NATALIA CARDOSO MARRA[1]
(orientadora)
RESUMO: Este artigo analisa o impacto das novas formas de trabalho, com foco no teletrabalho e nas relações trabalhistas brasileiras. O estudo examina as mudanças decorrentes da Reforma Trabalhista de 2017 e do contexto da pandemia de COVID-19, avaliando a resposta da legislação e destacando a formalização do teletrabalho. Identifica os desafios enfrentados pelos trabalhadores, com ênfase nos impactos na saúde mental. Fatores como isolamento, sobrecarga, dificuldade de desconexão e pressão por disponibilidade constante contribuem para estresse, ansiedade e exaustão.
Palavras-chave: Teletrabalho, Reforma Trabalhista, Pandemia, CLT.
ABSTRACT: This article analyzes the impact of new forms of work, with a focus on telework and Brazilian labor relations. The study examines the changes resulting from the 2017 Labor Reform and the context of the COVID-19 pandemic, evaluating the legislative response and highlighting the formalization of telework. It identifies the challenges faced by workers, emphasizing the impacts on mental health. Factors such as isolation, overload, difficulty disconnecting, and pressure for constant availability contribute to stress, anxiety, and exhaustion.
Keywords: Telework, Labor Reform, Pandemic, CLT.
RESUMEN: Este artículo analiza el impacto de las nuevas formas de trabajo, con un enfoque en el teletrabajo y las relaciones laborales brasileñas. El estudio examina los cambios resultantes de la Reforma Laboral de 2017 y el contexto de la pandemia de COVID-19, evaluando la respuesta legislativa y destacando la formalización del teletrabajo. Identifica los desafíos enfrentados por los trabajadores, con énfasis en los impactos en la salud mental. Factores como el aislamiento, la sobrecarga, la dificultad de desconexión y la presión por la disponibilidad constante contribuyen al estrés, la ansiedad y el agotamiento.
Palavras-chave: Teletrabalho, Reforma Trabalhista, Pandemia, CLT." e "Keywords: Telework, Labor Reform, Pandemic, CLT.
1 INTRODUÇÃO
O mundo do trabalho passou por transformações significativas durante a pandemia, o modelo tradicional de trabalho com jornada fixa e local determinado foi substituído por modalidades mais flexíveis, destacando o teletrabalho. No entanto, essas mudanças trouxeram desafios jurídicos e sociais, especialmente no que se refere à proteção dos direitos trabalhistas e à regulamentação adequada dessas modalidades de trabalho.
Diante desse cenário, surgem questionamentos sobre a proteção dos direitos trabalhistas e a adequação da legislação brasileira a essas novas realidades. Este artigo busca analisar os impactos das novas formas de trabalho nas relações trabalhistas, destacando os desafios e apontando possíveis caminhos para um futuro mais justo para os trabalhadores.
O presente trabalho tem o objetivo de analisar a existência de impactos nas modalidades de trabalho decorrentes da Reforma trabalhista de 2017 e, subsequentemente, do contexto da pandemia de COVID-19. Analisar se houveram transformações que ocasionaram mudanças significativas que influenciaram as novas modalidades de trabalho. Para atingir o objetivo o estudo irá descrever as modificações que ocorreram no cenário laboral pós Reforma Trabalhista e durante o período pandêmico e relacionar com a contemporaneidade, destacando os impactos resultantes das transformações.
Para alcançar os objetivos a metodologia utilizada foi pesquisa bibliográfica, a partir de revisão de literatura de livros, periódicos e artigos científicos publicados em revistas eletrônicas. Os materiais foram selecionados a partir da relação de seus conteúdos com os descritores e tema da pesquisa, foram consultadas obras de autores clássicos e contemporâneos, posteriormente foi realizada organização lógica dos assuntos para a construção do texto.
2 A REFORMA TRABALHISTA DE 2017 E A REGULAMENTAÇÃO DO TELETRABALHO
O mundo vem passando por grandes transformações, com essas transformações vem a necessidade de alterações nas legislações e para se adequarem as novas demandas, na área trabalhista não foi diferente, a necessidade de uma alteração na legislação trabalhista foi um assunto abordado há alguns anos antes de ser sancionada a lei n° 13.467/2017 (KREIN; COLOMBI, 2019).
Cabe destacar os anos 2000 em que o Brasil passou por um crescimento de consumo com maior inclusão social, marcado pelo capitalismo contemporâneo que demandava um processo de reorganização do trabalho, ao mesmo tempo que houve um aumento no poder de compra por parte dos trabalhadores teve a intensificação da jornada de trabalho e o aumento na terceirização. Houve uma iniciativa pelo governo e pelo Fórum Nacional do Trabalho que foi constituído na época, nos anos entre 2003 e 2005 para a criação de reforma sindical e trabalhista, mas nem chegou a tramitar (TEIXEIRA, 2014 apud KREIN; COLOMBI, 2019).
Já em 2013 o Supremo Tribunal Federal – STF constituiu decisões desfavoráveis ao direito do trabalho, em contrariedade as tendências do Tribunal Superior do Trabalho - TST, entre elas se destacou a aceitação de que um acordo coletivo prevaleça sobre a Consolidação das Leis do Trabalho - CLT e a anulação de um entendimento do TST de ultratividade das cláusulas. A flexibilização do trabalho seguiu em expansão, impulsionada tanto pelas negociações sindicais quanto pelas transformações nas estruturas econômicas e a consequente reorganização do trabalho. O mundo do trabalho real foi mudando e os empregadores pressionaram para se ter uma alteração das regras formais das relações de trabalho (KREIN; COLOMBI, 2019).
No ano de 2015, com a grande crise econômica e política a retirada dos direitos dos trabalhadores ganhou destaque através da votação da PL 4330/2004 na câmara dos deputados que se tratava da terceirização. Em 2016 a partir do impeachment presidencial, vários setores empresariais começaram a defender a pauta de flexibilizações das relações laborais (KREIN; COLOMBI, 2019).
Em 2017 veio a Reforma Trabalhista através da Lei nº 13.467/2017, que causou um grande impacto na relação entre empregador e empregado, algumas mudanças só reforçaram e legalizaram o que já era praticado de forma errônea pelos empregadores, a reforma foi vista como uma modernização das leis, flexibilizando modificando as relações de trabalho, criando as novas modalidades de contratação, que se destaca o teletrabalho, conforme o Art. 75-A:
Art. 75-A .A prestação de serviços pelo empregado em regime de teletrabalho observará o disposto neste Capítulo.
Art. 75-B.Considera-se teletrabalho a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo.
Parágrafo único. O comparecimento às dependências do empregador para a realização de atividades específicas que exijam a presença do empregado no estabelecimento não descaracteriza o regime de teletrabalho.’
Art. 75-C. A prestação de serviços na modalidade de teletrabalho deverá constar expressamente do contrato individual de trabalho, que especificará as atividades que serão realizadas pelo empregado.
§ 1º Poderá ser realizada a alteração entre regime presencial e de teletrabalho desde que haja mútuo acordo entre as partes, registrado em aditivo contratual.
§ 2º Poderá ser realizada a alteração do regime de teletrabalho para o presencial por determinação do empregador, garantido prazo de transição mínimo de quinze dias, com correspondente registro em aditivo contratual. (BRASIL,2017)
Vale destacar que o trabalho remoto pode se dar de diferentes formas, considerando o local principal do teletrabalhador e o nível de conexão online entre ele e seu empregador. Dessa forma, em relação ao local, o teletrabalho pode ser classificado como:
[...] em domicílio (home office): quando o trabalhador fixa o local de trabalho em sua residência, instalando ali pequena estação com acesso a meios de comunicação e utilizando de estrutura própria ou cedida pela empresa para prestar os serviços contratados. - em centros satélites: locais para trabalho pertencentes ao empregador, que não se constituem filiais (em seu conceito civil-fiscal). Estes locais não possuem estrutura organizacional (não há chefias, subordinados, etc), sendo meros espaços de apoio para prestação de serviços pertencentes unicamente à empregadora. - em telecentros: que diferem dos anteriores pelo fato de serem compartilhados (estrutura e recursos) entre duas ou mais empresas. - em telecottages: espaços (também) para trabalho, situados em regiões rurais ou de difícil acesso e, normalmente, de menor escolaridade, quase se confundindo com os telecentros, não fosse o particular de sua localização e a possibilidade de parcerias público-privadas para sua instalação (uma vez que a estrutura poderá servir, também, à educação e capacitação da população regional, contribuindo para o desenvolvimento de políticas públicas de emprego, por exemplo, notoriamente na modalidade EAD). Sua virtude é atrair mão de obra qualificada, naturalmente migrante aos grandes centros urbanos, para regiões que potencialmente sofrem com o êxodo laboral. - Móvel (ou nômade): nele não há determinação quanto ao local de prestação do serviço. Qualquer lugar pode ser espaço de trabalho, desde que o teletrabalhador disponha das ferramentas necessárias para tal (atualmente, um smartphone atende bem estas necessidades) (FINCATO 2011 apud FINCATO, 2020 p. 36-48, p. 41-42.)
Segundo Hazan; Morato (2018) é fundamental apresentar a definição legal, que estabelece três requisitos para caracterizar o teletrabalho: a realização da atividade fora das instalações do empregador, o uso de meios telemáticos e a distinção do trabalho externo. Dessa forma, conclui-se que o empregado pode comparecer às instalações do seu empregador para realizar tarefas específicas sem que isso anule a natureza do teletrabalho. Por essa razão, essa modalidade de trabalho, considerando o critério temporal, é classificada como permanente quando o tempo trabalhado remotamente ultrapassa 90% da jornada laboral.
As transformações no mundo do trabalho, impulsionadas por avanços tecnológicos e novas dinâmicas sociais, como a popularização do teletrabalho, evidenciaram uma necessidade crítica: aprofundar a compreensão das especificidades de cada modalidade de trabalho. Este entendimento detalhado é a base para a subsequente elaboração e atualização de normas e diretrizes regulatórias que sejam, de fato, eficazes. Não basta apenas criar regras; é imperativo que essas regras espelhem a realidade dos trabalhadores, abordando seus riscos e desafios particulares, sejam eles físicos, ergonômicos ou, cada vez mais, psicossociais (FINCATO 2011 apud FINCATO, 2020).
3 PANDEMIA E A SAÚDE MENTAL
A pandemia da COVID-19 impôs o trabalho remoto a milhões de brasileiros. Para muitos, essa modalidade de teletrabalho foi uma experiência inédita, vivenciada de forma abrupta durante os primeiros meses de isolamento. Observou-se um aumento significativo na adoção do trabalho em casa, seguido por uma diminuição gradual à medida que as restrições foram flexibilizadas. É importante ressaltar que, mesmo com seu crescimento constante, o acesso ao teletrabalho não foi universal. Ele se configurou como um privilégio para certas categorias de trabalhadores formais, tanto do setor público quanto do privado, geralmente com um nível de escolaridade mais elevado (ANTUNES et al. 2023).
A mudança para o trabalho remoto impactou a saúde dos trabalhadores de diversas maneiras. A alteração de rotinas, as jornadas de trabalho mais longas, o aumento da pressão por parte dos empregadores e a dificuldade em separar a vida profissional da pessoal contribuíram para um desequilíbrio significativo. O isolamento profissional pode afetar negativamente a interação social, interferindo o compartilhamento de conhecimentos e a comunicação entre os colegas passou-se a ser através de plataformas digitais, levando a um sentido de “desumanização do trabalho” (ANTUNES et al. 2023 p.6).
Segundo Antunes et al. 2023, p.6,7:
[...]A desorganização temporal, a extensão das jornadas de trabalho, a intensificação do trabalho, o aumento das cargas de trabalho, a invasão das ferramentas de comunicação e a interação online no domicílio, além da participação compulsória (estar sempre disponível), nos leva a indagar se estamos caminhando para uma maior precarização do trabalho. No caso brasileiro, este fator também pode estar associado à retirada da proteção da duração da jornada no teletrabalho (inciso III, Art. 62, Lei Nº. 13.467/2017). O legislador, ao desconsiderar os avanços tecnológicos que permitem aos empregadores controlar a localização do trabalhador, as atividades que estão desempenhando e os horários de início e fim do expediente, retira o direito à proteção da jornada de 8 horas diárias e 44 horas semanais prevista no art. 7º da Constituição Brasileira.
A partir do exposto podemos perceber que apesar da flexibilidade inerente ao trabalho remoto, muitos trabalhadores experimentaram um aumento da pressão com aumento de metas e uma carga horária significativamente mais extensa. Podendo ocasionar uma precarização do trabalho (ANTUNES et al. 2023).
O rápido crescimento do teletrabalho no período da pandemia impulsionou um aumento nas doenças relacionadas ao trabalho. Sem tempo para se adaptar, grande parte da população passou a trabalhar em ambientes improvisados. As consequências diretas foram o desenvolvimento de posturas inadequadas, a intensificação de esforços, cargas de trabalho excessivas e a insuficiência de períodos de descanso (VIEIRA; DE BARROS, 2025).
Devemos considerar que trabalhar em casa durante a pandemia foi diferente do teletrabalho em condições normais até porque o trabalho realizado em casa durante a pandemia ocorreu por um período prolongado, de forma involuntária e em circunstâncias externas complexas, provocando níveis mais altos de ansiedade nos trabalhadores, o que foi intensificado pelo contexto da crise sanitária e econômica vivenciada naquele período (BARROS et al., 2020 apud ANTUNES et al. 2023).
A ausência de limites claros entre o trabalho e a vida pessoal pode levar à sobrecarga de tarefas, dificultando a desconexão e prejudicando o bem-estar emocional. O isolamento social, a falta de interação presencial com colegas e a pressão por disponibilidade constante são fatores cruciais para o aumento do estresse, ansiedade e exaustão mental. Diante desse cenário, é fundamental compreender os impactos do teletrabalho na saúde psicológica e buscar soluções para mitigar seus riscos (DE MEDEIROS SIZENANDO; DE MEDEIROS TORRES, 2025).
A essa problemática, somam-se os índices preocupantes de adoecimento por Síndrome de Burnout, a elevada prevalência de ansiedade e depressão e o aumento nas reclamações trabalhistas que apontam doenças mentais ou emocionais ligadas às exigências ocupacionais. Esses indicadores revelam que o ambiente de trabalho não apenas influencia as condições financeiras, mas também exerce um impacto profundo na saúde física e emocional dos empregados. No contexto do home office, o isolamento social e a sensação de disponibilidade ininterrupta exacerbam esses desafios, evidenciando a urgência de políticas eficazes de proteção à saúde do trabalhador. Tais medidas são cruciais para prevenir o esgotamento extremo e garantir o bem-estar dos trabalhadores (DE MEDEIROS SIZENANDO; DE MEDEIROS TORRES, 2025).
Diante do exposto, o acompanhamento contínuo das legislações brasileiras relacionadas à segurança e saúde no trabalho não é apenas uma formalidade, mas uma necessidade premente. É fundamental que as normas, como a NR-01 e a LDRT, sejam constantemente avaliadas para garantir sua conformidade e relevância frente às rápidas transformações nas modalidades de trabalho. A evolução do mercado, impulsionada por novas tecnologias e formatos como o teletrabalho, acarreta impactos significativos na vida e na saúde dos trabalhadores, tanto física quanto mental. Manter as legislações atualizadas permite que o arcabouço legal reflita a realidade atual, protegendo adequadamente os indivíduos e promovendo ambientes de trabalho mais seguros e saudáveis, independentemente de onde o trabalho é executado (BARROS et al., 2020 apud ANTUNES et al. 2023; BRASIL, 2023; BRASIL, 2024).
4 DESAFIOS JURÍDICOS DO TELETRABALHO NO CENÁRIO PÓS-PANDÊMICO
O teletrabalho oferece diversas vantagens, como o aumento da eficiência, a redução de custos para empresas e funcionários, a diminuição do trânsito e a melhora na qualidade de vida dos trabalhadores. Contudo, essa modalidade também apresenta desvantagens, incluindo o isolamento do colaborador, que pode prejudicar seu desenvolvimento profissional e o trabalho em equipe, além de elevar o risco de vazamento de dados e gerar custos adicionais com equipamentos de teletrabalho (SANTOS; FALCÃO, 2024).
Embora tenha sido formalmente reconhecido no sistema jurídico brasileiro pela Reforma Trabalhista de 2017, foi somente com a pandemia de COVID-19 que o teletrabalho se popularizou no país. No entanto, a legislação já dava sinais anteriores dessa modalidade: o artigo 6º da CLT, em sua redação de 2011, já se referia ao trabalho realizado fora das dependências do empregador, incluindo a distância e o domicílio, com destaque para a menção a meios telemáticos em seu parágrafo único. Diante disso, a interpretação mais pertinente do artigo 6º indica que, ao analisar casos de teletrabalho, o magistrado trabalhista deve, inicialmente, averiguar a existência de acordos de jornada e determinar se o empregado está sujeito a horários fixos ou se sua atuação é verificada pela entrega de relatórios e resultados. No entanto, em ambas as situações, uma legislação mais precisa seria benéfica. O ideal seria ter uma norma dedicada ao teletrabalho, dada a diversidade de aplicações tecnológicas que ele permite (BRASIL, 2011, BRASIL, 2017, SANTOS; FALCÃO, 2024).
A Medida Provisória (MP) nº 927/2020 (BRASIL, D.O.U, 2020), promulgada durante o período de calamidade pública, estabeleceu, em seu artigo 4º, a seguinte permissão para o teletrabalho: "o empregador poderá, a seu critério, alterar o regime de trabalho presencial para o teletrabalho, o trabalho remoto ou outro tipo de trabalho a distância." A MP não entrou em conflito com a CLT, mas teve o efeito de reduzir as exigências burocráticas vigentes naquele período (SANTOS; FALCÃO, 2024).
Sabemos que é de responsabilidade do empregador garantir condições adequadas de trabalho, uma das preocupações é que com o teletrabalho essa regra não seja seguida, que ocasione doenças e afastamentos laborais. O TRT3 já proferiu decisões sobre esse assunto:
EMENTA: INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DOENÇA PROFISSIONAL. CULPA DO EMPREGADOR. EMPREGADO EM DOMICÍLIO. O fato de o empregado trabalhar em domicílio não constitui, por si só, motivo para eximir o empregador da observância das normas de segurança e medicina do trabalho, colocando o trabalhador à margem da proteção legal que deve abranger “todos os locais de trabalho”, sem distinção (artigo 154 da CLT). É certo que não há como exigir do empregador, em semelhante circunstância, a fiscalização cotidiana dos serviços prestados, inclusive quanto à efetiva observância pelo empregado das normas de segurança e medicina, mesmo porque a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem o consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial, nos termos da garantia estatuída no artigo 5º, inciso XI, da Constituição Federal. Essa particularidade, sem dúvida, constitui elemento que vai interferir na gradação da culpa do empregador em relação a eventual doença profissional constatada, mas não permite isentá-lo do cumprimento de obrigações mínimas, como a de instruir os empregados quanto às precauções a tomar no sentido de evitar acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais, nos termos do artigo 157, II, da CLT, além de fornecer mobiliário adequado, orientando o empregado quanto à postura correta (artigo 199 da CLT), pausas para descanso, etc. Verificado o descumprimento dessas obrigações primordiais pelo empregador, em face da sua omissão negligente no tocante aos cuidados com a saúde da empregada, é inegável a sua culpa no surgimento da doença profissional constatada, incidindo sua responsabilidade pela compensação do dano moral sofrido pela obreira. -TRT-00208-2006-143-03-00-2-RO.
A partir do exposto foi possível perceber um parecer favorável ao trabalhador, exaltando a preocupação com o bem-estar e com o a responsabilidade do empregador para com o empregado mesmo quando este não está nas dependências da empresa. Ainda, vale mencionar, que esta é uma análise singular, dada a carência de informações que permitam um estudo comparativo das decisões proferidas sobre o tema em âmbito Nacional.
Em 27 de novembro de 2023, o Ministério da Saúde publicou a Portaria GM/MS nº 1999, que atualiza significativamente a Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho (LDRT). Esta nova versão, que substitui a antiga lista de 1999, expande o número de códigos de doenças de 182 para 347, refletindo uma incorporação mais abrangente das enfermidades relacionadas ao trabalho na atualidade (BRASIL, 2023).
A Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho (LDRT) é uma ferramenta indispensável que desempenha um papel crucial na saúde do trabalhador. Ela qualifica a atenção integral, aprimora o diagnóstico e a elaboração de projetos terapêuticos, além de facilitar o reconhecimento da ligação entre o adoecimento e o ambiente de trabalho. Essencialmente, a LDRT orienta as ações de vigilância e promoção da saúde, ao mesmo tempo em que aprimora o desenvolvimento de políticas públicas voltadas para o bem-estar dos trabalhadores, consolidando-se como um pilar fundamental para a saúde ocupacional no país (BRASIL, 2023).
A atualização da Portaria nº 1999 foi resultado de um processo robusto e colaborativo, dividido em cinco etapas. Ele envolveu discussões em oficinas de trabalho, revisões e contribuições de importantes instituições como os Centros de Referência em Saúde do Trabalhador, o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems) e a academia. Além disso, o texto foi submetido a consulta pública, garantindo a participação social e a transparência do processo (BRASIL, 2023).
A revisão periódica e a ampliação da LDRT não apenas cumprem uma determinação legal, mas também permitem o acompanhamento das transformações nos processos produtivos do país. Essas mudanças podem acarretar novas consequências para a saúde dos trabalhadores e a lista atualizada garante que essas novas realidades sejam reconhecidas e tratadas de forma adequada (BRASIL, 2023).
Em agosto de 2024 foi publicada a PORTARIA Nº 1.419, que visa aprimorar e atualizar as normas regulamentadoras relacionadas à segurança e saúde no trabalho, em suma, a Portaria nº 1.419, foi criada gerenciamento de riscos ocupacionais, visando proteger ainda mais os trabalhadores e adaptar as normas à realidade atual do mercado e das tecnologias. Considerando a análise da NR 01, que trata sobre disposições gerais e gerenciamento de riscos ocupacionais, pode perceber que a legislação vem tentando acompanhar as mudanças nas formas de trabalho e seus impactos na saúde do trabalhador (BRASIL, 2024a).
O teletrabalho acentua fatores que comprometem a saúde mental, tais como: isolamento, sobrecarga, dificuldade de desconexão, pressão por disponibilidade constante. A inclusão dos riscos psicossociais na NR-1 torna ainda mais evidente a responsabilidade do empregador em gerenciar esses riscos também para os teletrabalhadores (BRASIL, 2024a).
Embora a NR-1 não detalhe o teletrabalho, ela estabelece os princípios gerais de segurança e saúde. As novas exigências de gerenciamento de riscos psicossociais impactam diretamente a forma como as empresas devem assegurar um ambiente de trabalho saudável, mesmo que remoto. Para os teletrabalhadores, essa inclusão na NR-01 exige que as empresas adotem medidas práticas e integradas ao PGR. Não basta apenas reconhecer os riscos como isolamento, sobrecarga e dificuldade de desconexão; é preciso identificá-los, avaliá-los, e implementar medidas de prevenção e controle eficazes. Isso pode envolver a criação de políticas claras de desconexão, a promoção de uma comunicação transparente sobre expectativas e horários, o oferecimento de suporte psicológico e a capacitação de líderes para gerenciar equipes remotas com foco no bem-estar mental. O objetivo é construir um ambiente de trabalho remoto que minimize os fatores de estresse e promova a saúde mental, refletindo o compromisso do empregador com a integridade global de seus funcionários. (BRASIL, 2024a)
Segundo o ministro Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, em 24 de abril de 2025, "Durante esse primeiro ano, será um processo de implantação educativa, e a autuação pela Inspeção do Trabalho só terá início em 26 de maio de 2026". Na mesma ocasião, foi anunciado o lançamento do Guia de Informações sobre os Fatores de Riscos Psicossociais Relacionados ao Trabalho. Para garantir a clareza e combater a desinformação, o diretor do Departamento de Segurança e Saúde no Trabalho do MTE, Rogério Araújo, informou que um manual com orientações técnicas detalhadas será disponibilizado em até 90 dias. Esse material terá o objetivo de esclarecer procedimentos e aspectos regulamentados, coibindo a ação de profissionais que possam se beneficiar da falta de informação. A portaria que oficializa essas definições será publicada nos próximos dias (BRASIL, 2025).
Compreende-se que grandes mudanças exigem um tempo de adaptação por parte das empresas e dos próprios trabalhadores, o que justifica a concessão de períodos de transição. No entanto, quando essas mudanças são decorrentes de reflexos negativos importantes e urgentes à saúde do trabalhador, como o aumento de problemas de saúde mental no teletrabalho, evidenciado pelo isolamento e sobrecarga, a extensão desses prazos se torna um ponto crítico. Diante de consequências já significativas e crescentes, é imperativo que ações imediatas de cuidado e proteção à saúde dos trabalhadores afetados sejam priorizadas e implementadas de forma mais célere. A lentidão na aplicação plena das normas pode resultar em um custo humano elevado, reforçando a necessidade de equilibrar a gradualidade da adaptação com a urgência das medidas protetivas (BRASIL, 2025).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir do que foi exposto através desse trabalho, pode-se inferir que o estudo alcançou seu objetivo, pois analisou a existência de impactos nas modalidades de trabalho decorrentes da Reforma trabalhista de 2017 e apresentou os impactos no contexto da pandemia de COVID-19. Foi possível perceber que houveram transformações que ocasionaram mudanças significativas que influenciaram as novas modalidades de trabalho, tais como uma certa flexibilização em relação ao local de trabalho, alteração no tempo da jornada, causado pela retirada do deslocamento do trabalhador, porém também tiveram os impactos negativos que ocasionaram um adoecimento em grande parte dos trabalhadores brasileiros, que se viram obrigados a se isolarem em suas residências e trabalharem sob uma grande pressão e sem as devidas condições de trabalho.
As mudanças na legislação que se deram antes da pandemia com a reforma trabalhista de 2017 e teve seu fortalecimento durante o período pandêmico, se perduraram até os dias atuais, gerando uma necessidade de atualizações, tendo como mais recente a publicação da NR 01 que visa definir as diretrizes para o gerenciamentos de riscos ocupacionais, dando destaque para os riscos psicossociais, ela obriga as empresas a implementarem um processo contínuo de identificação de perigos, avaliação de riscos e adoção de medidas de controle para proteger a saúde e a segurança dos trabalhadores. Com Objetivo de prevenir acidentes e doenças relacionadas ao trabalho, mesmo que de forma remota, porém a NR 01 está em fase de implementação, não sendo possível avaliar seus efeitos na vida do trabalhador, que já sofre com o adoecimento em decorrência das suas condições de trabalho.
No que diz respeito ao direito, é evidente que as legislações brasileiras têm demonstrado um esforço para acompanhar as mudanças e as demandas emergentes do dinâmico mundo do trabalho. Há um reconhecimento da necessidade de adaptar as normas para proteger os trabalhadores diante de novas realidades. Contudo, essa adaptação, embora louvável, apresenta um paradoxo preocupante: os prazos estendidos para a implementação completa das legislações que visam à proteção da saúde do trabalhador.
Foi possível perceber que a legislação trabalhista tenta acompanhar as mudanças no mundo laboral, mas ela não garante que o empregado seja resguardado, necessita mais fiscalização por parte do ministério do trabalho para que se tenha um acompanhamento dessas mudanças e que o trabalhador se sinta amparado pela legislação.
Essa vigilância legislativa é crucial para que o Brasil não apenas cumpra determinações legais, mas também se mantenha à frente na prevenção de doenças ocupacionais e na promoção do bem-estar. O diálogo contínuo entre órgãos reguladores, especialistas, empresas e trabalhadores é essencial para identificar lacunas, propor ajustes e assegurar que as políticas públicas e as práticas de gerenciamento de riscos estejam alinhadas com os desafios emergentes. A capacidade de adaptar as normas às novas realidades é o que garantirá a efetividade das ações de saúde e segurança, protegendo a força de trabalho e contribuindo para um desenvolvimento socioeconômico mais justo e sustentável.
Por fim, por se tratar de um tema que emerge na contemporaneidade, pode-se esperar que a presente pesquisa tenha continuidade e contribua com pesquisas futuras sobre o assunto trabalhado.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº 12.551, de 15 de dezembro de 2011. Altera o art. 6o da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei no 5.452, de 1o de maio de 1943, para fazer referência expressa à possibilidade de adoção de meios telemáticos e informatizados de controle e supervisão à distância. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 16 dez. 2011. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12551.htm>. Acesso em: 22 de maio, 2025.
BRASIL, LEI Nº 13.467, DE 13 DE JULHO DE 2017. Altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, e as Leis n º 6.019, de 3 de janeiro de 1974, 8.036, de 11 de maio de 1990, e 8.212, de 24 de julho de 1991, a fim de adequar a legislação às novas relações de trabalho. Disponível em:<https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13467.htm>. Acesso em: 11 de maio,2025.
BRASIL. Medida Provisória nº 927, de 22 de março de 2020. Dispõe sobre as medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19). Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 mar. 2020. Edição extra. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/mpv/mpv927.htm>. Acesso em: 21 de maio, 2025.
BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria GM/MS nº 1.999, de 27 de novembro de 2023. Altera a Portaria de Consolidação GM/MS nº 5, de 28 de setembro de 2017 para atualizar a Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho (LDRT). Diário Oficial da União, Brasília, DF, 27 nov. 2023. Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/acesso-a-informacao/gestao-do-sus/articulacao-interfederativa/cit/pautas-de-reunioes-e-resumos/2024/janeiro/informe-svsa-para-atualizar-a-lista-de-doencas-relacionadas-ao-trabalho-ldrt/view>. Acesso em: 31 de maio, 2025.
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Acadêmica de Direito, Centro Universitário Una, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil .
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ANDRADE, Belkys Rodrigues Batista. O impacto das novas formas de trabalho nas relações trabalhistas: desafios e perspectivas no Brasil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 jul 2025, 04:37. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/69213/o-impacto-das-novas-formas-de-trabalho-nas-relaes-trabalhistas-desafios-e-perspectivas-no-brasil. Acesso em: 14 ago 2025.
Por: Vitor dos Reis Canedo
Por: LANA MARIA PINHEIRO FURTADO
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