MARCELA APARECIDA DE MORAES
(orientadora)
RESUMO: O tráfico internacional de pessoas para fins de exploração sexual configura hoje como uma das mais graves e complexas violações aos direitos humanos na contemporaneidade, dado que afeta diretamente a dignidade, a liberdade e a integridade física e psíquica das vítimas. Trata-se de uma prática criminosa de alcance global, que ainda desafia os sistemas jurídicos nacionais e a cooperação internacional, exigindo-se ações coordenadas de prevenção, repressão e proteção internas e em cooperação internacional. Partindo-se desse contexto, este estudo propôs uma breve análise sobre o caso brasileiro e a tutela legal contra o tráfico internacional para a exploração sexual no Brasil, através de revisão bibliográfica que examinou textos científicos e normas jurídicas, em especial, a Lei nº 13.344/2016. A exposição foi precedida da conceituação e a contextualização histórica da prática do tráfico humano, a fim de se compreender a evolução desse crime sob os aspectos sociais, econômicos e políticos, bem como uma abordagem sobre os sujeitos envolvidos, suas características e as redes de aliciamento e exploração. Diante da relevância do tema, este trabalho buscou representar a consolidação de estudos atuais sobre o tema, considerando-se a necessidade de atualização constante do estado da arte, para que hajam subsídios contemporâneos capazes de subsidiar novos estudos ou fundamentar a adoção de políticas públicas no âmbito nacional e internacional.
Palavras-chave: exploração sexual; pessoas; tráfico de pessoas; tráfico sexual.
ABSTRACT: International human trafficking for the purpose of sexual exploitation stands today as one of the most serious and complex violations of human rights in contemporary times, as it directly affects the dignity, freedom, and physical and psychological integrity of its victims. It constitutes a criminal practice of global reach that continues to challenge national legal systems and international cooperation, thus requiring coordinated actions of prevention, repression, and protection both domestically and through international collaboration. Within this context, the present study proposes a brief analysis of the Brazilian case and the legal framework against international trafficking for sexual exploitation in Brazil, based on a literature review that examined academic texts and legal norms, especially Law No. 13,344/2016. The exposition is preceded by the conceptualization and historical contextualization of human trafficking in order to understand the evolution of this crime from social, economic, and political perspectives, as well as a discussion on the individuals involved, their characteristics, and the recruitment and exploitation networks. Given the relevance of the topic, this paper aims to represent a consolidation of current studies on the subject, taking into account the need for the continuous updating of the state of the art, so that contemporary knowledge may provide a basis for future research and support the development of public policies at both national and international levels.
Keywords: sexual exploitation; people; trafficking in persons; sex trafficking.
1 INTRODUÇÃO
O tráfico internacional de pessoas para fins de exploração sexual configura-se, na atualidade, como uma das mais graves e complexas violações aos direitos humanos, uma vez que atinge de forma direta a dignidade, a liberdade e a integridade física e psíquica das vítimas. Trata-se de uma prática criminosa de alcance transnacional, cujas dimensões e impactos ainda representam um grande desafio aos sistemas jurídicos nacionais, bem como à efetividade da cooperação internacional. Nesse cenário, tornam-se imprescindíveis ações coordenadas de prevenção, repressão e proteção, tanto no âmbito interno quanto por meio de mecanismos de colaboração entre os países.
Considerando-se esse contexto, o presente estudo propôs uma breve análise sobre a realidade brasileira e a forma como o ordenamento jurídico nacional tem buscado enfrentar o tráfico internacional de pessoas com fins de exploração sexual. Para tanto, foi realizada uma revisão bibliográfica contemplando textos científicos e normas jurídicas pertinentes, com destaque especial para a Lei nº 13.344/2016, que dispõe sobre o enfrentamento ao tráfico de pessoas no Brasil.
A exposição foi precedida da conceituação e da contextualização histórica do tráfico humano, com o objetivo de compreender a evolução dessa prática criminosa à luz dos aspectos sociais, econômicos e políticos que a sustentam. Além disso, abordaram-se os sujeitos envolvidos, suas principais características, bem como o funcionamento das redes de aliciamento e exploração que perpetuam esse crime. Diante da relevância e da atualidade do tema, este trabalho buscou reunir e consolidar reflexões acadêmicas recentes, contribuindo para o fortalecimento do debate e para a construção de novos referenciais teóricos e práticos.
Nesse sentido, reforça-se a importância de manter uma constante atualização do estado da arte, de forma a fornecer subsídios contemporâneos que sirvam de base para futuras pesquisas e para a formulação de políticas públicas eficazes no enfrentamento ao tráfico internacional de pessoas, tanto no plano nacional quanto no cenário global.
Ao longo deste trabalho, buscou-se traçar uma linha evolutiva do tráfico humano, partindo de suas origens históricas até os desafios enfrentados na contemporaneidade. Na segunda seção, abordou-se o conceito, as formas e o contexto histórico do tráfico humano, destacando seu papel nas práticas escravagistas, especialmente durante o período colonial brasileiro. Em seguida, na terceira seção, analisou-se o desenvolvimento normativo internacional voltado à repressão do tráfico de pessoas, com destaque para os tratados do início do século XX e sua progressiva ampliação até a Convenção de Palermo. Já na quarta seção, discutiu-se criticamente o tráfico para fins de exploração sexual no Brasil, abordando tanto aspectos históricos quanto a evolução legislativa nacional, culminando-se na promulgação da Lei nº 13.344/2016, que representa o marco mais recente e abrangente no enfrentamento a essa grave violação dos direitos humanos.
2 O TRÁFICO HUMANO
O tráfico humano é uma prática que referencia as condutas de recrutamento, transporte, transferência, alojamento ou acolhimento de pessoas, por meio de ameaça, coerção, engano ou abuso de poder, com o objetivo de explorá-las. Essa exploração pode assumir diversas formas, como o trabalho forçado, a exploração sexual, o tráfico de órgãos, a servidão ou a adoção ilegal (Bitencourt, 2021). O tráfico humano passou a ser uma atividade caracterizada por sua reiteração desde século XIX, embora existam evidências históricas de práticas semelhantes em outros períodos da humanidade (Balbino, 2017).
Assim, a prática era realizada desde as mais antigas concepções de sociedade, existindo-se relatos da sua existência ainda na antiguidade, presente na Grécia antiga e em Roma, mas assim se consolidou séculos depois, significada a partir de outros parâmetros (Balbino, 2017). Como lembra Balbino (2017), os relatos na antiguidade clássica acerca do tráfico de pessoas remetem aos crimes de guerra e à escravidão imposta a prisioneiros de guerra. Posteriormente, a prática foi utilizada para fins comerciais entre os séculos XIV e XVII.
O tráfico humano é destacadamente identificado na prática do tráfico negreiro no período de colonização das Américas, para “onde os europeus se mudavam com o intuito de formar uma nova sociedade com características próprias”, daí realizando intensa exploração de territórios e povos dominados (Balbino, 2017). Como lembra Fausto (1996), o tráfico negreiro teve origem no século XV, quando os portugueses, cientes do valor mercantil dos escravos, começaram a traficar pessoas para auxiliar a construção de novas sociedades, sendo que nas últimas décadas do século XVI já era evidente a sua lucratividade (Fausto, 1996).
Esse registro histórico do tráfico humano está intimamente associado ao surgimento do Brasil, que serviu como colônia de exploração e povoamento por povos europeus e recebeu incontáveis contingentes de pessoas traficadas da África em razão das dificuldades de manter a mão de obra indígena escrava, fato consumativo ao início do processo de tráfico e exploração negreira para trabalhos forçados (Fausto, 1996). Como lembra Boris Fausto (1996), existem razões pelas quais a opção pelo tráfico de pessoas da África foi adotada no Brasil em detrimento ao trabalho escravo indígena:
As razões da opção pelo escravo africano foram muitas. É melhor não falar em causas, mas em um conjunto de fatores. A escravização do índio chocou-se com uma série de inconvenientes, tendo em vista os fins da colonização. Os índios tinham uma cultura incompatível com o trabalho intensivo e regular e mais ainda compulsório, como pretendido pelos europeus. Não eram vadios ou preguiçosos. Apenas faziam o necessário para garantir sua subsistência, o que não era difícil em uma época de peixes abundantes, frutas e animais. Muito de sua energia e imaginação era empregada nos rituais, nas celebrações e nas guerras. As noções de trabalho contínuo ou do que hoje chamaríamos de produtividade eram totalmente estranhas a eles (Fausto, 1996, p. 28).
Assim, a escolha pelo uso do escravo africano durante a colonização não se deve a uma única causa, mas a diversos fatores combinados. A tentativa de escravizar os povos indígenas encontrou obstáculos significativos, principalmente porque seus modos de vida e valores culturais não se alinhavam com as exigências de trabalho contínuo e forçado impostas pelos colonizadores. Os indígenas não eram preguiçosos, mas viviam conforme suas necessidades de subsistência, aproveitando os recursos naturais disponíveis. Sua dedicação estava voltada a práticas culturais, como rituais e guerras, e não à lógica de produção constante, que lhes era completamente alheia (Fausto, 1996).
O tráfico humano, nesse período, era considerado uma atividade comum, não havia óbices legais ou jurídicas como nos dias de hoje (Freyre, 2003). Os negros eram utilizados como mercadorias, sem qualquer direito ou proteção, possuíam apenas valor econômico (Freyre, 2003). Além dos trabalhos forçados, costumeiramente as mulheres eram sexualmente exploradas e obrigadas atos sexuais e libidinosos pelos seus senhores, o que se observava no período no Brasil, como lembra Gilberto Freyre[1]:
Foram os senhores das casas-grandes que contaminaram de lues (sílis) as negras das senzalas. Negras tantas vezes entregues virgens, ainda mulecas de 12 e 13 anos, a rapazes brancos já podres da sílis das cidades. Porque por muito tempo dominou no Brasil a crença de que para o silítico não há melhor depurativo que uma negrinha virgem (Freyre, 2003, p. 207).
Enquanto algumas escravas eram violentadas por seus senhores, outras eram exploradas para fins de comercialização sexual. Como lembra Balbino (2017, p. 16), os homens escravos eram utilizados por sua força, empenhados em serviços braçais, enquanto as mulheres eram entregues aos serviços domésticos e à exploração sexual. Foi a partir desse contexto que a exploração sexual passou a tomar projeção até alcançar o status atual, de prática violadora de direitos e garantias fundamentais reprimida com rigor pelo direito internacional e pelos sistemas jurídicos de grande parte dos países.
3 O TRÁFICO DE PESSOAS NO CONTEXTO ATUAL
Com a abolição da escravatura, findou-se a formal e intensa exploração de pessoas negras. Com o advento do capitalismo e com o crescimento da vida urbana, como aponta Balbino (2017), o tráfico humano passou a se fundar no tráfico de mulheres brancas em razão do processo imigratório de europeus no período, e com esta “nova roupagem, a conduta delituosa começou a crescer exponencialmente, o que foi corroborado pelas correntes migratórias que ocorreram ao final do século XIX” (Balbino, 2017, p. 16). Esta foi uma tendência mundial, razão pela qual surgiu a necessidade de se estabelecer medidas contra o tráfico de mulheres brancas, sendo que, em 1904, foi celebrado um acordo internacional pela Liga das Nações Unidas para repressão do tráfico de mulheres brancas, subscrito em Paris (Balbino, 2017).
Na atualidade, como sintetizam Silva e Santos (2023), o tráfico de pessoas não tem uma motivação específica, servindo-se a vários propósitos, razão pela qual não se pode conceitua-lo contemporaneamente; em verdade, tem até mesmo um viés imigratório, em um cenário que alimenta o deslocamento territorial de pessoas, ocorrida através do vinculado convencimento, uso da forma ou outras formas de coação:
Nessa perspectiva, no que concerne à conceituação do termo, o tráfico de pessoas não exprime apenas a exploração ou o simples comércio da prostituição (lenocínio) ou a simples exploração de pessoas, de modo que, para evidência do tráfico, tanto basta que o traficante facilite ou promova os meios para que as pessoas comerciadas ou traficadas venham de país estranho para o mercado nacional, que do país saiam para mercados estrangeiros, ou promova ou facilite o deslocamento de alguém dentro do território nacional para o exercício da prostituição ou outra forma de exploração sexual (Santos; Silva, 2023, p. 3).
Nesses termos, o tráfico de pessoas vai além do simples comércio ou exploração ligados à prostituição. Ele abrange qualquer ação que envolva facilitar ou promover o deslocamento de pessoas — seja entre países ou dentro do próprio território nacional — com a finalidade de exploração, especialmente sexual. Isso inclui tanto o envio de vítimas para o exterior quanto sua vinda de fora para o país, bastando que haja intenção de explorá-las (Santos; Silva, 2023).
A tutela jurídica repressiva ao tráfico de mulheres foi uma das mais importantes inovações jurídicas no que diz respeito à proteção contra o tráfico de pessoas, servindo-se como fundamento para as normas jurídicas promulgadas nas décadas seguintes em reforço à tutela específica contra essa prática, tendo como um de seus mais notáveis ápices o Tratado Internacional para Eliminação do Tráfico de Escravas Brancas.
Inquietações de ordem moral produziram, em 1904, na esteira da discussão sobre tráfico para práticas escravistas nas Américas, o Tratado Internacional para Eliminação do Tráfico de Escravas Brancas. Esse foi o primeiro instrumento internacional que tratou de tráfico para exploração sexual. Encontramos referências a um instrumento inglês de 1885, o Criminal Law Amendment Act, que mencionava o tráfico de mulheres para prostituição, mas que não se constituía como uma norma específica sobre a questão. No preâmbulo do tratado de 1904, Suas Majestades dos principais impérios e domínios ocidentais da época se comprometem a proteger mulheres e crianças do White Slave Traffic. O artigo primeiro desse documento traz a intenção fundamental do tratado: os governos deveriam se comprometer contra a perseguição de mulheres e crianças para objetivos imorais no estrangeiro. O artigo segundo previa que cada Estado se responsabilizaria por manter vigilância, especialmente em estações de trem, portos de embarcações e durante seus trajetos, sobre pessoas acusadas de designar a mulheres e crianças uma vida imoral (Verson; Pedro, 2013, p. 63).
Assim, em 1904, preocupações de cunho moral levaram à criação do primeiro tratado internacional voltado ao combate do tráfico para fins de exploração sexual: o Tratado para Eliminação do Tráfico de Escravas Brancas. Embora já existisse uma lei inglesa de 1885 que mencionava esse tipo de tráfico, ela não tratava especificamente da questão. O tratado de 1904 contou com o compromisso dos líderes das principais potências ocidentais em proteger mulheres e crianças contra o chamado "tráfico de escravas brancas". Seu primeiro artigo previa que os governos deveriam combater a perseguição de mulheres e crianças destinadas à exploração no exterior. Já o segundo determinava que os Estados adotassem medidas de vigilância em locais estratégicos, como estações ferroviárias e portos, para prevenir esse tipo de prática (Verson; Pedro, 2013).
Para ilustrar, seguem os principais artigos do Tratado, recepcionado pela ordem jurídica brasileira por meio do Decreto nº 5.591 de 1905:
Art. 1º Cada um dos Governos contractantes se obriga a nomear ou designar uma autoridade encarregada de reunir todos os dados relativos ao alliciamento de mulheres, virgens ou não, com o fim de prostituil-as no estrangeiro. Esse funccionario terá a faculdade de corresponder-se directamente com a repartição similar estabelecida em cada um dos outros Estados contractantes.
Art. 2º Cada um dos Governos se obriga a estabelecer um serviço de vigilancia tendo por fim descobrir, especialmente nas estações de caminhos de ferro, portos de embarque e em viagens, os individuos incumbidos de acompanhar as mulheres, virgens ou não, que são destinadas á prostituição. Aos funccionarios ou a quaesquer outras pessoas habilitadas para esse effeito, serão dadas instrucções, dentro dos limites legaes, afim de conseguir todas as informações de natureza a facilitar a descoberta de qualquer trafico criminoso. A chegada de pessoas que pareçam evidentemente ser autores, cumplices ou victimas de semelhante trafico, será communicada, dado o caso, quer ás autoridades do logar de destino, quer aos agentes diplomaticos ou consulares interessados, quer ainda a quaesquer outras autoridades competentes.
Art. 3º Os Governos se obrigam a mandar receber, quando assim acontecer e dentro dos limites legaes, as declarações das mulheres, virgens ou não, de nacionalidade estrangeira, que se entreguem à prostituição, no sentido de determinar sua identidade e estado civil, e indagar quem as induziu a abandonar seu paiz. As informações recolhidas, serão communicadas ás autoridades do paiz de origem das ditas mulheres, virgens ou não, para facilitar sua eventual repatriação. Os Governos se obrigam, dentro dos limites legaes e tanto quanto possivel, a confiar, a título provisorio, e tendo em vista a eventual repatriação, a instituições de assistencia pública ou privada ou a particulares que offereçam as necessarias garantias, ás victimas desse trafico, quando ellas se achem desprovidas de recursos. Os Governos se obrigam igualmente, dentro dos limites legaes e na medida do possivel, a repatriar aquellas das mulheres, virgens ou não, que o solicitarem ou que vierem a ser reclamadas pelas pessoas que sobre ellas tenham autoridade. A repatriação só será effectuada após accordo quanto á identidade e nacionalidade, bem como quanto ao logar e á data da chegada á fronteira. Cada um dos paizes contractantes facilitará o respectivo transito no seu territorio. A correspondencia relativas ás repatriações far-se-ha, tanto quanto possivel, por via directa.
Art. 4º Quando a mulher, virem ou não, que se tenha de repatriar, não puder indemnizar por si mesma as despezas do seu transporte e não tenha nem marido, nem paes, nem tutor, que o possam fazer, taes despezas correrão por conta do paiz em cujo territorio ella resida, até a fronteira proxima ou porto de embarque com destino ao paiz de origem, e por conta deste, todas as mais (Brasil, 1905).
Por esses termos, o tratado de 1905 estabeleceu obrigações para os países signatários no combate ao tráfico de mulheres para fins de prostituição no exterior. O Art. 1º determinava que cada governo nomeasse uma autoridade responsável por reunir informações sobre o aliciamento dessas mulheres, com liberdade para trocar dados diretamente com órgãos equivalentes de outros países. O Art. 2º exigia a criação de um sistema de vigilância, especialmente em locais estratégicos como estações de trem e portos, para identificar e acompanhar suspeitos de envolvimento no tráfico, além de comunicar às autoridades competentes a presença de possíveis vítimas, autores ou cúmplices (Brasil, 1905).
O Art. 3º previa que os governos deveriam colher depoimentos de mulheres estrangeiras envolvidas com a prostituição para verificar identidade, estado civil e quem as aliciou, enviando essas informações ao país de origem, a fim de viabilizar a repatriação. Caso estivessem sem recursos, as vítimas poderiam ser encaminhadas, de forma provisória, a instituições ou pessoas que oferecessem garantias adequadas. Já o Art. 4º estabelecia que os custos da repatriação seriam divididos: o país onde a mulher estivesse arcaria com os custos até a fronteira ou porto, e o país de origem assumiria os demais gastos, exceto se houvesse responsável legal que pudesse custear a viagem (Brasil, 1905).
Mas como lembrou Damásio de Jesus (2003), este primeiro documento internacional foi ineficaz, principalmente por imprimir uma visão “centrada na Europa”, incompatível com o contexto de proteção internacional, seguindo-se aí um documento em 1910, que “complementou o primeiro na medida em que incluía provisões para punir os aliciadores” (Jesus, 2003, p. 27). Em 1921[2] e 1933, foram elaborados outros instrumentos pela Liga das Nações, que eram ainda mais abrangentes, e todos os quatro foram consolidados pela Convenção de 1949, que “permaneceu como o único instrumento especificamente voltado para o problema do tráfico de pessoas até a adoção da Convenção de Palermo e seus Protocolos” (Jesus, 2003, p. 27).
Em 1949, um eco da criação da ONU produziu a Convenção para Eliminação do Tráfico de Pessoas e Exploração da Prostituição de Outrem, que tratava de pessoas traficadas para fins de exploração sexual, consolidou outros acordos internacionais anteriores e foi adotada pela Assembleia Geral. Essa convenção declarava que a escravização de mulheres e crianças para prostituição era incompatível com a dignidade e os direitos fundamentais de seres humanos. Nesse contexto, os anseios eram diferenciados daqueles do início do século, pois falava-se de seres humanos ao invés de mulheres e crianças, e falava-se de exploração da prostituição ao invés de referir-se à escravização. Eram diferentes miras e objetivos, que produziram diferentes sujeitos. Marjan Wijers explicou que o que havia em comum entre a Convenção de 1949 e aquela do início do século era que ambas estavam predominantemente baseadas no sistema abolicionista, que pretende a eliminação da prostituição. De um lado, trabalhar como prostituta não era punível, mas o envolvimento de outras pessoas o era, fosse o administrador do bordel ou um amigo, independentemente do consentimento da mulher, ou se ela era ou não explorada. Apesar de ter proposto eliminar o tráfico e a exploração da prostituição, e não a prostituição em si mesma, a normativa de 1949 não deixava claras definições do que seria uma coisa ou outra (Verson; Pedro, 2013, p. 71)[3].
Nesses termos, a Convenção de 1949, resultado da atuação da recém-criada ONU, foi um marco na consolidação de tratados internacionais anteriores sobre o tráfico de pessoas com fins de exploração sexual. Adotada pela Assembleia Geral, ela afirmava que submeter mulheres e crianças à prostituição forçada era incompatível com a dignidade humana e os direitos fundamentais. Diferente dos tratados do início do século XX, que falavam em “escravidão de mulheres e crianças”, a nova abordagem usava os termos “seres humanos” e “exploração da prostituição”, refletindo uma mudança de foco nos sujeitos e nos objetivos da proteção (Verson; Pedro, 2013).
Assim, o tráfico de pessoas, embora tenha assumido diferentes configurações ao longo do tempo, permanece como uma grave violação dos direitos humanos, com raízes históricas que remontam à escravidão formal e que se atualizam em práticas contemporâneas marcadas pela exploração sexual, trabalho forçado, tráfico de órgãos e outras formas degradantes de subjugação humana. A evolução normativa internacional — iniciada com tratados centrados na repressão ao tráfico de mulheres brancas e culminando na Convenção de 1949 e posteriormente na Convenção de Palermo — revela um esforço gradativo de ampliar o entendimento do fenômeno e garantir proteção mais ampla e efetiva às vítimas. Contudo, apesar dos avanços legais e institucionais, os desafios persistem, sobretudo no enfrentamento das causas estruturais do tráfico, como a pobreza, a desigualdade social e a vulnerabilidade migratória.
4 ANÁLISE CRÍTICA DO TRÁFICO PARA EXPLORAÇÃO SEXUAL NO BRASIL: ALGUMAS DISCUSSÕES
A exploração sexual é uma forma grave de violência que ocorre em escala global, mobilizando-se diferentes setores da sociedade e instituições na busca por soluções para enfrentá-la (Leite; Rocha.; Cury, 2023). A prostituição, historicamente associada a uma infração moral, já foi considerada crime no Brasil, especialmente sob a ótica dos antigos artigos 231 e 231-A do Código Penal (Leite; Rocha.; Cury, 2023). Atualmente, no entanto, entende-se que exercer a prostituição por vontade própria, como forma de sustento, não configura exploração (Leite; Rocha.; Cury, 2023).
A chamada “autoexploração” não existe juridicamente, pois, nesse contexto, a pessoa exerce atividade profissional de maneira autônoma, sem que haja coação, engano ou abuso (Leite; Rocha.; Cury, 2023). Mesmo a atuação de terceiros, como donos de estabelecimentos ou intermediários, não configura, por si só, o crime de exploração sexual, desde que não haja violência, fraude ou aproveitamento indevido da vulnerabilidade alheia (Leite; Rocha.; Cury, 2023). A exploração sexual propriamente dita ocorre quando há obtenção de lucros mediante coerção, ameaça, engano ou outras formas de dominação sobre a vítima, ou seja, quando a liberdade e dignidade sexual do indivíduo são violadas em benefício de terceiros (Leite; Rocha.; Cury, 2023).
4.1 A evolução legal no Brasil
Como lembram Verson e Pedro (2013), O Tratado Internacional para Eliminação do Tráfico de Mulheres Brancas, de 1904, foi estabelecido em uma conferência internacional ocorrida em paris em 1902, do qual o Brasil fez parte. Tal acordo foi recepcionado no Brasil por meio do Decreto nº 5.591 de 1905. Não houve, com a edição da Lei, uma alteração interna na legislação, mas foi o pontapé inicial para que a questão fosse internamente tratada pelo sistema jurídico brasileiro (Verson; Pedro, 2013).
Alguns anos mais tarde, foi promulgada a Lei nº 2.942 de 1915, que deu nova redação aos artigos 277 e 288 do Código Penal em vigor, de 1890, para seguir a tendência internacional de debater tráfico e aliciamento de pessoas para a prostituição. Como lembram Verson e Pedro (2013), O art. 277 previa como crime "induzir alguém, por meio de engano, violencia, ameaça, abusos de poder, ou qualquer outro meio de coacção a satisfazer os desejos deshonestos ou paixões lascivas de outrem. Excitar, fornecer, ou facilitar a prostituição de outrem" (BRASIL, 1915).
De acordo com Verson e Pedro (2013), somente no ano de 1940 é que a questão foi tratada novamente pela legislação penal, desta vez no Código Penal de 1940. Apesar de repetir técnica semelhante ao Código anterior, tratando-se da conduta de atrair e facilitar a prostituição e de manter casa de prostituição em dois breves artigos. Mais uma vez, o legislador cuidou de não tipificar como crime o ato de prostituir-se, mas sim a de facilitar ou manter alguém se prostituindo. Sobre essa lógica, explicam Verson e Pedro (2013) explicam que o tráfico, nesta hipótese, seria
(...) uma modalidade de lenocínio. O exercício da prostituição não é penalizado, tampouco quem compra tal serviço, mas qualquer ajuda ou facilitação é desencorajada. Essa disposição confusa de permissões e proibições parece estratégica para satisfazer as mesmas contraditórias demandas do século XIX: se a prostituição é um atentado à civilização, ao mesmo tempo serviria de alívio para instintos irrefreáveis e sustentaria a honra das famílias, devendo, portanto, ser tolerada. Hoje, esse entendimento tem muito pouco espaço nos estudos sobre as sexualidades. Não há mais que se falar em instintos ou pulsões, mas em chamada à ordem nas relações de gênero; nem mesmo em violências sexuais, mas em violências de gênero (VERSON; PEDRO, 2013, p. 70).
Assim, de acordo com Verson e Pedro (2013), há uma contradição histórica no tratamento da prostituição: embora a prática em si e seus clientes não sejam criminalizados, qualquer forma de auxílio ou facilitação é penalizada. Essa ambiguidade legal reflete uma lógica herdada do século XIX, quando a prostituição era vista simultaneamente como uma ameaça moral e uma válvula de escape para desejos masculinos, sendo, por isso, tolerada. Atualmente, essa visão é superada por abordagens mais críticas, que analisam o tema a partir das relações de gênero e da violência estrutural, afastando-se de noções biologizantes como "instintos".
Recentemente, no ano de 2009, as referências ao tráfico de pessoas para fins de exploração sexual no Código Penal foram mudadas pela Lei nº 12.015, que deu nova redação aos artigos 231, prevendo-se o tráfico internacional de “pessoa” para fim de exploração sexual, bastando-se apenas uma vítima para sua configuração (Brasil, 2009); além do art. 288, que trata do induzimento à prostituição, agora aplicável a quem “induzir ou atrair alguém à prostituição ou outra forma de exploração sexual, facilitá-la, impedir ou dificultar que alguém a abandone” (Brasil, 2009).
4.1.1 A Lei nº 13.344/2016
A tutela legal contra o tráfico de pessoas estabelecida pelo Código Penal foi alterada pela Lei nº 13.344 de 2016, que dispõe sobre a prevenção e repressão ao tráfico interno e internacional de pessoas e sobre medidas de atenção às vítimas; além de alterar a Lei nº 6.815, de 19 de agosto de 1980, o Decreto-Lei nº 3.689, de 03 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), e o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); e revoga dispositivos do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal) (Brasil, 2016). O Ministério da Justiça defende o atual marco legal do enfrentamento ao crime de tráfico de pessoas:
Organizado em três eixos (prevenção, proteção à vítima e repressão), o novo marco legal, além de ampliar o rol de finalidades do crime de tráfico de pessoas, trouxe outro importante avanço referente ao eixo da proteção, com a criação de uma política completa de assistência às vítimas, que prevê assistência jurídica, social, trabalho e emprego, saúde, acolhimento e abrigo provisório, prevenção à revitimização da pessoa e atendimento humanizado (Ministério da Justiça, 2020, p. 15).
A Lei nº 13.344 de 2016 representa hoje o mais importante diploma legal a tratar das políticas de prevenção e repressão ao tráfico interno e internacional e sobre medidas de atenção às vítimas, destacando, em seu art. 2º, os princípios aplicáveis ao enfrentamento ao tráfico de pessoas:
(...)I - respeito à dignidade da pessoa humana; II - promoção e garantia da cidadania e dos direitos humanos; III - universalidade, indivisibilidade e interdependência; IV - não discriminação por motivo de gênero, orientação sexual, origem étnica ou social, procedência, nacionalidade, atuação profissional, raça, religião, faixa etária, situação migratória ou outro status ; V - transversalidade das dimensões de gênero, orientação sexual, origem étnica ou social, procedência, raça e faixa etária nas políticas públicas; VI - atenção integral às vítimas diretas e indiretas, independentemente de nacionalidade e de colaboração em investigações ou processos judiciais; VII - proteção integral da criança e do adolescente (BRASIL, 2016).
O art. 3º da Lei, por sua vez, indica as diretrizes aplicáveis ao enfrentamento ao tráfico de pessoas:
(...)I - fortalecimento do pacto federativo, por meio da atuação conjunta e articulada das esferas de governo no âmbito das respectivas competências; II - articulação com organizações governamentais e não governamentais nacionais e estrangeiras; III - incentivo à participação da sociedade em instâncias de controle social e das entidades de classe ou profissionais na discussão das políticas sobre tráfico de pessoas; IV - estruturação da rede de enfrentamento ao tráfico de pessoas, envolvendo todas as esferas de governo e organizações da sociedade civil; V - fortalecimento da atuação em áreas ou regiões de maior incidência do delito, como as de fronteira, portos, aeroportos, rodovias e estações rodoviárias e ferroviárias; VI - estímulo à cooperação internacional; VII - incentivo à realização de estudos e pesquisas e ao seu compartilhamento; VIII - preservação do sigilo dos procedimentos administrativos e judiciais, nos termos da lei; IX - gestão integrada para coordenação da política e dos planos nacionais de enfrentamento ao tráfico de pessoas (BRASIL, 2006).
Nos artigos 4º e seguintes a Lei trata sobre os meios legais de prevenção e repressão ao tráfico de pessoas; da proteção e assistência às vítimas e das campanhas relacionadas ao enfrentamento ao tráfico de pessoas. A Lei revoga os artigos do Código Penal que tratam do assunto, inserindo o novo art. 149-A, prevendo nova roupagem ao crime de tráfico de pessoas, trazendo espécies e finalidades pelas quais tal fato pode ocorrer:
Art. 149-A. Agenciar, aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar ou acolher pessoa, mediante grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso, com a finalidade de: I - remover-lhe órgãos, tecidos ou partes do corpo; II - submetê-la a trabalho em condições análogas à de escravo; III - submetê-la a qualquer tipo de servidão; IV - adoção ilegal; ou V - exploração sexual. Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. § 1º A pena é aumentada de um terço até a metade se: I - o crime for cometido por funcionário público no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las; II - o crime for cometido contra criança, adolescente ou pessoa idosa ou com deficiência; III - o agente se prevalecer de relações de parentesco, domésticas, de coabitação, de hospitalidade, de dependência econômica, de autoridade ou de superioridade hierárquica inerente ao exercício de emprego, cargo ou função; ou IV - a vítima do tráfico de pessoas for retirada do território nacional. § 2º A pena é reduzida de um a dois terços se o agente for primário e não integrar organização criminosa (BrasiL, 2016).
Como pode ser observado, a Lei manteve a técnica dos artigos revogados ao estabelecer o tráfico sexual como uma finalidade ou espécie de tráfico de pessoas. Atualmente, este é o cenário jurídico-legislativo brasileiro da proteção contra o tráfico de pessoas, inclusive para fins de exploração sexual. Dessa forma, a Lei nº 13.344/2016 representa um marco importante na legislação brasileira ao abordar o tráfico de pessoas de maneira mais ampla, integrada e humanizada. Sua formulação reflete uma evolução normativa sensível às transformações sociais e ao contexto internacional, alinhando-se às diretrizes de direitos humanos e às convenções das quais o Brasil é signatário.
Ao longo desta pesquisa, buscou-se traçar uma linha evolutiva do tráfico humano, partindo-se de suas origens históricas até os desafios enfrentados na contemporaneidade. Na segunda seção, abordou-se o conceito, as formas e o contexto histórico do tráfico humano, destacando-se seu papel nas práticas escravagistas, especialmente durante o período colonial brasileiro. Em seguida, na terceira seção, analisou-se o desenvolvimento normativo internacional voltado à repressão do tráfico de pessoas, com destaque para os tratados do início do século XX e sua progressiva ampliação até a Convenção de Palermo. Já na quarta seção, discutiu-se criticamente o tráfico para fins de exploração sexual no Brasil, abordando tanto aspectos históricos quanto a evolução legislativa nacional, culminando-se na promulgação da Lei nº 13.344/2016, que representa o marco mais recente e abrangente no enfrentamento a essa grave violação dos direitos humanos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A análise jurídica do crime de tráfico de pessoas para fins de exploração sexual demonstra avanços importantes no ordenamento jurídico brasileiro, especialmente com a promulgação da Lei nº 13.344/2016 (Leite; Rocha.; Cury, 2023). Apesar de o tráfico humano não ser um fenômeno recente, foi somente com essa lei que o Brasil passou a dispor de um marco normativo específico e alinhado à Convenção de Palermo, abordando o problema sob três pilares fundamentais: prevenção, repressão e assistência às vítimas (Leite; Rocha.; Cury, 2023). A nova legislação substituiu os antigos artigos 231 e 231-A do Código Penal, consolidando essas condutas no artigo 149-A, que define e penaliza ações como agenciar, recrutar ou transportar pessoas com finalidades como remoção de órgãos, trabalho análogo à escravidão, servidão, adoção ilegal ou exploração sexual (Leite; Rocha.; Cury, 2023).
Além disso, a lei classificou o tráfico de pessoas como crime hediondo, endurecendo-se as penalidades e dificultando benefícios penais como o livramento condicional (Leite; Rocha.; Cury, 2023). O novo tipo penal exige dolo por parte do agente, ou seja, a prática intencional e consciente da conduta criminosa. A doutrina destaca a natureza dolosa das ações e o objeto material do crime, ou seja, a própria pessoa traficada (Leite; Rocha.; Cury, 2023).
Embora a lei represente um importante avanço legislativo, há críticas quanto à sua efetiva implementação, o que evidencia a necessidade de acompanhar sua aplicação prática e fortalecer as políticas públicas que a sustentam (Leite; Rocha.; Cury, 2023). No contexto internacional, observam-se semelhanças com legislações de outros países, como Portugal, onde o crime passou por diversas reformulações, refletindo a mudança de uma abordagem moralista para uma perspectiva centrada nos direitos individuais e na liberdade sexual (Leite; Rocha.; Cury, 2023). Portanto, a consolidação do artigo 149-A no Brasil simboliza uma atualização legislativa e também um esforço de alinhamento com os princípios internacionais de combate ao tráfico humano e proteção da dignidade da pessoa humana (Leite; Rocha.; Cury, 2023).
De acordo com Barros et. al. (2023) tráfico humano para fins de exploração sexual é uma das formas mais cruéis e lucrativas dessa atividade criminosa, caracterizada por submeter pessoas, especialmente mulheres, adolescentes e crianças, a situações de violência, coerção e degradação da dignidade humana. Trata-se de um crime antigo, complexo e de difícil detecção, pois, muitas vezes, as vítimas são invisibilizadas ou equivocadamente tratadas como imigrantes ilegais ou envolvidas voluntariamente em práticas sexuais, o que compromete o adequado acolhimento e proteção (Barros; et. al, 2023).
No Brasil, embora existam normas legais como a Lei nº 13.344/2016 e políticas públicas voltadas ao enfrentamento do tráfico de pessoas, os desafios para a repressão desse crime são numerosos. A ausência de dados consolidados, a baixa capacitação dos profissionais do sistema de justiça, a morosidade processual e a falta de varas especializadas contribuem para a impunidade dos agenciadores e exploradores (Barros; et. al, 2023).
Ademais, o tráfico para fins de exploração sexual ocorre, em sua maioria, com pessoas em condição de extrema vulnerabilidade — marcadas por baixa escolaridade, pobreza, discriminação de gênero e exclusão social — que são aliciadas com promessas de emprego, estabilidade financeira ou melhoria de vida. Muitas dessas vítimas acabam sendo mantidas sob controle psicológico ou físico em ambientes de exploração, seja no Brasil ou no exterior. Apesar de esse crime configurar a terceira atividade ilícita mais lucrativa do mundo, superado apenas pelo tráfico de drogas e armas, sua repressão ainda é incipiente no Brasil, exigindo medidas mais eficazes de prevenção, identificação e responsabilização (Barros; et. al, 2023).
Dessa forma, a efetiva aplicação do princípio da dignidade da pessoa humana, previsto na Constituição Federal de 1988 (Brasil, 1988), deve ser o alicerce de qualquer política ou ação judicial que vise enfrentar o tráfico humano para fins de exploração sexual (Barros; et. al, 2023). Isso inclui, dentre outras medidas, o investimento em em campanhas educativas, capacitação de profissionais jurídicos, fortalecimento das redes de proteção às vítimas e ampliação das estruturas especializadas.
REFERÊNCIAS
BALBINO, Vanessa Alves Nery. Tráfico internacional de pessoas para fins de exploração sexual. Orientador: Dr. David Augusto Fernandes. Trabalho de Conclusão de Curso (apresentado como requisito parcial para a obtenção de grau de bacharel em direito da Universidade Federal Fluminense). Universidade Federal Fluminense, Macaé, 2017.
BARROS, Claudiane Morais Rezende; et. al. Tráfico de pessoas: os desafios no combate ao crime de tráfico de pessoas sob um viés social e jurídico no Brasil. Revista Ibero-Americana De Humanidades, Ciências E Educação, 9(11), 2484–2496, 2023.
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Especial: Crimes contra a pessoa. São Paulo: Saraiva, 2021.
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FAUSTO, Boris. História do Brasil. Revista História e História Moderna da FAJ Edusp, São Paulo, 1996. Disponível em: https://www.passeidireto.com/arquivo/18832123/historia-do-brasil-boris-fausto-colonia. Acesso em: 26 mai. 2025.
FREYRE, Gilberto. Casa grande e senzala. São Paulo: Global, 2003. Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/229314/mod_resource/content/1/Gilberto%20Freyre%20-%20Casa-Grande%20e%20Senzala.pdf. Acesso em: 26 mai. 2025.
LEITE, Fabiola Lopes; ROCHA, Samuel dos Santos; CURY, Letícia Vivianne Miranda. O tráfico internacional de pessoas para fins de exploração sexual: uma análise jurídica. Revista Ibero-Americana de Humanidades, Ciências e Educação. São Paulo, v.9.n.10. out.2023.
SILVA, Vanessa Santana da; SANTOS, Cinthya Silva. Tráfico internacional de pessoas para fins de exploração sexual. Revista Ibero-Americana de Humanidades, Ciências e Educação-REASERevista Ibero-Americana de Humanidades, Ciências e Educação. São Paulo, v.9.n.04. abr. 2023.
VERSON, Anamaria MArcon; PEDRO, Joana Maria. Tráfico de pessoas: uma história do conceito. Revista Brasileira de História, v. 33, n. 65, São Paulo, 2013.
[1]De acordo com Freyre (2008, p. 538): “mas o grosso da prostituição formaram-no as negras, exploradas pelos brancos. Foram os corpos das negras ─ às vezes meninas de dez anos ─ que constituíram, na arquitetura moral do patriarcalismo brasileiro, o bloco formidável que defendeu dos ataque afoitezas dos don-juas a virtude das senhoras brancas”.
[2]Também aderida pelo Brasil por meio do Creto nº 23.812 de 1934.
[3] Segundo os autores: “(...) a Convenção de 1949 passou a ser duramente criticada por ignorar outras formas de tráfico (para serviços domésticos, noivas por correspondência, trabalhos na indústria têxtil e na agricultura), por deixar de considerar tráfico dentro de um mesmo país e por desconsiderar crueldades em outros trabalhos. Em 1979, a Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW) obrigou os países signatários a tomarem medidas apropriadas para eliminar todas as formas de tráfico e de exploração da prostituição de mulheres. Várias outras proposições legislativas internacionais tematizando o que se convencionou chamar 'tráfico' foram produzidas ao longo do século XX, mas nenhuma teve efetividade relevante” (Verson; Pedro, 2013, p. 71-72).
Acadêmica de Direito pelo Centro Universitário Una - Linha Verde e Estagiaria de direito na Fernandes e Fernandes Sociedade de Advogados
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MARTINS, Fernanda Vitoria Figueiredo. Algumas considerações sobre a tutela legal contra o tráfico internacional de pessoas para fins de exploração sexual no Brasil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 jul 2025, 04:46. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/69059/algumas-consideraes-sobre-a-tutela-legal-contra-o-trfico-internacional-de-pessoas-para-fins-de-explorao-sexual-no-brasil. Acesso em: 14 ago 2025.
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