RESUMO: A presente monografia objetiva analisar a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 635 (ADPF 635), proposta no Supremo Tribunal Federal, como um marco de litigância estratégica concernente ao controle da letalidade policial no Brasil. O direito à vida, bem jurídico fundamental e inviolável, é amplamente garantido pelo ordenamento jurídico pátrio, estando resguardado pela Constituição federal de 1988 e pelos diversos Tratados Internacionais de Direitos Humanos dos quais o Brasil é signatário. No entanto, os índices de morte decorrentes de intervenções policias no país são alarmantes, atingindo especialmente a população negra e periférica, o que revela um quadro de violação de direitos humanos e a persistência da lógica necropolítica no exercício da segurança pública. Assim, a partir de uma abordagem qualitativa, a pesquisa examina a atuação do Partido Socialista Brasileiro (PSB), autor da ADPF 635, que buscou, através do controle concentrado de constitucionalidade, provocar o Supremo a adotar medidas estruturais para pôr fim à violência letal praticada por agentes estatais, valendo-se de dados estatísticos, jurisprudência e referenciais teóricos voltados à compreensão da litigância estratégica em matéria de direitos humanos.
Palavras-chave: Direitos Humanos; Necropolítica; ADPF 635; Litigância Estratégica.
ABSTRACT: This monograph aims to analyze the Claim of Non-Compliance with Fundamental Precept No. 635 (ADPF 635), proposed in the Supreme Federal Court, as a landmark of strategic litigation concerning the control of police lethality in Brazil. The right to life, a fundamental and inviolable legal right, is amply guaranteed by Brazil's legal system, protected by the 1988 Federal Constitution and the various International Human Rights Treaties to which Brazil is a signatory. However, the death rates resulting from police interventions in the country are alarming, particularly affecting Black and peripheral populations. This reveals a framework of human rights violations and the persistence of a necropolitical logic in the exercise of public security. Thus, from a qualitative approach, the research examines the actions of the Brazilian Socialist Party (PSB), author of ADPF 635, which sought, through concentrated control of constitutionality, to provoke the Supreme Court to adopt structural measures to put an end to lethal violence practiced by state agents, drawing on statistical data, case law, and theoretical frameworks aimed at understanding strategic litigation in human rights matters.
Palavras-chave: Human Rights; Necropolitics, ADPF 635; Strategic Litigation.
Ágatha Vitória Sales Félix, morta aos 08 anos no Complexo do Alemão. Jenifer Silene Gomes, morta aos 11 anos na Zona Norte do Rio de Janeiro. Kauan Peixoto, morto aos 12 anos durante uma operação policial em Mesquita, Kauã Rozário, morto aos 11 anos em Bangu. Kauê Ribeiro dos Santos, morto aos 12 anos no Complexo do Chapadão. Kelvin Gomes, morto aos 17 anos, vítima de bala perdida em Irajá.
À primeira vista, muitos podem considerar que se tratam de casos isolados. No entanto, tais episódios revelam um padrão de violência institucionalizada. A Corte Interamericana de Direitos Humanos, em decisão proferida em 16 de fevereiro de 2017, no caso Favela Nova Brasília v. Brasil, condenou o Estado Brasileiro por práticas de violência policial sistemática, destacando a predominância de vítimas fatais jovens, negras, pobres e desarmadas. (Corte Interamericana de Diretos Humanos, 2017).
Nesse contexto, a violência policial configura-se como uma grave violação de direitos humanos, constituindo um problema histórico no Brasil. Em resposta a essa realidade, o Partido Socialista Brasileiro (PSB) ajuizou a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 635 (ADPF), com o objetivo de combater a lógica necropolítica instaurada no país. Trata-se de um marco jurídico relevante, voltado à formulação de diretrizes que regulem a atuação das forças de segurança pública em conformidade com o ordenamento jurídico nacional e os compromissos internacionais de direitos humanos assumidos pelo Brasil.
A ampla repercussão da ADPF 635 mobilizou diversos atores sociais e institucionais a se habilitaram no processo judicial com o intuito de contribuir para a superação da grave crise enfrentada pelos moradores das periferias urbanas, especialmente no Rio de Janeiro. Esse esforço conjunto culminou na prolação da primeira decisão colegiada do Plenário do Supremo Tribunal Federal, por meio da homologação parcial de um plano de redução da letalidade policial, atualmente em vigor.
Diante desse cenário, a presente monografia tem como objetivo geral analisar a ADPF 635 como paradigma de litigância estratégica no país, visando à defesa dos direitos humanos. Como objetivos específicos, propõem-se: a) definir o conceito de litigância estratégica em direitos humanos e compreender o papel dos diversos atores na promoção desses direitos; b) apresentar um panorama da violência policial no país, associado à teoria da necropolítica, em confronto com os direitos garantidos pela Constituição Federal e nos Tratados Internacionais de Direitos Humanos nos quais o Brasil é signatário; c) examinar a ADPF 635, suas pretensões iniciais, seus fundamentos jurídicos e os resultados práticos obtidos, com base nos dados de segurança pública fornecidos pelo Ministério da Justiça.
Para alcançar tais objetivos, a metodologia adotada nesta monografia é de abordagem qualitativa, de natureza básica e com procedimento bibliográfico e documental, incluindo a exposição de dados estatísticos e jurisprudenciais.
A estrutura da monografia divide-se em quatro capítulos. No primeiro, apresenta-se um panorama da violência policial no país, com ênfase no conceito de necropolítica. O segundo capítulo trata do conjunto de direitos garantidos ao cidadão, tanto na ordem constitucional, quanto na ordem internacional, que foram considerados violados pelo Partido Socialista Brasileiro na ocasião da propositura da ação judicial. O terceiro capítulo explora o conceito de litigância estratégica, comparando-o com a atuação dos atores no bojo da ADPF 635. Por fim, o quarto capítulo, dedica-se à análise crítica da ADPF 635, examinando seus efeitos jurídicos e políticos.
2.VIOLÊNCIA POLICIAL, NECROPOLÍTICA E RACISMO: O CENÁRIO QUE ENSEJOU A PROPOSITURA DA ADPF 635
A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental foi proposta pelo Partido Socialista Brasileiro em 2019, sob o argumento de que havia uma excessiva e crescente letalidade da atuação policial, voltada sobretudo contra a população pobre e negra de comunidades (Brasil, 2019). Segundo dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública, em 2019 o Brasil atingia a marca de quinze mortes diárias por intervenção policial, sendo cinco delas apenas no estado do Rio de Janeiro. Dessa forma, 1.814 pessoas foram vitimadas por intervenção policial neste estado, enquanto 5.619 pessoas faleceram em todo Brasil (Ministério da Justiça e Segurança Pública, 2025).
O 14º Anuário de Segurança Pública, ao analisar os dados do Ministério da Justiça, constatou que em 2019 o país atingiu o maior número de mortes em decorrência de intervenções policiais desde que o indicador passou a ser monitorado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 2013. Foi constatado, ainda, que 42% de toda letalidade policial registrada no país naquele ano era oriunda do Rio de Janeiro e São Paulo (Anuário de Segurança Pública, 2020).
Se comparado ao ano anterior, o percentual de mortes por letalidade policial no Rio de Janeiro aumentou em 18,5% (Terra, 2019). A coordenadora da Rede de Observatórios de Segurança Pública do Centro de Estudos e Cidadania apontou que 40% de todas as mortes violentas registradas em 2019 no Rio de Janeiro são advindas da intervenção policial (Ramos, 2019).
O cenário fluminense é tão grave que, em cotejo com toda a polícia dos Estados Unidos, as forças de segurança pública do Rio de Janeiro vitimaram quase o dobro de vítimas no período de 2019, a despeito da incidência sobre população vinte vezes menor do que a estadunidense (The washington post, 2020).
O caso Favela Nova Brasília v. Brasil não deixou de ser considerado como fator indicativo da gravidade da situação apresentada. É que a Corte Interamericana de Direitos Humanos condenou o Brasil, em 16 de fevereiro de 2017, em razão de falhas em apurar e punir os responsáveis por execuções extrajudiciais perpetradas pela Polícia Civil fluminense (Brasil, 2019). Este caso remonta a duas incursões policiais ocorridas na favela Nova Brasília, na cidade do Rio de Janeiro, em 1994 e 1995, que resultaram no homicídio de 26 homens e em atos de violência sexual contra três mulheres, com predominância de vítimas jovens, negras, pobres e desarmadas (Corte Interamericana de Direitos Humanos, 2017). Portanto, não se trata de uma problemática nova, mas persistente no cenário brasileiro.
Estes fatos vitimam não só os moradores de periferias, mas também os próprios policiais. Consoante Daniel Cerqueira, a licença para matar contribui para a vitimização e morbidade física e mental dos agentes públicos (Cerqueira, 2018). Para o Partido Socialista Brasileiro, a vulnerabilidade psíquica dos policiais aumenta as chances de acidentes e episódios de uso desproporcional da força (Brasil, 2019). Ademais, foi considerado que os moradores das comunidades se encontram submetidos a um clima permanente de terror, sofrendo ameaças a integridade física e psicológica, além de danos ao patrimônio (Brasil, 2019).
O descaso com a população e a falta de planejamento adequado das operações potencializam ainda mais os seus danos, mormente no que tange aos feridos (Brasil, 2019). Tanto é assim, que a genitora do menino Marcos Vinícius, morto em 2018 trajando uniforme escolar, denunciou que a polícia teria impedido a chegada da ambulância na Maré para socorrer seu filho (Betim, 2018). Para além das vítimas fatais, toda a comunidade sofre com a suspensão de atividades escolares e inviabilização da ida ou do retorno ao trabalho (Brasil, 2019).
Recrudescendo esse cenário, o uso de helicópteros se mostrou frequente. O Observatório de Segurança Pública monitorou 34 operações e patrulhamentos com participação de helicópteros no Rio de Janeiro, apavorando e traumatizando os moradores da área atingida (Rede Observatório de Segurança, 2019). O Partido Socialista Brasileiro advogou que os helicópteros se converteram em ferramentas de abate, em total desrespeito à vida e à integridade dos moradores que, quando vitimados, são tratados como simples “danos colaterais” (Brasil, 2019).
Outro apontamento do Partido Socialista Brasileiro se refere a carência de registros adequados no que concerne às incursões policiais, somada a ausência de monitoramento das munições dos agentes, favorecendo a impunidade na violação de direitos humanos (Brasil, 2019). Também se tornou frequente a expedição de mandados judiciais coletivos de busca e apreensão, violando o direito à inviolabilidade domiciliar dos moradores de comunidade (Brasil, 2019). Somados, todos esses fatores compeliram o Partido Socialista Brasileiro a buscar soluções junto ao Supremo Tribunal Federal, visando combater a letalidade policial.
2.2 Quem são as vítimas da letalidade policial?
O 14º Anuário Brasileiro de Segurança Pública trouxe o perfil das vítimas de intervenções policiais com resultado morte. Em 2019, 99,2% dos mortos eram homens e apenas 0,8% mulheres (Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 2020). No que tange à faixa etária, 23,5% tinham entre 15 e 19 anos, 31,2% estavam na faixa etária entre 20 e 24 anos e 19,1% tinham entre 25 e 29 anos. Portanto, 74,3% das vítimas eram menores de 30 anos (Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 2020).
A raça das vítimas é um dado alarmante: 79,1% das vítimas eram pretas e pardas, indicando a sobrerrepresentação de negros entre vítimas da letalidade policial. Este percentual é superior à média nacional verificada no total das mortes violentas intencionais, em que 74,4% de todas as vítimas eram negras (Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 2020). Não foi diferente o resultado obtido entre os policiais vítimas de homicídio e latrocínio, atingindo o patamar de 65,1% de agentes pretos e partos (Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 2020).
Em 2025, o 19º Anuário Brasileiro de Segurança Pública deixou claro que a letalidade policial é um fenômeno seletivo, e os dados de perfil das vítimas demonstram que determinadas (e já conhecidas) parcelas da população são mais vitimizadas do que outras (Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 2025). O percentual de vítimas do sexo masculino também foi de 99,2%. Já a proporção de mortes para cada 100 mil habitantes é de 2,3 para adolescentes entre 12 e 17 anos, sendo 9,6 mortes entre os jovens de 18 a 24 anos, passando para 7,3 na faixa etária de 25 a 29 anos (Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 2025).
No que tange ao aspecto racial, pessoas negras correspondem a 82% das vítimas de letalidade policial, indicando a seletividade que impera no país, escancarando o racismo estrutural (Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 2025). Silvio Almeida leciona que as instituições são racistas porque a sociedade é racista (Almeida, 2019). Eis as palavras do renomado autor:
As instituições são apenas a materialização de uma estrutura social ou de um modo de socialização que tem o racismo como um de seus componentes orgânicos. Dito de modo mais direto: as instituições são racistas porque a sociedade é racista. Esta frase aparentemente óbvia tem uma série de implicações. A primeira é a de que, se há instituições cujos padrões de funcionamento redundam em regras que privilegiem determinados grupos raciais, é porque o racismo é parte da ordem social. Não é algo criado pela instituição, mas é por ela reproduzido. Mas que fique a ressalva já feita: a estrutura social é constituída por inúmeros conflitos – de classe, raciais, sexuais etc. –, o que significa que as instituições também podem atuar de maneira conflituosa, posicionando-se dentro do conflito. Em uma sociedade em que o racismo está presente na vida cotidiana, as instituições que não tratarem de maneira ativa e como um problema a desigualdade racial irão facilmente reproduzir as práticas racistas já tidas como ‘normais’ em toda a sociedade. (Almeida, 2019).
Portanto, o racismo decorre da própria estrutura social, isto é, da forma em que se constituem todas as relações políticas, econômicas, jurídicas, familiares, entre outras. Dentro desse processo histórico, grupos racialmente identificados são discriminados de forma sistemática (Almeida, 2019), o que explica os dados mencionados alhures.
2.3 Necropolítica e a política de segurança pública implementada por Wilson Witzel em 2019
O Partido Socialista Brasileiro inaugurou sua petição inicial afirmando que o cenário da letalidade policial é um exemplo perfeito da necropolítica, termo cunhado por Achille Mbembe (Brasil,2019). O autor conceitua necropolítica como o poder de ditar quem pode viver e quem deve morrer, como a capacidade de definir quem é o sujeito descartável (Mbembe, 2018).
Em 2019, o governador Wilson Witzel defendeu, de forma reiterada, a violência policial como estratégia de combate à criminalidade (Brasil, 2019). Questionado pela imprensa, o ex-governador afirmou que “o correto é matar o bandido que está de fuzil. A polícia vai fazer o correto: vai mirar na cabecinha e fogo! Para não ter erro”. Quando indagado sobre casos de pessoas assassinadas enquanto portavam furadeiras ou guarda-chuvas, Witzel aduziu que bastava um curso de sniper para evitar tragédias como essa (Veja, 2019). Para além da ausência de planejamento mínimo voltado à redução dos danos potenciais à população, constatam-se agora a introdução e o estímulo de práticas que agravam ainda mais a letalidade, violência e os prejuízos decorrentes da atuação policial. Exemplo disso é o uso de helicópteros, vulgarmente chamados de “caveirões voadores” (Brasil, 2019).
O ex-governador estimulava essa prática, tanto que esteve a bordo do Bell Huey II participando de uma operação em comunidades de Angra dos Reis para “pôr fim à bandidagem”. Em outra ocasião, Witzel divulgou imagens de um atirador disparando uma rajada de dez tiros para baixo, na direção de uma tenda usada por cristãos para oração (O globo, 2019). Aliás, foi aprovado um manual operacional de uso das aeronaves da Coordenadoria de Recursos Especiais, gravado por grau secreto, isto é, dando cunho sigiloso ao documento por 15 anos (O globo, 2019). Para o Partido Socialista Brasileiro, esse sigilo agrava ainda mais o quadro aterrador vivenciado no Rio de Janeiro (Brasil, 2019).
A lógica necropolítica do ex-governador restou evidenciada no Decreto Estadual 46.775/2019, considerando a extinção das gratificações salariais aos integrantes de batalhões e delegacias que atingissem a meta de redução de homicídios decorrentes da intervenção policial, previstas no Decreto Estadual 41.931/2009 (Rio de Janeiro, 2019). Para o Partido Socialista Brasileiro, o recado não podia ser mais cruel e irracional: os policiais deveriam se importar ainda menos com a vida dos moradores de favelas (Brasil, 2019).
No entender de Robson Rodrigues, ex-chefe do Estado Maior da Polícia Militar, trata-se de retrocesso lamentável, pois a redução das mortes deixa de ser um objetivo almejado pela polícia (O globo, 2019). Silvia Ramos assinala que ao excluir as mortes decorrentes de ação policial dos indicadores a serem reduzidos, o governo está reduzindo ainda mais o controle da letalidade policial e estimulando o excesso de uso da força (O globo, 2019).
Analisando a relação entre a necropolítica e o racismo, Silvio Almeida asseverou:
Dizer que a guerra está próxima e que o inimigo pode atacar a qualquer momento é a senha para que sejam tomadas as medidas ‘preventivas’, para que se cerque o território, para que sejam tomadas medidas excepcionais, tais como toques de recolher, ‘mandados de busca coletivos’, prisões para averiguação, invasão noturna de domicílios, destruição de imóveis, autos de resistência etc. (Almeida, 2019).
Infere-se, portanto, que a lógica mortífera é alimentada pela ideia de ameaça de um inimigo, sendo esta um fundamento retórico do assassinato (Almeida, 2019).
O racismo explica essa problemática:
O racismo, mais uma vez, permite a conformação das almas, mesmo as mais nobres da sociedade, à extrema violência a que populações inteiras são submetidas, que se naturalize a morte de crianças por ‘balas perdidas’, que se conviva com áreas inteiras sem saneamento básico, sem sistema educacional ou de saúde, que se exterminem milhares de jovens negros por ano, algo denunciado há tempos pelo movimento negro como genocídio. (...). A descrição de pessoas que vivem “normalmente” sob a mira de um fuzil, que têm a casa invadida durante a noite, que têm de pular corpos para se locomover, que convivem com o desaparecimento inexplicável de amigos e/ou parentes é compatível com diversos lugares do mundo e atesta a universalização da necropolítica e do racismo de Estado, inclusive no Brasil. (Almeida, 2019).
A necropolítica, portanto, instaura-se como a organização necessária do poder em um mundo em que a morte avança implacavelmente sobre a vida. A justificação da morte em nome dos riscos à economia e à segurança torna-se o fundamento ético dessa realidade (Almeida, 2019).
3.DOS DIREITOS HUMANOS FUNDAMENTAIS
O Brasil é respeitado por produzir a Constituição de 1988, responsável por garantir um extenso rol de direitos fundamentais. Paralelamente, o país também é signatário de diversos Tratados internacionais que garantem ao cidadão direitos humanos. Nesse sentido, Flávia Piovesan leciona o seguinte:
A Carta de 1988 institucionaliza a instauração de um regime político democrático no Brasil. Introduz também indiscutível avanço na consolidação legislativa das garantias e direitos fundamentais e na proteção de setores vulneráveis da sociedade brasileira. A partir dela, os direitos humanos ganham relevo extraordinário, situando-se a Carta de 1988 como o documento mais abrangente e pormenorizado sobre os direitos humanos jamais adotado no Brasil. (Piovesan, 2024).
Flávia Piovesan concluiu que a Constituição Federal de 1988 é uma das mais avançadas do mundo no que diz respeito aos direitos e garantias fundamentais, o que altera substancialmente a política brasileira de direitos humanos, possibilitando um progresso significativo no reconhecimento de obrigações internacionais na matéria (Piovesan, 2024). Isso fica evidenciado no art. 1º, III da Constituição Federal, ao dispor que um dos fundamentos da República Federativa do Brasil é a dignidade da pessoa humana. Também resta claro em seu art. 4º, II ao determinar que as relações internacionais serão regidas pela prevalência dos direitos humanos (Brasil, 1988).
Tal reconhecimento implica em submeter a soberania do Estado brasileiro a regras jurídicas, em atenção à concepção de que os direitos humanos constituem tema de legítima preocupação e interesse da comunidade internacional. Dentro dessa lógica, os direitos humanos surgem como tema global na Constituição Federal (Piovesan, 2024). Todavia, conforme argumentado pelo Partido Socialista Brasileiro na petição inicial da ADPF 635, uma série de direitos da população periférica foram violados, quais sejam: direito à vida, direito à dignidade da pessoa humana, direito à segurança, direito à inviolabilidade de domicílio (Brasil, 2019).
O direito à vida sempre foi um bem caro para o ser humano, operando, para além de sua condição de direito humano fundamental, como pressuposto fundante dos demais direitos (Mitideiro; Marioni; Sarlet, 2023). Não por acaso, a leitura do art. 5, caput, da Constituição Federal de 1988 indica que o direito à vida inaugura o rol de direitos fundamentais garantidos ao cidadão (Brasil, 1998). Este direito é tão prestigiado que a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, em seu art. 3º, estabelece que “todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal” (Unicef, s. d.).
Anos mais tarde, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos reafirmou esse direito em seu art. 6º, reconhecendo-o como inerente à pessoa humana e apontando que ninguém poderá ser arbitrariamente privado de sua vida (Brasil, 1992). Tamanha é a complexidade do direito à vida que o Comitê dos Direitos Humanos proferiu o Comentário Geral 36, prevendo uma série de diretrizes para a interpretação do mencionado art. 6º. Dentre elas, está a necessidade de prevenção da privação arbitrária da vida pelos funcionários públicos, nestes termos:
13. Espera-se que os Estados Partes tomem todas as medidas necessárias para prevenir a privação arbitrária da vida pelos seus funcionários responsáveis pela aplicação da lei, incluindo soldados destacados em missões de aplicação da lei. Tais medidas incluem a adoção de legislação adequada para controlar o uso de força letal pelos funcionários responsáveis pela aplicação da lei, procedimentos destinados a garantir que as ações de aplicação da lei são adequadamente planeadas de uma forma compatível com a necessidade de minimizar o risco que colocam à vida humana, a obrigatoriedade de participação, apreciação e investigação dos incidentes letais e outros incidentes que provoquem risco de vida e o fornecimento, às forças responsáveis pelo controlo de multidões, de meios eficazes e menos letais e equipamentos de proteção adequados, para reduzir a necessidade de recorrer à força letal (vide também § 14, infra). Em particular, todas as operações dos funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem respeitar as normas internacionais pertinentes, incluindo o Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei e os Princípios Básicos sobre a Utilização da Força e de Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei, devendo os funcionários responsáveis pela aplicação da lei receber formação adequada para assimilar tais normas a fim de assegurar, em todas as circunstâncias, o mais pleno respeito do direito à vida. (ONU, 2020).
Por prevenção arbitrária entende-se aquela que, para além da incompatibilidade com o direito internacional ou interno, é injusta, desproporcional, desarrazoada (ONU, 2020). No sistema regional, o Pacto de San José da Costa Rica também dispõe acerca do direito à vida, em seu art. 4º, exigindo que esse direito seja protegido pela lei desde o momento da concepção (Brasil, 1992).
Diante dessas premissas, o Ministro Alexandre de Moraes aponta que o direito à vida possui uma dupla acepção: não basta que se garanta a possibilidade de usufruir de uma vida digna, mas é preciso garantir o direito de permanecer vivo (Moraes, 2024). É esta segunda acepção que foi considerada violada pelo Partido Socialista Brasileiro, pois, no seu entender, a política de segurança pública do Estado do Rio de Janeiro segue o caminho diametralmente oposto àquele traçado pela Constituição e pela normativa internacional. As operações policiais nas comunidades periféricas, frequentemente letais e desprovidas de critérios de proporcionalidade e necessidade, demonstram a falência do Estado na proteção ao bem jurídico mais elementar: a vida (Brasil, 2019).
3.2 Do direito à dignidade da pessoa humana
Consoante art. 1º, III da Constituição Federal, a dignidade da pessoa humana foi estabelecida como fundamento da República Federativa do Brasil (Brasil, 1988). Sendo assim, para Fernanda Arakaki e Guérula Viero, trata-se do centro da organização do Estado. Eis os seus dizeres:
Dessa forma, para a República Federativa do Brasil, como um Estado
Democrático de Direito, a dignidade humana é um princípio matriz de onde decorrem todos os demais direitos fundamentais, tais como o direito à vida, à intimidade, à honra, à imagem, dentre outros, estabelecendo o ser humano e sua dignidade como premissas do Estado Brasileiro. Nesse sentido, tem-se a dignidade humana como fundamento e reconhecimento da proteção individual de direito das pessoas no Estado Brasileiro, tanto em relação ao Estado quanto em relação aos outros indivíduos e ao seu grupo social. Constitui, sobretudo, o reconhecimento do tratamento igualitário, de forma a assegurar direitos mínimos aos indivíduos, para que todos os seres humanos tenham direito a um mínimo existencial, conservando assim sua dignidade. (Arakaki; Viero, 2018).
Para Flávia Piovesan, seja no âmbito internacional, seja no âmbito interno (à luz do Direito Constitucional ocidental), a dignidade da pessoa humana é princípio que unifica e centraliza todo o sistema normativo, assumindo especial prioridade. A dignidade humana simboliza, desse modo, verdadeiro superprincípio constitucional, a norma maior a orientar o constitucionalismo contemporâneo, nas esferas local e global, dotando-lhe de especial racionalidade, unidade e sentido (Piovesan, 2024).
O Partido Socialista Brasileiro aponta que a dignidade não pode ser retirada de alguém, nem pelo Estado, nem pela sociedade. Contudo, observou sua violação na ideia de que as mortes ocasionadas pela atuação policial são consequência toleráveis (Brasil, 2019).
No art. 144 da Constituição Federal de 1988, a segurança pública é apresentada como um dever do Estado, um direito e uma responsabilidade de todos (Brasil, 1988). A sua qualidade de direito é verificada tanto no art. 5º, caput da Constituição Federal de 1988 quanto no art. 6º do mesmo diploma (Brasil, 1988). O art. 3º da Declaração Universal de Direitos Humanos, o art. 9.1 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e o art. 7.1 do Pacto de San José da Costa Rica apontam a segurança pessoal como um direito de toda pessoa (Unicef, s. d.) (Brasil, 1992).
O Partido Socialista Brasileiro entendeu que, na ordem constitucional brasileira, segurança pública não é guerra contra o inimigo a ser exterminado. É direito fundamental, a ser atendido através de serviços públicos adequados, prestados sem discriminações contra pessoas em razão da sua raça, classe social ou qualquer outro elemento (Brasil, 2019). A segurança pública não é antagonista dos demais direitos humanos, mas convive com eles. Para que se atenda o interesse social, é preciso promover uma segurança que proteja direitos, despida da prática de abusos e omissões (Glina, 2020).
3.4 Do direito à inviolabilidade domiciliar
A Constituição Federal de 1988 prevê em seu art. 5, XI, o direito à inviolabilidade domiciliar. As únicas exceções são os casos de flagrante delito ou desastre, prestação de socorro e por determinação judicial, durante o dia (Brasil, 1988). O art. 12 da Declaração Universal dos Direitos Humanos dispõe que ninguém será sujeito à interferência no seu lar, assegurando o direito à proteção da lei contra qualquer ataque (Unicef, s. d.). O art. 17 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos proíbe qualquer interferência arbitrária ou ilegal no domicílio das pessoas (Brasil, 1992). A Convenção Americana de Direitos Humanos, em seu art. 11.2, segue a mesma linha (Brasil, 1992).
Alexandre de Moraes aponta que a inviolabilidade domiciliar é uma das garantias mais antigas e importantes da sociedade, englobando a tutela da intimidade, da vida privada, da honra, abrangendo todo local que uma pessoa ocupa com exclusividade (Moraes, 2024). Ocorre que o Partido Socialista Brasileiro identificou frequentes abusos cometidos por agentes de segurança em incursões policiais, consistentes na invasão de propriedades sem mandado judicial e furto de pertences (Brasil, 2019). A situação em 2019 foi tão delicada que um grupo de crianças e adolescentes residentes no Complexo da Maré encaminharam uma cartilha ao ex-governador Wilson Witzel com 17 itens orientadores quanto a abordagens policiais de moradores nas comunidades. Dentre eles, destacam-se o 5 e 6: “5- não permitir que as casas sejam invadidas sem mandado”; ”6- não permitir que bens materiais sejam roubados ou destruídos dentro das moradias em operações” (Exame, 2019).
É inegável que a invasão às casas sem mandado judicial fora das exceções previstas na Carta Magna é ilegal, tanto que, em momento anterior a propositura da ADPF 635, ao julgar o Recurso Especial 1.574.681/RS, o Superior Tribunal de Justiça manteve a absolvição de um homem que teve o seu domicílio violado (Brasil, STJ, Recurso Especial nº 1.574.681 - RS, 2017).
Não apenas a ausência de mandado judicial é ilegal, mas o Superior Tribunal de Justiça considerou ser ilegal também a decisão judicial que determina a busca e apreensão coletiva, de forma genérica e indiscriminada. Eis a ementa:
AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. APURAÇÃO DE CRIMES PRATICADOS EM COMUNIDADES DE FAVELAS. BUSCA E APREENSÃO EM RESIDÊNCIAS. DECLARAÇÃO DE NULIDADE DA DECISÃO QUE DECRETOU A MEDIDA DE BUSCA E APREENSÃO COLETIVA, GENÉRICA E INDISCRIMINADA CONTRA OS CIDADÃOS E CIDADÃS DOMICILIADOS NAS COMUNIDADES ATINGIDAS PELO ATO COATOR. 1. Configurada a ausência de individualização das medidas de apreensão a serem cumpridas, o que contraria diversos dispositivos legais, dentre eles os arts. 240, 242, 244, 245, 248 e 249 do Código de Processo Penal, além do art. 5º, XI, da Constituição Federal: a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial. Caracterizada a possibilidade concreta e iminente de ofensa ao direito fundamental à inviolabilidade do domicílio. 2. Indispensável que o mandado de busca e apreensão tenha objetivo certo e pessoa determinada, não se admitindo ordem judicial genérica e indiscriminada de busca e apreensão para a entrada da polícia em qualquer residência. Constrangimento ilegal evidenciado.
3. Agravo regimental provido. Ordem concedida para reformar o acórdão impugnado e declarar nula a decisão que decretou a medida de busca e apreensão coletiva, genérica e indiscriminada contra os cidadãos e cidadãs domiciliados nas comunidades atingidas pelo ato coator (Processo n. 0208558-76.2017.8.19.0001).
(AgRg no HC 435.934/RJ, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 05/11/2019, DJe 20/11/2019).
Desta feita, no entender do Partido Socialista Brasileiro, a política de segurança praticada pelo Estado do Rio de Janeiro violou gravemente todos os direitos acima descritos, o que deu azo ao ajuizamento da ADPF 635 (Brasil, 2019).
4.DA LITIGÂNCIA ESTRATÉGICA EM DIREITOS HUMANOS E SUA IMPLICAÇÃO NA ADPF 635
Diante desse cenário de violação de direitos, o PSB ingressou com a ação. Contudo, não agiu sozinho. Ainda em 2019, diversos seguimentos pleitearam a habilitação enquanto amicus curie. No início de 2020, a EDUCAFRO, a Justiça Global, a Associação Direitos Humanos em Rede, a Associação Redes de Desenvolvimento da Maré, o Movimento Negro Unificado, o Instituto de Estudos da Religião e a Defensoria Pública do Rio de Janeiro foram habilitados no processo na qualidade de amicus curie (Brasil, 2020).
Em 2020, o Conselho Nacional de Direitos Humanos, o Coletivo Papo Reto, o Movimento Mães de Manguinhos, a Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência do Fala Akari e da Iniciativa Direito à Memória e Justiça Racial também se habilitaram nos autos do processo na qualidade de amicus curie (Brasil, 2020).
Em 2021, o Partido dos Trabalhadores, o Partido Trabalhista Brasileiro, a Ordem dos Advogados do Brasil (Seção do Estado do Rio de Janeiro), o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, o Centro pela Justiça e o Direito Internacional, o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, o Instituto Anjos da Liberdade, o Grupo de Atuação Estratégica das Defensorias Públicas Estaduais e Distrital nos Tribunais Superiores, o Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária Popular Luiza Mahin, o Laboratório de Direitos Humanos, o Laboratório de Pesquisas LABJACA, o Instituto de Advocacia Racial e Ambiental, o Movimento Independente Mães de Maio, a Defensoria Pública da União também ingressaram no processo na qualidade de amicus curie (Brasil, 2021). Em 2023, a Associação Brasileira de Criminalística também foi admitida como amicus curie (Brasil, 2023), bem como a Iniciativa Negra por uma Nova Política sobre Drogas e a FIOCRUZ, estas em 2024 (Brasil, 2024). Ainda em 2024, a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro deixou de ser amicus curie para se habilitar na qualidade de custus vulnerablis (Brasil, 2024). Em 2025, a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro foi habilitada na qualidade de amicus curie (Brasil, 2025).
Juliana Santos definiu a ADPF 635 como uma grande transformação social do direito, a partir da atuação conjunta desses atores, tornando-se um exemplo de litigância estratégica em direitos humanos (FDRP - Faculdade de Direito de Ribeirão Preto, 2021).
4.1 Litigância estratégica: conceito, elementos e finalidade
No direito, o termo “litígio” se refere a submissão de ações judiciais a autoridades que aplicam a lei aos fatos. Todavia, litígios estratégicos consistem em advogar objetivando transformação social, envolvendo não só advogados e considerando o contexto político e social. Organizações não governamentais, instituições do sistema de justiça e movimentos sociais fazem parte desse litígio, buscando empoderar comunidades e indivíduos, defender o estado de direito, promover os direitos humanos e buscar reparações a violações (Osório, 2019).
Para a autora, o impacto do litígio estratégico é mais amplo do que fornecer uma solução a um demandante no caso concreto, pois envolve tribunais constitucionais ou organismos internacionais, visando modificar, através da decisão judicial, a lei, as políticas públicas ou a prática (Osório, 2019). Diz-se estratégica em razão da dimensão emblemática que a ação possui, com a capacidade de criar precedentes e gerar resultados com efeito multiplicador, verdadeiros exemplos a serem aplicados em casos similares, garantindo direitos humanos (Fundo Brasil de Direitos Humanos, 2024). Em suma, litígio estratégico em direitos humanos consiste na utilização de arenas de litigância de forma estratégica buscando um impacto que transcenda as partes do caso e contribua para os direitos humanos e justiça social (Gomes, 2019).
Juliana Gomes aponta que o litígio estratégico em direitos humanos opera nas encruzilhadas, buscando trazer para o centro do direito o que tradicionalmente é deixado às margens (Gomes, 2019). Eis os dizeres da autora:
O litígio estratégico em direitos humanos opera nas encruzilhadas. Ao pretender promover mudanças sociais por meio da litigância perante instituições estatais, regionais e supranacionais, busca trazer para o centro do direito aquilo que tradicionalmente ocupa suas margens. Visa, portanto, a modificar o direito por dentro, forçando-o, estressando-o, na direção da mudança social. Por suas características, localiza-se nas esquinas em que se cruzam movimentos sociais e instituições, direito e política, plano doméstico e internacional, conservação e transformação. (Gomes, 2019).
Portanto, o litígio estratégico possui um potencial de contribuir com a mudança social, gerando reflexos diretamente na realidade (Gomes, 2019).
Para Juliana Santos, quatro são os elementos da litigância estratégica, quais sejam: 1) Conhecimento real sobre o problema; 2) Articulação com os interessados; 3) Comunicação para a sociedade; 4) Disponibilidade de atuação (FDRP - Faculdade de Direito de Ribeirão Preto, 2021). Sobre o tópico 1, definição da estratégia começa a partir do levantamento de dados, da jurisprudência, dos atores. As possibilidades surgem a partir do conhecimento do problema (FDRP - Faculdade de Direito de Ribeirão Preto, 2021). Quanto ao tópico 2, Juliana adverte que a supressão de liberdades demanda união, trazendo êxito na estratégia a partir da conjugação de forças (FDRP - Faculdade de Direito de Ribeirão Preto, 2021). Já o tópico 3 proclama a necessidade de informar a sociedade acerca da história, pois, quem anuncia depois, traz apenas mais uma versão (FDRP - Faculdade de Direito de Ribeirão Preto, 2021). Por fim, quanto ao tópico 4, a jurista apontou que ações como essa são verdadeiros movimentos de guerrilha, demandando tempo e disponibilidade, além de assessoria jurídica criativa (FDRP - Faculdade de Direito de Ribeirão Preto, 2021).
Nesse sentido, Juliana Gomes ensina que o litígio estratégico em direitos humanos possui dois elementos: temporalidade e abrangência. Isso porque, em primeiro lugar, o litígio tende a ser longo, além de demandar um processo posterior de implementação e negociação. É dizer: o caso não se encerra com uma sentença favorável, mas com o transcurso posterior a partir da decisão. Ademais, são abrangentes por mobilizarem recursos extrajudiciais e extrajurídicos, envolvendo diferentes ramos dos poderes estatais e da sociedade civil (Gomes, 2019).
Esses fatores dão azo à complexidade do litígio estratégico. Senão vejamos:
Por serem longos e amplos, casos de litígio estratégico costumam ser complexos tanto do ponto de vista processual quanto substantivo. No âmbito do processo judicial, provocam a redefinição de diversos institutos processuais e, do ponto de vista substantivo, frequentemente envolvem questões e argumentos fundamentados em outras áreas do conhecimento que não a jurídica, além de pontos de vista socialmente controversos. Além disso, durante o curso de um litígio estratégico em direitos humanos, a diversidade de atores envolvidos (muitos dos quais pouco habituados à gramática jurídica) e a multiplicidade de arenas mobilizadas (muitas das quais fora do Poder Judiciário) promovem uma abertura para fora do direito. Não raro, oferecem pontos de contato com a política, o que pode gerar tensões relacionadas à distinção entre essas duas searas. (Gomes, 2019).
Por ser longo, amplo e complexo, geralmente são custosos, mas tendem a ser gratuitos para seus beneficiários (Gomes, 2019). O objetivo do litígio é a promoção da justiça social, dos direitos humanos, da mudança estrutural e do acesso à justiça, mas também apresenta fins específicos, como, por exemplo, (i) implementar, clarificar ou questionar leis, (ii) construir legislação e políticas públicas, (iii) modificar o uso de instrumentos jurídicos, (iv) criar pressão, (v) documentar injustiças, (vi) aumentar a consciência pública sobre um determinado tema e (vii) promover uma educação em direitos (Gomes, 2019).
Daniel Sarmento aduziu que, por vezes, o objetivo do litígio será lograr êxito em uma causa, mas, em outras, o litígio estratégico poderá ser usado para ressaltar uma situação existente, projetando luz onde havia sombra. A despeito da possibilidade de poucas chances de sucesso jurídico em algum cenário, a existência do litígio pode gerar condições positivas no futuro, reequilibrando as forças em conflito (Fundo Brasil de Direitos Humanos, 2024).
Levar demandas das minorias ao Supremo Tribunal Federal é a melhor possibilidade, considerando a hegemonia do pensamento conservador no Congresso Nacional (Fundo Brasil de Direitos Humanos, 2024). Nesse sentido:
O litígio estratégico pode ser pensado com a ideia de que algumas conquistas se dão nos tribunais e não no debate sobre políticas públicas. Para isso, seria preciso ter capacidade de fazer essa advocacia dentro de tribunais. Especialmente nos casos de conquistas de minorias porque tanto parlamentos como governos são resultado de maiorias. Quem está no governo ou no parlamento é quem ganha a eleição, portanto, quem é maioria. É uma lógica de afirmação das maiorias e, em geral, as supremas cortes são o lugar onde as questões das minorias podem ser defendidas e preservadas. isso é difícil de fazer nos governos e parlamentos, a não ser que eles queiram ouvir as minorias. Saber utilizar os tribunais para de fender direitos que são controversos, que não estão sendo implementados, é efetivamente o único jeito. (...)
Se você é minoria, é muito mais estratégico garantir seus direitos de igualdade nos tribunais, que têm o dever de preservar os direitos constituídos. Pensar litigância estratégica é ter capacidade de avaliar contextos, saber que o Poder Judiciário é o terceiro poder da República e quando é possível contar com ele. (Fundo Brasil de Direitos Humanos, 2024).
Desta feita, o litígio estratégico em direitos humanos possui um grande potencial transformador, especialmente por ser um conceito aberto, sem formas rígidas, o que permite adaptações criativas tanto no campo jurídico quanto extrajurídico. Essa característica, somada ao fato de o litígio situar-se nas interseções entre movimentos sociais, instituições, política e direito, amplia as possibilidades de inovação e contestação das estruturas de poder e desigualdade (Gomes, 2019).
4.2 Litigância estratégica e a ADPF 635
No seminário “Reorientando a atuação do sistema de justiça: litigância estratégica e o caso ADPF das Favelas”, promovido pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto, restou demonstrado que a ADPF 635 é um paradigma de transformação social do direito em meio a um cenário de violações sistemáticas de direitos humanos (FDRP - Faculdade de Direito de Ribeirão Preto, 2021). Juliana Santos definiu os quatro elementos da litigância estratégica e, quanto à articulação com os interessados, definiu que a ADPF 635 é uma conjugação das organizações da sociedade civil presentes na comunidade aliada ao conhecimento técnico e jurídico de outros atores (FDRP - Faculdade de Direito de Ribeirão Preto, 2021).
Nesse sentido, Thais Gomes afirmou que a habilitação de diversos setores na qualidade de amicus curie foi um grande destaque nessa demanda, considerando que todos os atores envolvidos contribuem para a estratégia traçada, em verdadeira aglutinação de forças (FDRP - Faculdade de Direito de Ribeirão Preto, 2021). Isso porque, a experiência daquele que sente na pele as dores pelas perdas de familiares e vizinhos é inigualável, entregando a melhor contribuição no que tange à construção da melhor política de segurança pública a ser implementada (FDRP - Faculdade de Direito de Ribeirão Preto, 2021).
Uma das estratégias para ampliar a efetividade dos direitos fundamentais é envolver pessoas em causas e investir na consolidação de organizações da sociedade civil (Fundo Brasil de Direitos Humanos, 2024).
A participação das vítimas, grupos ou comunidades no desenho de propostas concretas para a solução de situações de violação de direitos são centrais para alcançar a eficácia de uma ação legal. nos últimos anos, organizações de direitos humanos têm utilizado essa ferramenta não apenas nas cortes e mecanismos internacionais de proteção dos direitos humanos, mas também nas cortes superiores dos países. O litígio estratégico tem sido utilizado não só para lograr restituição ou reparação de direitos, como também para fortalecer a capacidade de ação das vítimas e suas organizações representativas, abrir novas vias de participação, firmar as conquistas logradas no plano político e controlar de forma permanente a atuação dos órgãos do Estado. (Fundo Brasil de Direitos Humanos, 2024).
O Supremo Tribunal Federal, ao decidir quanto aos pleitos de habilitação como amicus curie, ressaltou o seguinte:
Como é sabido, a interação dialogal entre o Supremo Tribunal e pessoas naturais ou jurídicas, órgãos ou entidades especializadas, que se apresentem como amigos da Corte, tem um potencial epistêmico de apresentar diferentes pontos de vista, interesses, aspectos e elementos nem sempre alcançados, vistos ou ouvidos pelo Tribunal diretamente da controvérsia entre as partes em sentido formal, possibilitando, assim, decisões melhores e também mais legítimas do ponto de vista do Estado Democrático de Direito. (Brasil, 2020).
Thais Gomes ressalta que, a despeito de toda mobilização, a ADPF não solucionará, sozinha, a letalidade policial. Contudo, a narrativa conjunta dos atores confronta o sistema de justiça, causando um efeito significativo na garantia do direito à vida (FDRP - Faculdade de Direito de Ribeirão Preto, 2021). A participação dos movimentos nas audiências públicas também é uma forma de enfrentamento a questões sensíveis no que tange a violência (FDRP - Faculdade de Direito de Ribeirão Preto, 2021). Portanto, os movimentos de favela, em conjunto com as organizações jurídicas, reorientam a atuação do sistema de justiça (FDRP - Faculdade de Direito de Ribeirão Preto, 2021). Ademais, Juliana Gomes apresenta a atuação da Defensoria Pública e do Ministério Público como órgãos de destaque na litigância estratégica (Gomes, 2019).
Não foi diferente no caso da ADPF 635. A Defensoria Pública do Rio de Janeiro e a Defensoria Pública da União contribuíram para o deslinde da ação, se habilitando como amicus curie (Brasil, 2021). Contudo, durante a tramitação processual, a Defensoria Pública do Rio de Janeiro convolou sua qualificação na ação, passando a atuar na qualidade de custus vulnerablis (Brasil, 2024).
Na petição de fl. 1128, a Defensoria Pública do Rio de Janeiro destacou que a mudança busca amplificar a participação de grupos mais vulneráveis da sociedade fluminense, no caso, habitantes de favelas e bairros periféricos do Rio de Janeiro, diretamente afetados pela violência policial, que é o objeto da ADPF, munindo a Defensoria de prerrogativas processuais mais ampliadas para o atingimento do resultado (Brasil, 2024).
Passada essa contextualização, imperioso avaliar os resultados alcançados com a propositura da ação, o que se faz no próximo capítulo.
5. O IMPACTO DA ADPF 635: ANÁLISE DOS RESULTADOS
5.1 Dos pedidos constantes da exordial
Na exordial, o Partido Socialista Brasileiro listou uma série de pedidos. Em medida cautelar, o arguente solicitou, em primeiro lugar, que o Estado do Rio de Janeiro elaborasse um plano de redução da letalidade policial e controle de violações de direitos humanos causados pelas forças de segurança pública, no prazo máximo de 90 dias, contendo medidas objetivas, cronogramas e previsão dos recursos necessários para sua implementação (Brasil, 2019). Solicitou, ainda, que este plano contemplasse, obrigatoriamente, e no mínimo, medidas concernentes à melhoria do treinamento dos policiais, incluindo programas de reciclagem, com a sensibilização para o respeito aos direitos humanos e racismo estrutural, além de elaboração de protocolos públicos de uso proporcional e progressivo da força, em atenção ao ordenamento jurídico pátrio e internacional, e protocolos públicos de abordagem policial e busca pessoal, e adotasse medidas voltadas a melhoria das condições de trabalho dos policiais, buscando providências para solução da insuficiência de acompanhamento psicológico dos agentes (Brasil, 2019).
Apontou para a necessidade de franquear à sociedade civil e, ao menos, à Defensoria Pública, ao Ministério Público e ao Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, a possibilidade de apresentação de manifestações quanto ao referido plano, inclusive com a submissão deste ao escrutínio da sociedade civil através de audiência pública (Brasil, 2019). Ao final o plano deveria ser submetido ao Plenário do Pretório Excelso, para fins de homologação e monitoramento quanto a implementação do plano (Brasil, 2019).
O arguente pleiteou, em segundo lugar, que o Estado do Rio de Janeiro se abstivesse de utilizar helicópteros na qualidade de plataformas de tiros, suspendendo a eficácia do art. 2º do Decreto Estadual nº 27.795/2001, repristinando os efeitos do art. 4º do Decreto Estadual nº 20.557/1994 (Brasil, 2019).
Quanto aos mandados de busca e apreensão domiciliar, foi solicitado que o Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro indicasse, precisamente, o lugar, o motivo e o objetivo da diligência, vedando a expedição de mandados coletivos ou genéricos (Brasil, 2019).
Nesse sentido, apresentou alguns parâmetros a serem estabelecidos, são eles: a) no que tange ao cumprimento de mandado judicial, a diligência deveria ocorrer apenas durante o dia; b) na ausência de mandado judicial, a diligência deveria estar lastreada em causas prévias e robustas que indiquem a existência de flagrante delito; c) a diligência deveria ser justificada e detalhada por meio do auto circunstanciado, devendo acompanhar o auto de prisão em flagrante ou de apreensão de adolescente, remetendo à audiência de custódia; d) a diligência deveria ser realizada nos limites excepcionais, sendo proibido o uso dos imóveis privados como base operacional das forças de segurança pública (Brasil, 2019). Seguindo, pleiteou a presença obrigatória de ambulâncias e de equipes de saúde em operações policiais e a determinação quanto a preservação dos vestígios dos crimes cometidos em operações policiais (Brasil, 2019).
No que tange à realização de operações policias próximos a escolas, creches, hospitais ou postos de saúde, pugnou pela fixação das seguintes diretrizes: a) absoluta excepcionalidade da medida, especialmente no período de entrada e de saída dos estabelecimentos educacionais, acompanhada de justificativa prévia ou posterior quanto as razões indispensáveis para as ações na região, a ser enviada ao Ministério Público em até 24 horas; b) a proibição do uso de equipamento educacional ou de saúde como base operacional das polícias, seja civil ou militar, proibindo também o uso dos locais de entrada e saída como base de recursos operacionais dos agentes; c) a elaboração de protocolos próprios e sigilosos de comunicação entre as polícias civis e militares e os segmentos federal, estadual e municipal das áreas de educação e saúde, para fins de redução dos riscos à integridade física das pessoas (Brasil, 2019).
Foi pleiteado a suspensão do sigilo dos protocolos de atuação policial, incluindo do Manual Operacional das Aeronaves pertencentes à frota da Secretaria de Estado de Polícia Civil (Brasil, 2019). Também foi solicitada a obrigatoriedade de elaboração, armazenamento e disponibilização de relatórios detalhados de cada operação policial, contemplando, ao menos, o objetivo da ação, os horários, a autoridade responsável pela ordem e o comandante da operação, os nomes dos policiais envolvidos, o tipo e o número de munições consumidas, as armas, os veículos, o material apreendido e as buscas domiciliares realizadas (Brasil, 2019).
A solicitação também abrangeu a necessidade de determinação ao Estado do Rio de Janeiro quanto à instalação de GPS e sistemas de gravação de áudio e vídeo nas viaturas policiais e nas fardas dos agentes de segurança, no prazo máximo de 180 dias (Brasil, 2019). Foi solicitada a determinação aos órgãos de polícia técnico-científica do Estado do Rio de Janeiro que documentem, por meio de fotografias, as provas periciais produzidas em investigações de crimes contra a vida, mormente o laudo de local de crime e exame de necropsia (Brasil, 2019).
Também se perquiriu a determinação do Ministério Público para instauração de procedimentos investigatórios autônomos em relação aos casos de mortes e demais violações de direitos fundamentais cometidas por agentes de segurança, além de determinar também as polícias diligências na oitiva das vítimas e seus familiares quanto a esses fatos, priorizando a tramitação dos procedimentos cujas vítimas sejam crianças ou adolescentes (Brasil, 2019).
Pugnou-se, ainda, pela determinação ao Ministério Público do Rio de Janeiro para fins de designação de, pelo menos, um promotor de justiça responsável por atender demandas concernentes ao controle externo das polícias, em regime de plantão, divulgando esse serviço aos cidadãos (Brasil, 2019). Por fim, foi pleiteada a determinação de suspensão do art. 1º do Decreto Estadual nº 46.775/2019 bem como a abstenção do ex-governador e dos órgãos e agentes públicos estaduais quanto a manifestações de incentivo a letalidade policial (Brasil, 2019).
Quanto aos pedidos definitivos, foi requerido o que se segue:
a) Confirmar, em caráter definitivo, todas as providências listadas nos tópicos “a” a “q”, supra; b) Declarar a inconstitucionalidade do art. 2º do Decreto Estadual n° 27.795/2001, com o reconhecimento da repristinação dos efeitos do art. 4° do Decreto Estadual n° 20.557/1994, de modo a vedar o uso de helicópteros como plataformas de tiro e instrumentos de terror; e c) Declarar a inconstitucionalidade do art. 1º do Decreto Estadual n° 46.775/2019, de modo a reinserir, no cálculo das gratificações dos integrantes de batalhões e delegacias, os indicadores de redução de homicídios decorrentes de oposição à intervenção policial. d) Em relação aos requerimentos “b” e “c” supra, caso esta Corte considere os impróprios para ADPF, espera o Arguente sejam eles admitidos como pedidos cumulativos de Ação Direta de Inconstitucionalidade, julgando-os do mesmo modo procedentes.
5.2 Da tutela provisória incidental e da medida cautelar
Após a propositura da demanda, em abril de 2020, os Ministros iniciaram o julgamento da medida cautelar solicitada pelo Partido Socialista Brasileiro. Ocorre que o Ministro Alexandre de Moraes solicitou a suspensão do julgamento para análise dos autos (Brasil, 2020). Contudo, diante da Chacina do Alemão em 15 de maio de 2020, da morte do adolescente João Pedro, em 18 de maio de 2020 e do Iago César dos Reis Gonzaga e Rodrigo Cerqueira, o Partido Socialista Brasileiro apresentou um pedido de Tutela Provisória Incidental, reiterando os pedidos cautelares constantes da exordial, incluindo o pedido de suspensão da realização de operações policiais nas comunidades durante a pandemia do Covid-19, salvo casos excepcionais, estes últimos com cuidados excepcionais (Brasil, 2020).
Em atenção ao pedido de tutela, em 05 de junho de 2020, o Ministro Edson Fachin, relator da ação, proferiu decisão monocrática deferindo o seguinte:
Ante o exposto, defiro a medida cautelar incidental pleiteada, ad referedum do Tribunal, para determinar: que, sob pena de responsabilização civil e criminal, não se realizem operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro durante a epidemia do COVID-19, salvo em hipóteses absolutamente excepcionais, que devem ser devidamente justificadas por escrito pela autoridade competente, com a comunicação imediata ao Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro – responsável pelo controle externo da atividade policial; e (ii) que, nos casos extraordinários de realização dessas operações durante a pandemia, sejam adotados cuidados excepcionais, devidamente identificados por escrito pela autoridade competente, para não colocar em risco ainda maior população, a prestação de serviços públicos sanitários e o desempenho de atividades de ajuda humanitária. (Brasil, 2020).
Em sessão virtual de 26 de junho a 04 de agosto de 2020, o Plenário referendou a medida incidental. Eis a ementa:
REFERENDO EM MEDIDA INCIDENTAL EM ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. REALIZAÇÃO DE OPERAÇÕES POLICIAIS NAS COMUNIDADES DO RIO DE JANEIRO DURANTE A PANDEMIA MUNDIAL. MORA DO ESTADO NO CUMPRIMENTO DE DECISÃO DA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. PLAUSIBILIDADE JURÍDICA. CONTEXTO FÁTICO EM QUE OS MORADORES PERMANECEM MAIS TEMPO EM CASA. RELATOS DE OPERAÇÕES QUE REPETEM O PADRÃO DE VIOLAÇÃO JÁ RECONHECIDO PELA CORTE INTERAMERICANA. PERICULUM IN MORA. CONCESSÃO DA MEDIDA. 1. A mora no cumprimento de determinação exarada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos é fundamento que empresa plausibilidade à tese segundo a qual o Estado do Rio de Janeiro falha em promover políticas públicas de redução da letalidade policial. 2. A permanência em casa dos moradores das comunidades do Rio de Janeiro em decorrência da pandemia internacional, assim como os relatos de novas operações que, aparentemente, repetem os padrões de violações anteriores, fundamentam o receio de que a medida, caso concedida apenas ao fim do processo, seja ineficaz. 3. Medida cautelar deferida para determinar: (i) que, sob pena de responsabilização civil e criminal, não se realizem operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro durante a epidemia do COVID-19, salvo em hipóteses absolutamente excepcionais, que devem ser devidamente justificadas por escrito pela autoridade competente, com a comunicação imediata ao Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro responsável pelo controle externo da atividade policial; e (ii) que, nos casos extraordinários de realização dessas operações durante a pandemia, sejam adotados cuidados excepcionais, devidamente identificados por escrito pela autoridade competente, para não colocar em risco ainda maior população, a prestação de serviços públicos sanitários e o desempenho de atividades de ajuda humanitária.” (ADPF 635 MC-TPI-Ref, Relator(a): EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 05/08/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-267 DIVULG 06-11-2020 PUBLIC 09-11- 2020).
Ao avaliar os efeitos da medida cautelar o Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos concluiu que, muito embora as operações policiais tenham continuado a ocorrer, o deferimento da medida cautelar na ADPF 635 produziu efeitos positivos de redução da violência armada na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, pois foi estimado que 18 vidas foram salvas em apenas 15 dias, o que é salutar (Geni, 2020).
Apreciando a medida cautelar pleiteada na exordial, em sessão virtual de 7 a 17 de agosto de 2020, o Plenário deferiu parcialmente os pedidos realizados, a fim de a) restringir a utilização de helicópteros nas operações policiais apenas nos casos de estrita necessidade efetivamente comprovada através do relatório circunstanciado; b) impor ao Estado do Rio de Janeiro a orientação dos agentes de segurança e profissionais de saúde no que tange à preservação dos vestígios de crimes em operações policiais; c) determinar aos órgãos de polícia técnico-científica a documentação das provas periciais produzidas nas investigações de crimes contra a vida; d) determinar a observância dos parâmetros requeridos no que tange aos casos de realização de operações policiais próximas a escolas, creches, hospitais ou postos de saúde; e) atribuir ao órgão do Ministério Público a investigação autônoma dos crimes concernentes à letalidade policial, incluindo a oitiva da vítima e de seus familiares, bem como a necessidade de priorização da tramitação dos procedimentos cujas vítimas sejam crianças ou adolescentes, além de designar pelo menos um promotor de justiça para atuar em todos os casos em regime de plantão; f) suspender a eficácia do art. 1º do Decreto 46.775/2019 (Brasil, 2020).
Após a oposição de Embargos Declaratórios, o Plenário do Supremo Tribunal Federal deferiu outros pedidos de medida cautelar, quais sejam: a) a determinação ao Estado do Rio de Janeiro no que tange à elaboração de um plano de redução de letalidade policial e controle de violação de direitos humanos, no prazo máximo de 90 dias; b) a observância dos Princípios Básicos sobre Utilização da Força e Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei, em especial à excepcionalidade da realização das operações policiais; c) a criação de um grupo de trabalho sobre Polícia Cidadã no Observatório de Direitos Humanos localização no Conselho Nacional de Justiça; d) o reconhecimento de que o uso da força letal só seria possível se exauridos os demais meios e se for necessário para a proteção da vida ou prevenir um dano sério decorrente de ameaça concreta e iminente; e) reconhecer a prioridade absoluta nas investigações de incidentes com vítimas crianças ou adolescentes; e) as buscas domiciliares deveriam ocorrer durante o dia, com mandado judicial e, sendo sem mandado, poderia ter por base denúncia anônima, mas a diligência deve ser justificada; f) a obrigatoriedade de disponibilização de ambulâncias em operações policiais previamente planejadas em que haja a possibilidade de confrontos armados; g) a determinação de instalação de equipamentos de GPS e sistemas de gravação de áudio e vídeo nas viaturas e nas fardas dos agentes, no prazo máximo de 180 dias (Brasil, 2021).
5.3 Das taxas de letalidade policial ao longo do deslinde processual e do perfil das vítimas
Segundo dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública, em 2019, o Rio de Janeiro apresentou 1.814 mortes por intervenção policial, com a média diária para cinco mortes. No contexto nacional, foram registradas 5.619 mortes, com uma média de 15 mortes por dia (Ministério da Justiça e Segurança Pública, 2025). Em 2020, os registros apontaram 6.511 mortes no Brasil. No Rio de Janeiro, houve um ligeiro decréscimo, com 1.245 mortes, resultando em uma média de três mortes diárias (Ministério da Justiça e Segurança Pública, 2025).
O ano de 2021 seguiu a mesma tendência, com 6.543 mortes em todo o país. No Rio de Janeiro, houve um ligeiro aumento em relação ao ano anterior, com 1.356 mortes, mantendo a média de quatro mortes diárias (Ministério da Justiça e Segurança Pública, 2025). Em 2022, o Brasil contabilizou 6.453 mortes por intervenção policial, mantendo a média de 18 mortes diárias. Entretanto, o Rio de Janeiro apresentou um aumento significativo, totalizando 1.330 mortes, o que mantêm a média diária de quatro mortes (Ministério da Justiça e Segurança Pública, 2025).
Em 2023 o país atingiu o patamar de 6.395 mortes, com a média de 18 por dia, enquanto o Rio de Janeiro registrou 871 mortes, com a média diária de duas mortes (Ministério da Justiça e Segurança Pública, 2025). No ano de 2024, a letalidade policial nacional atingiu 6.228 mortes, com a média de 17 mortes por dia. No Rio de Janeiro, 703 mortes foram registradas, o que também representa uma média de duas mortes diárias em confrontos com a polícia (Ministério da Justiça e Segurança Pública, 2025).
Por fim, em 2025, durante o primeiro semestre do ano, foi estimado um total de 3.095 mortes por letalidade policial em todo o país, o que equivale a uma média de 17 mortes diárias. No Rio de Janeiro, foram contabilizadas 331 mortes por intervenção policial, com a média diária de duas pessoas mortas (Ministério da Justiça e Segurança Pública, 2025).
Quanto ao perfil das vítimas, especialmente no aspecto racial, no tópico 2.2 foi apresentado um cotejo entre o 14º e o 19º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, referente ao ano de 2019 e 2024, com nenhuma alteração. As vítimas permanecem sendo, em sua maioria, negras.
5.4 Da decisão per curiam do Supremo Tribunal Federal
Em abril de 2025, o Supremo Tribunal Federal proferiu o acórdão de mérito, em julgamento per curiam, decidindo a questão. Trata-se de uma decisão unificada proferida pelo Tribunal em detrimento da soma dos votos dos ministros (Consultor Jurídico, 2025). O Supremo Tribunal Federal afirmou que o Estado do Rio de Janeiro demonstrou um compromisso significativo na cessação das violações apontadas, deixando de reconhecer o estado de coisas inconstitucional (Brasil, 2025). Foram indeferidos os pleitos concernentes à proibição do uso de helicópteros como plataformas de tiro e a suspensão de sigilo de protocolos de atuação policial (Brasil, 2019).
Na decisão judicial, parte das medidas cautelares foram derrubadas, a exemplo da proibição de operações policiais próximas a escolas e hospitais, que passaram a ter diretrizes específicas a serem seguidas (Brasil, 2025). Assim, foi homologado parcialmente o plano de redução da letalidade policial apresentado pelo Estado do Rio de Janeiro, mantendo, por exemplo, a obrigatoriedade da instalação das câmeras nas viaturas policiais e nas fardas dos agentes, a necessidade de preservação dos vestígios do crime, a presença de ambulâncias em operações planejadas, mantendo as diretrizes para buscas domiciliares, (Brasil, 2025).
Por fim, o Supremo determinou a implementação de novas medidas, são elas: a) criação pelo governo estadual de um plano de reocupação territorial das áreas dominadas pelo crime; b) participação da polícia federal na investigação de organizações criminosas em casos de crimes com repercussão interestadual e internacional; c) criação pelo governo estadual de um programa de saúde mental para os policiais em até 180 dias; d) formação de um grupo de trabalho coordenado pelo Conselho Nacional do Ministério Público para o monitoramento do cumprimento da decisão; e) publicação de relatórios semestrais sobre a atuação no controle externo pelo Conselho Nacional do Ministério Público – CNPM (Brasil, 2025).
Como avanços da decisão, tem-se o desbloqueio da paralisia institucional que normalizava a violência contra as populações das comunidades fluminenses, além da exigência de câmeras, de perícias independentes e da criação do grupo de trabalho pelo CNPM. Esta última medida permitirá, inclusive, que a sociedade civil noticie ao Supremo qualquer violação aos parâmetros estabelecidos na decisão judicial (Corbo; Adami, 2025).
Como críticas, destaca-se o reconhecimento de que o Estado do Rio de Janeiro teria demonstrado “compromisso significativo” com a garantia de direitos, afastando o reconhecimento do estado de coisas ainda inconstitucional, pois, durante o deslinde da ação constitucional, houve descumprimento das medidas fixadas, a exemplo da Operação Exceptis, que vitimou 28 pessoas. Além disso, a possibilidade de operações próximo a escolas e centros de saúde e o uso de helicópteros também revelam a desproteção dos direitos dos moradores de comunidade (Corbo; Adami, 2025).
De toda forma, a ADPF 635 representou um histórico avanço na proteção dos direitos dos moradores das comunidades do Rio de Janeiro, deslocando para o centro do debate estadual e nacional a questão da letalidade policial e avançando em medidas de controle dessa problemática. Contudo, a luta por direitos continua, sendo certo que a busca por respostas institucionais será permanente (Corbo; Adami, 2025).
O ordenamento jurídico pátrio, contemplado não só por disposições constitucionais e infraconstitucionais, mas também por tratados internacionais nos quais o Brasil é signatário, traz em seu bojo diversos direitos e garantias ao cidadão. Contudo, com o passar dos anos, o cenário concernente a letalidade policial se mostrou alarmante no país. Tanto é assim que o Partido Socialista Brasileiro propôs uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental alegando violação aos direitos à vida, à segurança, à dignidade da pessoa humana, à inviolabilidade domiciliar, por parte do Estado do Rio de Janeiro.
Nesta monografia, restou evidenciada a lógica necropolítica instaurada no país, especialmente no contexto político de 2019, ano do ajuizamento da ação. Os dados do Anuário de Segurança Pública corroboram com essa conclusão, considerando o perfil das vítimas de letalidade policial: em sua maioria, negras e jovens. E não só: passados cinco anos da propositura da demanda, os dados do Ministério de Justiça e Segurança Pública não apresentaram diferenças drásticas no que tange as taxas de morte por intervenção policial.
Muitos poderão questionar a efetividade da demanda. Contudo, não se pode perder de vista a importância da existência da discussão no âmbito do Supremo Tribunal Federal, dando visibilidade a uma temática tão cara à sociedade civil. Salta aos olhos o fato deste feito só ter sido possível por meio do esforço conjunto de múltiplos atores, incluindo integrantes de organizações da sociedade civil e partidos políticos, que atuaram em prol da garantia dos direitos humanos fundamentais dos moradores da comunidade no Rio de Janeiro.
Como se viu ao longo da monografia, litigar estrategicamente em direitos humanos nem sempre trará resultados imediatos, mas a atitude de lançar luzes ao assunto poderá gerar resultados futuros significativos, que serão revelados com o passar dos anos. Desta feita, é possível afirmar que a ADPF 635 foi um paradigma de litigância estratégica em direitos humanos, não por seu resultado efetivo, mas pelo empenho conjunto nunca visto nessa magnitude no Supremo Tribunal Federal.
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pós graduada em Direitos Humanos, Responsabilidade Social e Cidadania Global pela PUC/RS.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOUZA, Rafaela Barbosa Barreto de. A ADPF 635 e o controle da violência policial: um paradigma de litigância estratégica em direitos humanos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 31 dez 2025, 04:41. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/69937/a-adpf-635-e-o-controle-da-violncia-policial-um-paradigma-de-litigncia-estratgica-em-direitos-humanos. Acesso em: 31 dez 2025.
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