de referidas vítimas negras passou para 68,2% (Cerqueira; et al., 2025, p. 57), o que demonstra a necessidade de políticas específicas para enfrentar o racismo estrutural aliado ao machismo.
Além das mulheres negras, as indígenas também se encontram em situação de risco agravado. Segundo dados do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), há uma crescente nos casos de violência doméstica e feminicídios dentro das comunidades indígenas, muitas vezes invisibilizados pelo Estado e pela sociedade (CIMI, 2022). A ausência de políticas públicas específicas e de serviços de proteção culturalmente adequados torna essas mulheres ainda mais vulneráveis (Gonzalez, 1988).
Já as mulheres transgêneros sofrem dupla[13] violência. Primeiramente pelo preconceito de gênero, que as acometem pelo simples fato de serem mulheres trans, e, de outra forma, também por serem mulheres. Fazendo parte, portanto, dos altos índices de violência a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA, 2023) relatou que, em 2022, o Brasil foi responsável por 35% dos assassinatos de pessoas trans no mundo, demonstrando a necessidade de políticas públicas inclusivas que contemplem essa população.
Desta maneira, é essencial que haja a ampliação do atendimento especializado para mulheres negras, indígenas, quilombolas, trans, com profissionais que sejam capacitados para lidar com as especificidades de cada grupo. Além disso, é importante que se crie programas de prevenção interligados com a educação de gênero e direitos humanos em escolas e comunidades, a fim de que seja respeitada a diversidade cultural e social dessas populações (Gonzalez, 1988).
4. CONCLUSÃO
Embora o Brasil conte com um aparato legal avançado no enfrentamento à violência de gênero, a análise crítica revela que as políticas públicas ainda não são suficientes para prevenir efetivamente o feminicídio. E pior, com a persistência histórica de aumento dos feminicídios, podendo tal aparato legal chegar a um status indesejado de norma com caráter simbólico. Neste sentido, persistem desafios estruturais relacionados à falta de integração entre serviços, precariedade na implementação das políticas e ausência de abordagem interseccional que contemple as especificidades de mulheres em diferentes contextos de vulnerabilidade.
Apesar da existência de um arcabouço jurídico avançado, composto pela Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) e pela Lei do Feminicídio (Lei nº 14.994/2024), as políticas públicas de proteção às mulheres ainda enfrentam sérios desafios em sua implementação e efetividade. Os dados estatísticos e os estudos abordados ao longo do presente trabalho confirmam que a violência letal contra mulheres persiste em níveis alarmantes, com um impacto desproporcional sobre mulheres negras, indígenas, LGBTQIAPN+ e outras em situação de vulnerabilidade social.
Foi possível verificar que há grandes falhas estruturais do Estado, expressas na insuficiência de recursos, na precariedade das redes de acolhimento e na falta de capacitação dos agentes públicos, dificultam o acesso das mulheres à justiça e aos serviços de proteção. A morosidade do sistema judicial, a tornam mais grave a situação, contribuindo para a prolongação da impunidade e para a naturalização da violência de gênero no contexto brasileiro.
Além disso, percebemos que a cultura machista do patriarcado ainda é presente na sociedade atual. E por meio dela há também obstáculos à eficácia das políticas públicas. A persistência de valores e práticas que reforçam a dominação masculina e a objetificação da mulher evidencia a necessidade de ações educativas e campanhas de conscientização que promovam a igualdade de gênero e desconstruam os padrões culturais que legitimam a violência.
Diante desse cenário, torna-se imprescindível adotar uma abordagem interseccional na formulação e implementação das políticas públicas de prevenção ao feminicídio, considerando as múltiplas opressões que atravessam a vida das mulheres, em especial as negras, indígenas, trans e em situação de pobreza.
Por fim, o fortalecimento das políticas públicas exige compromisso político, investimento financeiro e atuação conjunta do Estado e da sociedade civil, em especial dos movimentos feministas, que historicamente desempenham papel central na luta pelos direitos das mulheres e pela erradicação da violência de gênero. A erradicação do feminicídio exige mudanças estruturais profundas, que envolvam não apenas o sistema jurídico e institucional, mas também uma transformação cultural capaz de garantir às mulheres uma vida livre de violência e discriminação.
Por fim, ao se analisar de forma crítica o cenário atual, nos é permitido apontar algumas propostas concretas para a melhoria e consequente eficácia das políticas públicas de prevenção ao feminicídio no Brasil, são elas:
a) ampliar e interiorizar da rede de apoio às mulheres, a fim de que haja segurança e acolhimento nos atendimentos;
b) investir em campanhas educativas que visem a prevenção da violência doméstica, proporcionando a desconstrução de padrões culturais machistas, buscando a promoção da equidade de gênero desde a infância;
c) capacitar equipes que prestam serviços não diretamente relacionados à violência doméstica e familiar a identificarem situações de violência e a oferecerem suporte para que essas mulheres consigam interromper o ciclo da violência (Silva; Alves, 2024, p. 13).
d) universalização das Delegacias Especializadas em Atendimento às Mulheres, para que todas as mulheres que sejam acometidas pela violência doméstica possam ter seu direito garantido a fazerem denúncias e buscarem proteção e justiça;
e) “inclusão no ordenamento nacional, pela via constitucional, da possibilidade, excepcional, do Delegado ou Autoridade Policial, de forma indiscriminada e ampla, deferir no momento da ocorrência da violência doméstica ou familiar a Medida Protetiva de Urgência de afastamento do lar, quando constatado risco atual ou iminente à vida ou a integridade da mulher e seus dependentes” (Almeida, 2024, p. 218), com homologação posterior do juiz;
f) Onde não houverem unidade judiciais especializadas em violência contra a mulher, instituir núcleos de assessoria especializada às varas judiciais – Varas Únicas ou Criminais – para garantirem a atenção e celeridade essenciais a concretização das Medidas Protetivas de Urgência (Almeida, 2024, p. 218).
REFERÊNCIAS
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[1] Mestre em Direito Econômico pela UFPB – Universidade Federal da Paraíba; Especialista em Direito Constitucional, Administrativo e Tributário pela ESMAPE – Escola da Magistratura de Pernambuco, em parceria com a UNINASSAU – Universidade Maurício de Nassau; Especialista em Direito Empresarial pela Faculdade Legale; Professor do curso de Graduação em Direito no CESA – Centro de Ensino Superior de Arcoverde, mantido pela AESA – Autarquia de Ensino Superior de Arcoverde; E-mail: marcosjordao15@gmail.com.
[2] Pós-graduada em Direito da Mulher pela Faculdade Legale; Pós graduada em Direito Civil e Direito Penal pela Universidade Leonardo da Vinci; Pós graduada em Direito da Seguridade Social: Previdenciário e Prática Previdenciária; Graduada em Direito pela ASCES-UNITA; Graduanda em Licenciatura em História pela Universidade Federal Rural de Pernambuco; Professora do curso de Graduação em Direito no CESA – Centro de Ensino Superior de Arcoverde, mantido pela AESA – Autarquia de Ensino Superior de Arcoverde. É advogada e consultora jurídica. E-mail: mbsescritorioadv@gmail.com.
[3] Também assim entendem Santos, Nobrega e Beiras (2024, p. 160) ao tratar do assunto: “Partimos do pressuposto de que não é possível falar em feminicídio sem considerar intersecções entre gênero, raça e classe, pois diferentes mulheres são afetadas pelo fenômeno de formas distintas e as especificidades próprias das intersecções não devem ser ignoradas na abordagem do tema”.
[4] Saliente-se que existem críticas da doutrina, bem mais fortes quando tal violência contra a mulher era apenas uma qualificadora especial, quanto a utilização da terminologia feminicídio. Cezar Bitencourt e Vânia Adorno (2015, p. 103), por exemplo, são enfáticos ao dizerem: “Tecnicamente, a nosso juízo, é um erro grosseiro repetir a linguagem da imprensa afirmando “que foi criado um crime de feminicídio”, pois, na realidade, matar alguém continua sendo um homicídio, e tanto mulher, como homem, estão abrangidos por esse pronome indefinido, alguém, que não faz exceção a nenhum ser humano”. Inclusive dando a existência de um tipo penal específico de feminicídio o status de inconstitucional (Bitencourt; Adorno, 2015, p. 104).
[5] “Lagarde justifica a preferência pelo termo feminicídio em detrimento de femicídio, pois o primeiro revela as violações de direitos humanos que englobam os crimes contra a mulher” (Silva; Chaves, 2024, p. 5).
[6] A expressão feminicídio foi cunhada por Marcela Lagarde, a partir do termo femicídio (femicide) para revelar as mortes de mulheres ocorridas em um contexto de impunidade e conivência do estado. Para Lagarde, para que ocorra o feminicídio devem concorrer a impunidade, a omissão, a negligência e a conivência das autoridades do estado, que não criam segurança para a vida das mulheres, razão pela qual o feminicídio é um crime de estado. Assim, Lagarde introduz um elemento político na conceituação, isto é, a responsabilidade do estado na produção das mortes de mulheres. Embora existam diferenças conceituais entre femicídio e feminicídio vinculados ao contexto histórico em que foram elaboradoras, em geral, as duas expressões são tomadas como sinônimos pelas legislações latino-americanas e na literatura feminista (Campos, 2015, p. 106).
[7] “[...] marco em prol da visibilização da luta pelo fim da violência contra as mulheres no Brasil” (Silva; Fernandes, 2024, p. 27).
[8] Segundo Silva e Alves (2024, p. 5), “O homicídio qualificado pelo feminicídio é considerado como um crime proveniente da sociedade patriarcal, pelo fato da mulher ser considerada apenas um objeto de posse masculina, no qual o homem torna-se o detentor do direito de vida ou morte de sua parceira nos momentos de brigas intimas”.
[9] Contudo, Silva e Fernandes (2024, p. 2) informam que, em substituição a tese declarada inconstitucional da legítima defesa da honra, a “[...] defesa de uxoricidas passou a utilizar a tese do homicídio privilegiado, com o intuito de obter sanção mais branda1ou absolvição por clemência, ao alegar ter o réu agido sob o domínio de violenta emoção em razão da injusta provocação da vítima”, com arrimo nos “Princípios da Plenitude da Defesa e da Soberania dos Vereditos” (Silva; Fernandes, 2024, p. 5). Em contrapartida, no “[...] posicionamento majoritário da doutrina, a premeditação do homicídio não caracteriza a violenta emoção, visto que a reação à injusta provocação foi planejada” (Silva; Fernandes, 2024, p. 5). No mesmo sentido é a jurisprudência dos principais Tribunais de Justiça no país, como, por exemplo: EMENTA: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TENTATIVA DE FEMINICÍDIO E LESÃO CORPORAL EM CONTEXTO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. SOBERANIA DOS VEREDICTOS. RECURSO QUE DIFICULTOU A DEFESA DA VÍTIMA. HOMICÍDIO PRIVILEGIADO. DOSIMETRIA DA PENA. FRAÇÃO REDUTORA PELA TENTATIVA. TRIBUNAL DO JÚRI. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. FEMINICÍDIO TENTADO. DECISÃO NÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. RECURSO DEFENSIVO DESPROVIDO. [...]. 5. A alegação de domínio de violenta emoção foi corretamente afastada, em razão da premeditação demonstrada por mensagens ameaçadoras enviadas antes do crime. [...] Jurisprudência relevante citada: STJ, AREsp 2.549.240/DF, Rel. Min. Daniela Teixeira, 5ª Turma, j. 04.02.2025, DJEN 14.02.2025; TJMG, Súmula nº 28. (TJMG - Apelação Criminal 1.0000.23.271568-0/002, Relator (a): Des.(a) Haroldo André Toscano de Oliveira (JD Convocado) , Câmara Justiça 4.0 - Especiali, julgamento em 02/06/2025, publicação da súmula em 02/06/2025). (Grifo Nosso).
[10] Santos, Nobrega e Beiras (2024, p. 160), ao citarem vários autores, reconhecem que “[...] apesar da definição mais ampla de feminicídio, a literatura citada se refere, predominantemente, a mulheres cisgênero inseridas no espaço doméstico ou em relações íntimas de conjugalidade”.
[11] Ambar (2022, p. 74), ao tratar da questão da violência contra as pessoas LGBTQIAP+, leciona que “a vulnerabilidade social, principalmente em seu aspecto material, apresenta variadas formas, como exclusão e marginalização por moradia precária (ou em situação de rua), subemprego ou desemprego, gerando fome, doenças, desigualdades, preconceito, discriminação, prostituição, criminalidade, violência e mortalidade”.
[12] Precedentes jurisprudenciais, também, são no sentido de que a antiga qualificadora do feminicídio, no caso de vítimas que se reconhece como do gênero feminino, não se restringe a pessoa que nasceram com o sexo biológico feminino. Corrente a qual os autores desta obra se filiam.
[13] No mesmo sentido são Amorim e Guerra (2020, p. 221): “Verifica-se, portanto, que a mulher transgênica sofre uma dupla violência. A primeira decorre da transfobia; a segunda, do machismo. Desse modo, essas mulheres findam em um espaço mais marginal da sociedade sofrendo o preconceito e a violência por serem transexuais e por serem mulheres”.
Mestre em Ciências Jurídicas pela Veni Creator Christian University - VCCU; Pós-graduando em Direito Público: Constitucional, Administrativo, Tributário e Previdenciário pela UFPE - Universidade Federal de Pernambuco (Turma TJPE/ESMAPE); É Pós-graduado em Advocacia na Fazenda Pública pela LEGALE; em Execução de Ordens Judiciais pelo Centro Universitário Mário Pontes Jucá - UMJ; em Direito Processual Civil pela UNINASSAU, em parceria com a ESA-PE/OAB-PE; em Direito Público e em Direito do Estado pela Universidade Anhanguera-Uniderp; em Direito Ambiental pela Faculdade Venda Nova do Imigrante - FAVENI; em Perícia Judicial e Extrajudicial e Perícias de Avaliação Patrimonial de Bens e Direitos, pela FACUMINAS; e em Docência e Gestão da Educação a Distância pela Faculdade FOCUS. Graduando em Licenciatura em História pela Universidade Federal Rural de Pernambuco - UFRPE. Bacharel em Direito pela Associação Caruaruense de Ensino Superior - ASCES. É Oficial de Justiça do Tribunal de Justiça de Pernambuco - TJPE.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ALMEIDA, Wellington Santos de. Feminicídio e a (in)eficácia das políticas públicas de proteção às mulheres Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 16 set 2025, 04:48. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/69670/feminicdio-e-a-in-eficcia-das-polticas-pblicas-de-proteo-s-mulheres. Acesso em: 16 set 2025.
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