RESUMO: As potências militares iniciaram uma busca vertiginosa pela tétrade nuclear, visando operar lançamentos de mísseis nucleares do espaço suborbital. O presente ensaio analisa a viabilidade jurídica desta empreitada, incursionando no Direito Nuclear e nas intenções de celebrar um tratado definitivo que coíba uma nova corrida armamentista na fronteira espacial.
Introdução
O Tratado do Espaço Exterior de 1967 proibiu o lançamento de armas nucleares em órbita, visando conter a corrida de nuclearização nos sistemas antissatélites (ASAT), interditando também o Sistema de Bombardeio Orbital Fracional (FOBS), que acabou desativado em 1983.
Com efeito, as detonações suborbitais podem criar cinturões de radiação no espaço, como demonstrado pelo teste Starfish Prime. A atual corrida armamentista, contudo, tem um escopo mais amplo que a inativação de satélites, buscando a alocação de armas nucleares no espaço para alvos designados em terra, pondo em risco a segurança internacional.
Além das armas nucleares espaciais, a regulação internacional deve coibir ainda os mísseis que transpõem o espaço como meio de cobrir toda a circunferência terrestre, como o míssil chinês DF-5C (Dongfeng - vento leste). Este míssil é sucessor do DF-5 de 1984, e foi apresentado em Pequim no desfile em comemoração aos 80 anos da vitória sobre o Japão na Segunda Guerra Mundial, realizado em setembro de 2025.
O DF-5C transporta uma dúzia de ogivas, e possui um sistema de orientação que utiliza a luz das estrelas, com alcance de 20 mil km em velocidade hipersônica, o que faz sua área de ataque cobrir toda a superfície terrestre. Para tanto, a ogiva nuclear é colocada em órbita terrestre baixa, tornando o caminho de ataque imprevisível.
Em 2025, a Alemanha também anunciou uma militarização acelerada, com investimentos imediatos da ordem de 300 bilhões de euros e adoção do serviço militar obrigatório. O país é dos cinco membros da OTAN que possuem armas nucleares em seu território como parte de acordos de participação, hospedando até 20 bombas nucleares B61 posicionadas na base aérea de Büchel, cujo acionamento é exclusivo dos EUA.
De igual maneira, a Polônia fechou acordo com a França para compartilhamento de armas nucleares. Fora da Europa, a Arábia Saudita firmou acordo com o Paquistão visando compartilhar as mesmas armas. Além dos acordos de participação, alguns países têm buscado desenvolver suas próprias armas nucleares, como Coreia do Norte e Irã.
Paralelamente, em recente pronunciamento, o presidente dos EUA declarou que aceita reduzir o arsenal nuclear do país, caso a Rússia e a China façam o mesmo. Com efeito, a China logo se tornará uma potência nuclear de primeiro nível, fazendo com o nova rodada do tratado START envolva três nações, ao invés de duas.
Direito Nuclear
O primeiro tratado Internacional START (Tratado de Redução de Armas Estratégicas) foi firmado em 1991 entre os EUA e a URSS, pouco antes da dissolução do bloco soviético. Paradoxalmente, o termo faz alusão ao icônico botão vermelho de acionamento dos mísseis nucleares. Não por outra razão, chamaremos o tratado internacional a ser firmado pelas potências nucleares de FINISH, no almejo de que seja definitivo no controle destas armas.
A corrida nuclear espacial é objeto de intensa preocupação de analistas militares (in https://www.iir.cz/en/militarisation-of-space-and-nuclear-weapons). Por outro lado, as forças armadas russas incorporaram o míssil Burevestnik, que tanto é equipado com ogivas nucleares, quanto é movido por energia nuclear, além do torpedo nuclear secreto Poseidon.
Esta corrida armamentista gera pressão pela regulamentação internacional que ponha um freio na nuclearização. De fato, o prêmio Nobel de 2017 foi destinado a uma instituição que luta pela abolição das armas nucleares.
Historicamente, a primeira resolução da Assembleia Geral da ONU foi sobre essas armas (Res. 1 - Establishment of a Commission to Deal with the Problems Raised by the Discovery of Atomic Energy), adotada em 24/01/1946, quando ainda se reunia em Londres.
Desde 1968, o Brasil é parte do Tratado para a Proscrição de Armas Nucleares na América Latina e no Caribe (Tratado de Tlatelolco), que estabeleceu a primeira Zona Livre de Armas Nucleares (ZLAN) em uma região permanentemente habitada. Atualmente, existem ZLANs também no Pacífico Sul (Tratado de Rarotonga), no Sudeste Asiático (Tratado de Bangkok), na Ásia Central (Tratado da Ásia Central) e na África (Tratado de Pelindaba), bem como no território da Mongólia.
O TNP buscou um desarmamento nuclear geral e completo, entrando em vigor em 1970. O Brasil aderiu aos seus termos por meio do Decreto n° 2864. Em maio de 1995, o TNP foi prorrogado por prazo indeterminado. Países como Índia, Israel, Paquistão e Sudão do Sul não aderiram ao tratado, tendo a Coreia do Norte o denunciado em 2003, passando a ostentar um status controverso. Já o Tratado sobre a Proibição das Armas Nucleares (TPAN) entrou em vigor em 2021, tendo o Brasil aderido em 2017. No entanto, nenhum país nuclear aderiu a este tratado.
Apesar da ampla adesão brasileira aos tratados contra armas nucleares, no decorrer do ano de 2025, o ex-embaixador em Washington e Londres Rubens Barbosa participou de vários veículos de mídia defendendo que o Brasil repense sua estratégia nuclear, despertando temores de que esta corrida armamentista chegue à América do Sul.
A histórica do Brasil com a energia nuclear teve início com o acordo firmado com a Alemanha Ocidental, despertando no governo da época ambições de uso bélico. Em 1988, contudo, com a promulgação da CF, o artigo 21, XXIII, “a” dispôs que toda atividade nuclear em território nacional somente será admitida para fins pacíficos e mediante aprovação do Congresso Nacional, pondo um fim na pretensão de uso militar.
Logo em seguida, em 1990, o então presidente Collor viajou à icônica Serra do Cachimbo, no Pará, e deixou-se fotografar jogando uma pá de cal no poço de testes do afamado “Programa Nuclear Paralelo".
No ano seguinte, o presidente Sarney firmou o acordo de Guadalajara com o presidente argentino, encerrando a desconfiança nuclear entre as duas nações. Por fim, em 1998, o Brasil aderiu incondicionalmente ao Tratado de Não Proliferação - TNP por meio do Decreto nº 2864.
Atualmente, o Brasil é um dos poucos países do mundo que domina todo o ciclo do Urânio, desde a extração até o enriquecimento, tendo a quinta maior reserva mundial do minério. Com efeito, as ultracentrífugas em Resende-RJ operadas pela FCN (da INB) utilizam tecnologia desenvolvida pelo Ipen em parceria com a Marinha do Brasil para abastecer as usinas nucleares.
O domínio do ciclo completo possibilita o rápido direcionamento desta estrutura para a fabricação de ogivas, mas o país não possui ICBMs, o que torna inócuo o arsenal nuclear produzido.
O físico do IME Dalton Ellery G. Barroso publicou recentemente um livro, disponível à venda (https://www.livrariadafisica.com.br/detalhe_produto.aspx?id=31458), onde desenvolveu um modelo matemático para simulação computacional de um moderno e compacto explosivo termonuclear, com resultados coincidentes com os dados da ogiva W87, levantando rumores de espionagem, que foram logo descartadas.
Argentina e México também fizeram gestões proficientes pela desnuclearização da região. Com efeito, há muitos anos o México possui capacidade técnica para fabricar armas nucleares, mas renunciou a elas com o Tratado de Tlatelolco em 1968, com os esforços mexicanos evitando a proliferação dessas armas na América Latina. No entanto, se houver um ataque ao território dos Estados Unidos, a radiação irá atingir fortemente as cidades mexicanas.
De seu turno, a Argentina opera atualmente três usinas nucleares, com potência conjunta da ordem de 1.700 Mw. O Brasil opera duas usinas, com potência total de 2.000 Mw. A terceira usina está prevista para 2030, elevando a capacidade brasileira para 3.400 Mw, o dobro da Argentina.
A justiça nuclear foi objeto da resolução da Primeira Comissão da Assembleia Geral das Nações Unidas, que previa o ressarcimento aos familiares das vítimas de Tarawa do Sul, no Kiribati. Essa resolução intensificou o debate entre nuclearistas e desnuclearistas, incluindo a ética da chantagem nuclear.
Há cerca de uma década, em outubro de 2016, a Corte Internacional de Justiça rejeitou a demanda das Ilhas Marshall contra as potências nucleares por oito votos a dois, não adentrando no mérito da causa (case Marshall Islands versus United Kingdom). Dentre os dois votos dissidentes, destaca-se o voto proferido pelo juiz brasileiro Cançado Trindade, por sua extensão e profundidade, sendo dividido em 21 capítulos, de onde se colhem excertos notáveis:
“Assim, já em 1946, por exemplo, profundamente chocado com os bombardeios atômicos americanos de Hiroshima e Nagasaki (em 6 e 9 de agosto de 1945, respectivamente), Mahatma Gandhi, ao expressar prontamente sua preocupação com o futuro da sociedade humana, escreveu, no Jornal Harijan, em 7 de julho de 1946, que ‘até onde posso ver, a bomba atômica amorteceu o sentimento mais nobre que sustentou a humanidade por eras. Antigamente, havia as chamadas leis da guerra que a tornavam tolerável. Agora conhecemos a verdade nua e crua. A guerra não conhece lei alguma, exceto a da força.’(parágrafo 89).
O relato bíblico de Caim e Abel (Gênesis, cap. 4: 8-10) ao longo dos séculos passou a ser considerado a etiologia da fragmentação da humanidade, a partir da indiferença de um indivíduo ao destino de outro. O crescente desrespeito pela vida humana foi fomentado pela violência crescente, generalizada e descontrolada em busca de dominação. Isso foi ainda mais agravado por manipulações ideológicas e até mesmo pela desumanização dos outros, daqueles a serem vitimizados. O problema do mal continua a ser estudado, diante da capacidade humana de extrema violência e autodestruição em larga escala. A trágica mensagem do Livro de Gênesis, na minha percepção, parece perene, tão contemporânea como sempre, na atual era nuclear. (parágrafo 118).
A imposição de tamanha devastação e sofrimento constitui uma violação flagrante do direito internacional – do DIDH, do DIH e do Direito das Nações Unidas. Constitui, além disso, uma violação flagrante das normas de jus cogens. A estratégia de “dissuasão” parece abstrair tudo isso. A CIJ, como Corte Internacional de Justiça, deveria ter dado, em todas as ocasiões em que foi chamada a se pronunciar sobre armas nucleares (no exercício de sua jurisdição em questões contenciosas e consultivas), peso muito maior para a razão da humanidade, em vez da razão de Estado que nutre a ‘dissuasão’. (parágrafo 139).
Sou originário da região do mundo, a América Latina, que, juntamente com o Caribe, forma a primeira região do mundo a proibir armas nucleares e a se proclamar zona livre de armas nucleares. A iniciativa pioneira neste domínio, da América Latina e do Caribe, resultou na adoção do Tratado para a Proibição de Armas Nucleares na América Latina e no Caribe, de 1967, e seus dois Protocolos Adicionais. Seu alcance transcendeu a América Latina e o Caribe, como evidenciado pelos seus dois Protocolos Adicionais.” (parágrafo 247).
Por fim, no último parágrafo do voto, Cançado Trindade asseverou:
“Um mundo com arsenais de armas nucleares, como o nosso, está fadado a destruir seu passado, ameaça perigosamente o presente e não tem futuro algum. As armas nucleares pavimentam o caminho para o nada. No meu entendimento, a Corte Internacional de Justiça, como principal órgão judicial das Nações Unidas, deveria, no presente julgamento, ter demonstrado sensibilidade a esse respeito e deveria ter dado sua contribuição a uma questão que é uma grande preocupação da vulnerável comunidade internacional e, de fato, da humanidade como um todo.” (parágrafo 327).
O Alvorecer da Era Atômica
Dois fenômenos sempre intrigaram o homem no decorrer de séculos: metais magnéticos e radioativos. Quanto a este último, o cientista francês Henri Becquerel deu início às pesquisas usando sais de urânio em 1986, abrindo caminho para as pesquisas em fissão nuclear.
Os estudos em fusão iniciaram logo em seguida, com os cientistas estelares. Em 1915, William D. Harkins teorizou sobre o processo de fusão nuclear. Em 1920, Arthur Eddington mostrou que o combustível estelar provinha da fusão de hidrogênio em hélio. Em 1929, Robert Atkinson e Fritz Houtermans estimaram a taxa de fusão nuclear através do tunelamento quântico.
A partir destes estudos, foram realizados diversos experimentos em cíclotrons no decorrer da década de 1930 buscando a geração de fusão nuclear artificial. Nas décadas seguintes, foram realizados diversos cálculos de evolução temporal e composição isotópica para redes de reações termonucleares, chegando-se aos ciclos Post e Jetter.
Contudo, as atuais pesquisas de fusão nuclear atravessam o perigoso dilema de interligação entre uso pacífico e militar. De fato, há dissenso sobre se o Tratado de Proibição Completa de Testes Nucleares (TCT) impede pesquisas de ignição por fusão, que geram explosões nucleares. Estas pesquisas de fins energéticos podem ser direcionadas para a fabricação de “armas de fusão pura”, que emitem radiação de nêutrons. Apesar de terem uma explosão bem inferior às armas termonucleares, a radiação neutrônica pode se propagar a grandes distâncias e causar milhares de mortes.
Estas pesquisas estelares logo despertaram a intenção militar no final da década de 1930. Os físicos húngaros Leo Szilárd e Eugene Wigner alertaram para a possibilidade de a reação em cadeia da fissão atômica ser utilizada para a fabricação de uma bomba altamente destrutiva. E havia o risco de Hitler por as mãos nela. Afinal, a cúpula hitlerista direcionou toda a tecnologia existente à época para o propósito de destruição. O estado da arte do desenvolvimento científico nos mais diversos campos do conhecimento foi usado para a aniquilação humana.
São bem conhecidos os esforços na implementação dessas tecnologias no campo da tática militar e nos instrumentos de guerra do Terceiro Reich. Daí advieram as enormes locomotivas, tanques de guerra avançados, os foguetes V2, a asa voadora Horten Ho 229 e submarinos protegidos por poderosos bunkers de concreto. Uma estrutura concebida à custa da escravidão de milhões de pessoas.
O governo nazista também empregou modernas técnicas de psicologia de massas, propaganda, cinema, ciência política e ciência social, além de lançar mão dos maiores avanços no campo jurídico para justificar seus atos.
Além disso, manipularam a medicina e a experimentação além de qualquer limite ético, inclusive nos campos da psiquiatria e da eugenia, tal como revelado nos “Julgamentos Médicos de Nuremberg”, seguidos de perto pela infame Unidade 734 do Japão.
A eugenia já era objeto de estudo há décadas, mas foi levada às últimas consequências pelos médicos nazistas. Após essa revelação, a comunidade médica aprovou o princípio do consentimento informado para cobaias humanas. Os nazistas ainda utilizaram os maiores avanços na química e na engenharia existentes na época nos campos de concentração. Para tornar tudo isso possível, contaram com o engajamento de grandes médicos, juristas e engenheiros, além de físicos ávidos por construírem uma bomba nuclear devastadora.
Com efeito, o físico alemão Werner Heisenberg recebeu o prêmio Nobel em 1932, um ano antes da ascensão de Hitler ao poder, em reconhecimento aos seus estudos sobre a física quântica, como o postulado da incerteza, que foram cruciais para o desenvolvimento da bomba.
Com a eclosão da guerra, os nazistas abandonaram a busca por uma física ariana baseada na experimentação, que foi encabeçada por Johannes Stark, ganhador do prêmio Nobel em 1919, e passaram a adotar a física teórica dos judeus. Afinal, nesse mesmo ano a teoria da relatividade geral de Einstein, um judeu, havia sido comprovada na cidade Sobral, no Brasil. Com isso, a física dos judeus estava se sobressaindo nos círculos científicos.
Ao fim da guerra, os aliados descobriram um reator experimental de Urânio em poder dos alemães. A Missão Alsos foi desencadeada com o objetivo de capturar os cientistas envolvidos no projeto da bomba atômica nazista. Muitos físicos foram detidos e levados para em 1945 para Farm Hall em Cambridge, o mesmo local onde o MI6 se escondia.
Heisenberg ficou oito meses detido em prisão domiciliar. As conversas entre os cientistas nazistas capturados foram gravadas em sigilo e desclassificadas em 1992. As análises feitas nas gravações isentaram moralmente Heisenberg do projeto de construção da bomba nuclear pelos nazistas, já que suas diferenças com Niels Bohr eram pessoais. Com efeito, em encontro na Dinamarca ocupada, Heisenberg deu a Bohr um diagrama sobre o programa atômico alemão.
Mas as gravações comprovaram que muitos outros físicos alemães estavam implicados no projeto, que poderia ter dizimado grande parte da humanidade.
Essas lições da história mostram que a convivência com artefatos tão perigosos está além da capacidade humana. Uma alegoria pode fornecer a dimensão do problema. Entre os séculos XVI e XVIII, a Europa foi varrida por guerras religiosas, até que no século XIX seus habitantes aprenderam com o passado e abandonaram as práticas e discursos que inflamavam tais conflitos. Eles reconheceram suas próprias limitações. Da mesma forma, as gerações atuais devem aprender a reconhecer suas limitações, como alertado por Carl Sagan em 1983.
Em geral, a fissão e fusão nucleares são processos exóticos que não ocorrem naturalmente na Terra. Com efeito, a recente proposta de fusão nuclear de deutério no núcleo interno da Terra para explicar a geração de energia no centro do planeta não possui evidências claras. Mas os humanos são adaptados a pequenas doses de radiação natural, que provêm do espaço, das rochas e dos alimentos. As moradias de tijolos, concreto e pedras, por exemplo, são mais expostas à radiação existente no granito, em comparação às moradias de madeira. Mas são doses suportáveis, com algumas pessoas sendo mais suscetíveis que outras.
Com efeito, os humanos são formados por apenas 20 mil genes, e mais de 99% deles são idênticos. Isso faz com que as pessoas se distingam entre si em menos de 1% dos genes. Esse número tão baixo não é capaz de explicar toda a diversidade nas características humanas. A explicação está nos interruptores dos genes, estes sim capazes de gerar a heterogeneidade entre humanos, e a razão pela qual uns suportam mais radiação do que outros.
O principal risco da radiação natural está no radônio, que tem meia-vida de 1.600 anos e se transforma em um isótopo estável de chumbo, causando mutação no material genético. De fato, a ionização dos átomos do corpo humano leva ao rompimento das ligações químicas, gerando radicais livres que danificam o DNA e causam câncer.
Mas os efeitos do radônio não se comparam aos efeitos devastadores da radiação liberada por uma explosão nuclear, que está muito além da capacidade de adaptação humana.
Armas Nucleares Modernas
Na véspera da Segunda Guerra Mundial, os físicos acreditavam que era impossível haver uma arma com reação nuclear em cadeia, porque os nêutrons são lentos para fissionar um número suficiente de átomos necessários para desencadear uma explosão. Até que Frisch demonstrou sua viabilidade, usando meio quilo de Urânio-235 puro.
De fato, com a explosão, o material físsil se expande, fugindo ao alcance dos nêutrons. Mas com nêutrons rápidos, é possível alcançar o material físsil.
A bomba de nêutrons maximiza os efeitos irradiados pela emissão de nêutrons, devastando os organismos vivos, mas reduzindo os efeitos da destruição pelo calor e pela pressão das ondas de choque.
Já na bomba de hidrogênio, há um envoltório refletor de nêutrons, visando não só a destruição dos organismos vivos, mas também da estrutura física do alvo A radiação neutrônica é devastadora para todos os organismos vivos, por que causa a dispersão elástica dos núcleos atômicos com o escapamento de prótons. Até 80% dessa radiação é absorvida pelo corpo humano, causando a morte das células.
Com a escalada nuclear na guerra fria, foram realizados testes atômicos cada vez mais potentes, até a explosão da bomba Czar de 100 megatons pela URSS. A explosão foi tão forte que reacendeu as preocupações entre os físicos sobre a possibilidade de a reação em cadeia queimar toda a atmosfera terrestre.
O interior das ogivas termonucleares assemelha-se à telófase da divisão celular, utilizando uma combinação de explosivos químicos, fissão nuclear e fusão nuclear, numa sequência de estágios. A fissão cria calor e pressão no estado supercrítico para desencadear a fusão. O poço contendo material físsil é comprimido por ondas de choque geradas por lentes explosivas, transformando a massa subcrítica em massa crítica, iniciando a reação nuclear em cadeia.
Com efeito, a reação química comprime o material físsil, desencadeando a fissão, que em seguida libera raios X, que por sua vez elevam a temperatura e a pressão a patamares suficientes para a fusão nuclear. Para isso, são utilizados isótopos de Urânio-235 ou Plutônio-239, que liberam nêutrons em excesso na fissão. Os átomos próximos absorvem esses nêutrons, dando início a uma reação em cadeia. A massa crítica é o mínimo necessário para manter a fissão, conforme a equação de Einstein, variando conforme a densidade. Se a densidade aumenta, a massa crítica diminui, e vice-versa. Utiliza-se o gás hidrogênio, com os isótopos deutério e trítio, para induzir a fissão adicional da reação em cadeia.
Destruição Mútua Assegurada
Ao invés de apelos internacionais, sanções econômicas e manifestações massivas pelo mundo, a diplomacia atômica viu grande eficácia na ameaça do tudo ou nada. Pela doutrina MAD, que vigorou na guerra fria entre os EUA e URSS, o primeiro ataque resultaria na destruição de ambos. Em 1953, Oppenheimer comparou os dois países a dois escorpiões em uma garrafa. Quem atacasse primeiro seria atacado em seguida, significando suicídio mútuo.
Atualmente, mesmo um arsenal modesto como o do Reino Unido, com todos seus percalços operacionais e a enorme disparidade em relação ao arsenal russo, já seria capaz de garantir a destruição mútua entre as duas nações.
De fato, caso o Reino Unido seja atacado com armas nucleares pela Rússia, teria capacidade para revidar por meio de sua tríade nuclear, utilizando mísseis em terra, bombardeiros e submarinos que devastariam as vinte maiores cidades russas nas primeiras horas, o que na prática significa a garantia de destruição mútua entre as duas nações. Esta salvaguarda afiança a proscrição forçada destas armas, mantendo o mundo livre de ataques nucleares.
Ataques Convencionais Preventivos
Em julho de 2025, os EUA atacaram o complexo nuclear iraniano nas montanhas próximas à Teerã, utilizando as bombas de penetração MOP GBU-57 A/B, após a AIEA constatar enriquecimento de Urânio-235 a 83,7%, próximo do nível bélico de 90%.
A bomba GBU-57 possui uma couraça de aço Eglin de alta densidade, que permite penetrar até 60 metros no solo, mas para perfurar as instalações nucleares altamente fortificadas do complexo foram lançadas até sete bombas em sequência. Nada obstante a sofisticação tecnológica, seu mecanismo de explosão é convencional, utilizando “explosivos ligados a plástico” PBX e AFX, feitos de pó metálico.
De fato, uma única bomba nuclear de baixa potência já seria capaz de destruir bunkers com até 2 mil metros de profundidade, através da propagação das ondas de choque. Com efeito, as armas atômicas mudaram de configuração, variando não apenas a potência, mas também o design destrutivo, visando finalidades diversas.
De seu turno, a bomba Moab é conhecida como a mãe de todas as bombas convencionais. Ela utiliza asas voadoras, pesa dez toneladas e seu poder explosivo é equivalente a onze toneladas de TNT. Mas seu raio de impacto é de apenas mil e quinhentos metros. Foi usada pelos Estados Unidos em 2017 para destruir túneis e cavernas do ISIS em Nangarhar, no Afeganistão.
No Brasil, o Projeto Trocano foi iniciado em 2004 para a construção de uma das bombas termobáricas mais potentes do mundo, comparável à MOAB dos EUA e à FOAB russa, tendo poder destrutivo de 1 km e integração ao C-130 Hércules.
De uma maneira geral, a OTAN prefere o emprego de armas nucleares táticas, enquanto a Rússia prefere armas nucleares estratégicas. O último exercício militar Steadfast Noon em 2024 da OTAN envolveu 60 aeronaves, incluindo bombardeiros B-52H e caças de última geração F-35 de 13 países. A Rússia respondeu com o exercício Grom, testando mísseis intercontinentais RS-24 Yars e lançando RS-29 de submarinos nucleares no Ártico e de bombardeiros Tu-95MS.
Muitos analistas comparam os exercícios nucleares sucessivos das potências nucleares como cães bravios em lados opostos de uma jaula, latindo ferozmente um para o outro. Quando a jaula é aberta, os cães se calam e saem cada um para seu lado.
De fato, a cooperação entre os países no âmbito nuclear obedece à lógica geopolítica. Como exemplo, o Kursk era um submarino nuclear russo que afundou após a explosão acidental de um torpedo em 2000, matando 118 submarinistas. As famílias dos tripulantes passaram vários dias à espera de notícias, até a confirmação da morte. Contudo, o governo russo não aceitou ajuda ocidental para o resgate, temendo que a tecnologia nuclear empregada no submarino caísse nas mãos do inimigo.
A doutrina nuclear do não primeiro uso (NFU) foi adotado por diversos países. Por meio dela, mesmo diante de um ataque ao seu território, a resposta nuclear para dissuadir o agressor só viria em último caso, se fosse atacado com armas nucleares primeiro. Ou seja, nunca seria o primeiro a usá-las. Nos últimos anos, essa doutrina tem sido abandonada pelas potências nucleares.
O novo acordo START foi saudado com grande entusiasmo nos Estados Unidos, uma prova de que as armas nucleares são importantes vetores no equilíbrio de poder no mundo. Mas só durou alguns meses, sendo rapidamente abandonado pela Rússia após a invasão da Ucrânia em 2022. Essa invasão foi concebida após o presidente russo passar um período sabático dentro de um quarto durante a pandemia, durante o qual ele consumiu muita doutrina histórica e ideológica sobre impérios passados e ameaças futuras à Rússia.
De fato, após o desmantelamento da URSS, a Rússia travou guerras com as ex-repúblicas, como Geórgia, Chechênia e Ucrânia, mantendo constante ameaça contra as demais, como os recentes os sobrevoos de caças e drones na Polônia, Romênia e países bálticos.
De seu turno, a aliança entre EUA e Israel fez diversos ataques preventivos ao longo da história contra instalações nucleares em ascensão. Em ataque realizado em 1981, caças israelenses destruíram um reator nuclear localizado a 17 km de Bagdá, na operação Ópera, matando 10 militares iraquianos e um civil francês. A operação se mostrou precipitada e foi duramente criticada. Em 2007, Israel destruiu em um ataque aéreo um reator nuclear em Al Kibar na Síria, que já estava em estágio avançado de operação. Assim como a Síria e o Iraque, o programa iraniano também é constantemente sabotado, com a eliminação de seus principais cientistas.
Riscos Não Intencionais
Há tempos vigora no âmbito nuclear a teoria brinkmanship, que considera os riscos de um desastre não intencional, que pode desencadear uma escalada nuclear. De fato, o presidente dos EUA sempre viaja com a conhecida nuclear football, a maleta de acionamento das armas nucleares para utilização imediata. Mas os riscos de acionamento não intencional são reais, seja por meio de acidentes ou pelo emprego de algoritmos de IAG.
Em 1962, Vasili Arkhipov, vice-comandante do submarino soviético B-59, evitou o lançamento de mísseis nucleares contra os EUA, o que poderia desencadear uma guerra nuclear. O mesmo ocorreu com o tenente-coronel do exército soviético Stanislav Petrov, em 1983. Nessa época, o arsenal atômico das duas nações era estimado em mais de 60 mil bombas nucleares, cujo uso obedecia a uma lógica perigosa: quem lançasse mão delas primeiro seria devastado em seguida. Na prática, qualquer lançamento significava suicídio.
Em 1980, um soldado americano de 20 anos de idade deixou cair uma ferramenta do alto do míssil Titan II, um ICBM com a altura de um prédio de oito andares, no Arkansas. O acidente causou um vazamento de combustível no míssil, gerando um alto risco de explosão acidental. Tempos depois foi divulgado que o míssil estava equipado com ogivas nucleares, o que faria a explosão atingir o governador do Estado, Bill Clinton, que estava em uma convenção partidária a apenas oitenta quilômetros dali, dentro do raio de impacto.
Em 1969, a China se preparou para o ataque nuclear da União Soviética, com todo o Estado-Maior chinês se refugiando em um bunker contra bombas nucleares nas colinas ocidentais do país. Mas o presidente Nixon e Henry Kissinger intervieram na disputa e evitaram o ataque nuclear soviético.
O Urânio 235 é um isótopo físsil com uma concentração natural de menos de 1%. Precisa ser enriquecido para 3% ou 5% nas centrífugas para ser usado na produção de energia. Nas bombas, ele deve ser enriquecido para além de 90%. Os restos da ultracentrifugação do Urânio é um material denso, que é usado em tanques de guerra e como contrapeso em aviões. O Urânio também é uma conquista da medicina, servindo para tratamento de câncer e produção de radiofármacos. Ele ainda é importante na agricultura, com sua irradiação nos alimentos eliminando os organismos decompositores.
Mas o lixo nuclear da fissão é um problema grave que se eterniza. Os britânicos e os soviéticos inundaram os oceanos com esse lixo por décadas. A Finlândia deposita seus tonéis radioativos a quatrocentos metros de profundidade. Em Chernobyl existe uma zona de exclusão de dezenas de quilômetros, com a radiação alcançando até quinhentos quilômetros, que persistirá por séculos.
Já a fusão gera resíduos de curta duração, sendo considerada uma fonte limpa de energia. Experimentos recentes na Califórnia demonstraram a viabilidade da fusão nuclear, gerando mais energia do que foi consumido. Os pesquisadores conseguiram simular a temperatura do centro do Sol usando lasers, atingindo pressões de até 100 bilhões de atmosferas terrestres. Ainda assim, o saldo líquido de energia foi muito baixo, em torno de um megajoule, não justificando o custo de três bilhões e meio de dólares investidos no experimento.
Na década de 1980, cientistas dos Estados Unidos e da União Soviética lançaram a teoria do inverno nuclear. O modelo utilizado é consistente com uma tempestade de fogo cuja fumaça bloqueia toda a luz solar por anos.
A cadeia de comando é outro problema sério. Os Estados Unidos mantêm 400 mísseis nucleares em alerta imediato, a um simples apertar de botões. A Rússia sempre acompanha os Estados Unidos nesse quesito. O risco de um ato falho ou impensado é bastante elevado. O que começa como um acidente pode desencadear consequências imprevisíveis. E já ocorreram muitos acidentes envolvendo reações em cadeia, tanto em armas nucleares quanto em usinas, como Kyshtym, Atol de Bikini, Windscale, Three Mile Island, Chernobyl, Fukushima e o incidente em Zaporizhzhia.
No Atol de Bikini foi realizada a primeira detonação subaquática de uma arma nuclear, a bomba Banker, usando a fissão de Plutônio, com rendimento modesto de vinte e três quilotons. A bomba explodiu vinte e sete metros abaixo do mar, e despertou novos temores de propagação descontrolada da reação em cadeia por conta da maior densidade do oceano em comparação à atmosfera, o que resultaria na “queima” completa da vida marinha.
Mais de sessenta anos depois, sonares criaram um mapa geoacústico do fundo do mar e constataram a existência de uma cratera subaquática com mais de oitocentos metros de diâmetro, causada pela onda de choque da explosão. No mesmo atol, também foi detonada uma bomba cento e cinquenta metros acima do mar, a bomba Gilda, gerando uma onda de choque mais destrutiva que a própria detonação.
De fato, a onda de choque representa metade da energia explosiva da bomba. No começo, a onda viaja mais rápido que o som, reduzindo a velocidade à medida que perde energia ao passar pela atmosfera. Depois vem a radiação. A área de perigo pode abranger milhares de quilômetros quadrados a favor do vento. Os níveis de radiação são dominados por isótopos de meia-vida curta, que são mais energéticos e perigosos para os sistemas biológicos. Por fim, a precipitação radioativa expõe os sobreviventes a doses letais de radiação ionizante durante várias semanas.
Riscos Atuais das Armas Nucleares
No início dos anos de 1940, no projeto Manhattan, existia o temor de que a explosão gerasse uma reação em cadeia que varreria toda a atmosfera terrestre. De fato, dois núcleos de nitrogênio colidem e se transformam em oxigênio e carbono, liberando grande quantidade de energia. Buck chegou a dizer para Compton, um dos chefes do projeto, que “seria melhor aceitar a escravidão nazista do que correr o risco de fechar a cortina final sobre a humanidade”. Mas a chance de a reação se propagar pela atmosfera foi calculada na época em um em três milhões.
Situação semelhante ocorreu na inauguração do LHC. Na época, cogitou-se que as colisões de partículas pudessem criar pequenos buracos negros na Terra. Com base nesse risco, um processo judicial foi aberto no Tribunal Europeu de Direitos Humanos buscando evitar a operação do colisor. Em teoria, a força da gravidade é fraca para transformar matéria em buracos negros, mas as dimensões extras da teoria das cordas poderia facilitar esse processo, pois uma maior força gravitacional vazaria pelas dimensões extras. Ao final do processo judicial, uma comissão de físicos calculou a possibilidade de criação de buracos negros como extremamente remota, publicando relatórios para o público em 2003 e 2008, quando só então o colisor pode iniciar sua operação.
Atualmente, com o emprego de mísseis hipersônicos, o tempo de resposta para um ataque nuclear é inferior a dez minutos. Não à toa, há estudos para entregar essa tarefa a um programa de inteligência artificial, que detectaria o ataque por meio de sensores de radiação e condições atmosféricas, acionando autonomamente os códigos nucleares como resposta. Com isso, ainda que houvesse um colapso na central de comando do país, com a eliminação de seus principais comandantes, a resposta seria automatizada, numa tática conhecida como mão morta, cuja existência é incerta.
De fato, a operação das armas nucleares passa por uma nova fase, com revoluções computacionais significativas, tanto em hardware quanto em software, por meio do advento de computadores com armazenamento holográfico em três dimensões usando laser, processamento neuromórfico, supremacia quântica e algoritmos de IAG.
Na ficção cinematográfica, a skynet, um sistema de inteligência artificial criado para controlar o arsenal atômico, começa a pensar por conta própria, lançando ataques nucleares em 2029 que eliminam metade da população mundial, rendendo meio bilhão de dólares em bilheteria há trinta anos. Apesar de ficcional, a história gera temores atuais de implementação de inteligência artificial geral na operação do arsenal nuclear. Já o filme Stealth foi lançado há vinte anos, explorando os conceitos de bomba termobárica, como a do projeto Trocano, e controle autônomo de um caça furtivo. Mas previu o risco na computação quântica, quando na verdade o risco atual reside na IAG.
A Índia e o Paquistão são países extensos, que formavam um único subcontinente pacífico. Mas atualmente a região está conflagrada e infestada de bombas nucleares. O Paquistão gastou uma fortuna para conseguir construir seu pequeno arsenal nuclear, impondo um enorme custo financeiro à sua população. De seu turno, a Índia iria construir a maior usina nuclear do mundo, em Maharashtra, com instalação de seis reatores para a geração de quase 10 MW, mas o projeto foi interrompido. Estudos indicam que uma escalada nuclear na região seria devastadora, com um cenário de vinte detonações de potência modesta, de 50 quilotons, representando um impacto global.
Neste caso, a cordilheira do Himalaia iria proteger o norte chinês por um tempo, mas o vento radioativo chegaria ao sudeste asiático, destruindo as extensas regiões agrícolas e industriais vitais para a economia mundial. Rapidamente, o vento atingiria todo o Oriente Médio e a África, causando destruição e fome. Considerando as baixas diretas das explosões em cidades densamente povoadas da região e os efeitos indiretos subsequentes, estimou-se um total de um bilhão de mortos nos primeiros doze meses.
Outros estudos analisaram os efeitos de uma escalada nuclear na Europa Oriental. Sabe-se que os campos agrícolas da Ucrânia e da Rússia respondem por metade da produção mundial de trigo. Com isso, estima-se que o vento com radiação devastaria a região, resultando na morte de bilhões de pessoas. Já num conflito em escala global, a temperatura da Terra baixaria 8°C rapidamente, chegando a 6°C, um nível abaixo da última idade do gelo, que foi de 7,8 °C. Em 12 meses, o mundo voltaria aos patamares industriais do final do século XVIII, com uma população de apenas 750 milhões de habitantes, e a interdição de solos férteis pelo período de 500 a 800 anos. Também haveria uma drástica diminuição da fertilidade decorrente de mutações induzidas pela radiação, resultando em taxas globais negativas de natalidade e um colapso populacional em poucas gerações.
Estas estimativas, contudo, utilizam dados dos incêndios na Califórnia e na Austrália para extrapolações, além de considerar apenas as bombas estratégicas de maior potência, muito difíceis de serem empregadas. Com efeito, as bombas táticas possuem menor impacto, como a bomba B61, que pode ser calibrada em várias potências a depender da finalidade, como 0,3, 1,5, 10 ou 50 quilotons, não havendo de fato dados confiáveis para aferir os danos de um evento insólito como uma escalada nuclear.
Além do espaço suborbital, há riscos de alocação de mísseis nucleares em regiões isoladas, como a Antártica. Com efeito, diante do atual alcance do semi-círculo terrestre dos mísseis russos e chineses, o continente antártico se torna uma opção estratégica, por ser um lugar inóspito com vinte milhões de quilômetros quadrados. Existem tratados de não militarização da Antártica, mas é impossível fiscalizar todas as bases instaladas em seu território. O oceano Ártico também pode conter submarinos com ogivas nucleares.
Terrorismo Nuclear
Na busca pela bomba atômica, Iraque e Síria ficaram pelo caminho, por conta dos ataques dos Estados Unidos e de Israel. Mas o Irã testou com sucesso o míssil balístico de quarta geração Khaibar, com alcance de até dois mil quilômetros. Da mesma forma, a Coreia do Norte acredita que a Líbia só foi atacada pela OTAN porque não tinha armas nucleares. O Irã alega o mesmo, dizendo que a Ucrânia só foi invadida pela Rússia porque se desfez de seu arsenal de cinco mil ogivas nucleares em 1994.
O governo norte-coreano também utiliza seus mísseis balísticos intercontinentais para chantagem comercial, buscando amenizar as sanções econômicas, com a maior parte de sua população vivendo miseravelmente, conforme mostram as imagens noturnas de satélites, que mostram apenas um pequeno ponto brilhante onde fica o palácio do ditador.
Há sérias dúvidas sobre a desnuclearização do continente africano. A central nuclear de Koeberg é a única do continente, perto da Cidade do Cabo, no extremo sul. Contudo, a África do Sul desativou as seis bombas atômicas que possuía. Já na África Setentrional, Kadafi teve ambições de possuir armas atômicas da China quando tomou o poder na Líbia, mas foi dissuadido pela OTAN.
Na região do Sahel, a França ameaça os governos locais por recursos naturais, como o Urânio, para abastecer suas usinas nucleares, que têm o Níger como principal fornecedor. Nos últimos anos, essa região passou por uma onda de golpes militares apoiados pela Rússia.
Por seu turno, os Estados Unidos mantêm dezenas de bases militares espalhadas pelo continente africano. A França também mantém bases na África, mas tem perdido influência para a Rússia no Sahel. Recentemente, a China expandiu sua influência na África, controlando portos centrais. Por fim, o Reino Unido mantém laços militares históricos com inúmeras nações africanas. Todos esses quatro países possuem arsenais atômicos, não sendo difícil imaginar que algumas de suas ogivas estejam estrategicamente posicionadas no continente africano.
De fato, os Estados Unidos já operam mais de cem bombas nucleares em território europeu, da Bélgica à Turquia. Só na base de Incirlik há cinquenta bombas de quatrocentos quilotons. Já na África e Oriente Médio, há risco de revoluções e golpes que resultem no tráfico de ogivas por insurgentes, colocando o arsenal nuclear nas mãos de grupos terroristas.
Com efeito, após o desmantelamento da ex-União Soviética, muitos artefatos nucleares ficaram abandonados nos países do leste europeu, despertando o temor de que fossem comercializados no mercado ilegal da Ásia Central.
Na África, o Boko Haram começou apenas uma seita, como muitas que existem no continente, mas virou um grupo terrorista, cujos métodos foram criticados até por outros grupos jihadistas. Com efeito, muitas alunas de Chibok sequestradas pelo grupo na Nigéria continuam cativas de seus membros, mesmo depois de anos de pressão internacional.
Já a seita evangélica de Nthenge levou centenas de quenianos a se matarem de fome, achando que iriam mais rápido para o céu, antes que o mundo acabasse. Existem milhares de seitas semelhantes espalhadas pelo Quênia. As investigações mostraram que não se tratava de uma seita, mas sim de uma máfia bem organizada, que fazia lavagem cerebral nos seus seguidores dizendo que a imensa floresta era um santuário para o apocalipse. Mas os laudos de autópsia dos corpos exumados revelaram a falta de muitos órgãos, que foram traficados por quantias elevadas.
Nthenge era um motorista de táxi inofensivo que fundou o grupo em 2003. Mas com o tempo passou a pregar contra a educação e a medicina dos hospitais, dizendo que não estavam na Bíblia. Depois a seita se radicalizou e se tornou um grupo criminoso. As crianças que pediam comida na floresta eram espancadas até a morte com bengalas, para irem comer no céu. Além disso, os fiéis que desistissem do suicídio na floresta eram vigiados e assassinados.
Por seu turno, em Cabo Delgado, em Moçambique, a população se acostumou a assistir execuções públicas nos estádios, em espetáculos sangrentos de proporções bem maiores que as execuções em Kandahar e Cabul, mas sem a mesma indignação internacional.
O grupo terrorista ADF também jurou lealdade ao Estado Islâmico. Esse grupo terrorista era liderado por Makulu, que está preso na Tanzânia, e foi sucedido por Baluku. Foram eles que mataram os estudantes da escola Lhubiriha, em Uganda. Durante o ataque, existiam mais de 60 estudantes morando no local, quando o grupo jogou uma bomba no dormitório, seguindo-se ataques de facão, que resultaram na morte de mais de 40 estudantes que rezavam no local, e sequestro do restante. A maioria dos estudantes morreram queimados, tendo os terroristas se refugiando no parque Virunga logo em seguida.
O risco de armas nucleares nas mãos de jihadistas pode causar uma conflagração mundial, dado o afã destes grupos por devastação imotivada e desconsiderando as consequências, o que torna ineficaz a doutrina de destruição mútua assegurada.
Comparação com Outras Armas Proscritas
Uma diferença significativa entre as armas nucleares e as demais armas proibidas, como as armas químicas e biológicas, reside no fato de que as regiões afetadas não ficam inviabilizadas por séculos.
O gás mostarda foi uma das primeiras armas químicas, usada na Primeira Guerra Mundial. Mesmo sendo uma arma química, esse gás prejudica bastante o sítio de ataque, já que seus efeitos tóxicos atingem a microbiota do solo, estabelecendo ligações com as moléculas de DNA, resultando em efeitos mutagênicos e carcinogênicos que perduram por gerações. No entanto, apesar de o contato com o gás dar alguma esperança de sobrevivência aos soldados, todos tombaram após alguns dias de contaminação, sem chance de se perpetuar para gerações futuras.
As agruras do gás mostarda ficaram imortalizadas nas obras de Sargent, com pinturas impressionantes em tamanho real dos soldados contaminados. Sargent era um retratista italiano que se radicou nos Estados Unidos, vendo de perto os horrores da guerra.
Apesar da proscrição das armas químicas, o governo sírio não foi dissuadido de usar gás cloro e gás sarin em áreas densamente populosas em Ghouta, nos arredores de Damasco, matando milhares de civis. Em resposta, os EUA lançaram um ataque com mísseis às instalações militares sírias.
Já as armas biológicas são bem mais antigas. O império mogol fez intenso uso delas nos cercos às cidades conquistadas, jogando restos de animais nas fontes de água. Atualmente, existem grandes estoques de agentes infecciosos de alta letalidade, como varíola, ebola, tifo e antraz.
Mas nenhuma destas armas se comparam às armas nucleares, cujo paralelo é feito com fortes erupções vulcânicas, desastres climáticos de grandes proporções, furacões de categoria 5 e impacto de meteoros de médio porte.
Com efeito, as armas químicas e biológicas são terríveis, mas não subjugam o futuro, segundo a tragédia dos bens comuns. Para essa teoria, a viabilidade de vivermos em sociedade agora e no futuro é um bem comum de elevado valor. Com isso, um apocalipse nuclear poderia impor um estilo de vida isolado, havendo poucos grupos vagando a esmo pela Terra.
De fato, uma explosão nuclear se assemelha ao evento Tunguska, quando a onda de choque atingiu uma área de oito mil metros de diâmetro em 1908, na Sibéria. A explosão do meteoro se deu entre cinco e dez quilômetros de altitude, com a onda de fogo queimando até oitenta milhões de árvores, mas paradoxalmente não deixou nenhuma cratera no marco zero. As árvores do centro permaneceram de pé, enquanto as árvores radiais foram derrubadas.
Segundo os relatos dos habitantes, um segundo Sol de cor azulada foi visto se aproximando no horizonte. Estima-se que o objeto tinha um diâmetro de sessenta metros, com a explosão sendo detectada por sismógrafos do outro lado do mundo, como a estação sísmica de Washington, e seus efeitos na atmosfera da Terra duraram meses, deixando-a fosca.
Foram publicados mais de mil artigos científicos sobre esse evento, que ainda é cercado de mistérios. Estimativas recentes calcularam em trinta megatons a energia liberada pelo meteoro, duas mil vezes maior que a explosão da bomba Trinity. Para efeito de comparação, o meteoro Chelyabinsk, de 2013, tinha quinhentos quilotons, suficiente para fazer um grande estrago, mas explodiu no ar, gerando pequenos meteoritos. Acredita-se que o meteoro de Tunguska também se desintegrou no ar, tendo se desgarrado do corpo-mãe 2005 NB56, um enorme asteroide próximo à Terra, já que as duas órbitas são equivalentes .
O monitoramento da atmosfera por infrassons e satélites mostra que explosões aéreas de meteoros com energias comparáveis às armas nucleares ocorrem rotineiramente. Com efeito, explosões com energia de vinte quilotons, como a bomba Banker no Atol de Bikini, ocorrem anualmente na atmosfera. Já explosões com a energia de Tunguska ocorrem uma vez a cada trezentos anos. Uma explosão de trinta megatons é equivalente à erupção vulcânica do Monte Santa Helena em 1980.
Chegou-se a se cogitar de um cometa no evento de Tunguska, mas esses corpos celestes são feitos de poeira, água gelada e gases congelados, que teriam se vaporizado no impacto com a atmosfera, sem deixar vestígios. Além disso, as análises recentes dos fragmentos do sítio de Tunguska são consistentes com um meteoro de ferro. Não por acaso as primeiras expedições ao local ocorreram mais de uma década depois do incidente, e foram financiadas pelos soviéticos no intuito justamente de minerar ferro meteórico. E no Lago Cheko foram encontrados nucleotídeos provenientes de testes nucleares realizados em Novaya Zemlya, descartando a hipótese de que o lago seria a cratera do meteoro de Tunguska.
Literatura Nuclear
As graves questões relacionadas às armas e energia nucleares não passaram despercebidas da verve de diversos escritores no decorrer da segunda metade do século XX.
Henry Kissinger publicou uma análise pioneira na época da guerra fria, examinando a corrida nuclear à luz das relações internacionais. (Nuclear Weapons & Foreign Policy, W.W. Norton & Company, 1969).
Segundo Eric Schlosser:
“Cerca de oitenta mil pessoas morreram em Hiroshima e mais de dois terços dos prédios foram destruídos porque 0,7 grama de urânio-235 foi transformado em energia pura. Uma nota de um dólar pesa mais do que isso.” (Command and Control, Penguin books, 2014).
Já Vipin Narang elaborou uma tipologia original de estratégias de proliferação, dividindo em hedging, sprint, perseguição protegida e ocultação, analisando os países aspirantes ao clube atômico. (Seeking the Bomb: STRATEGIES OF NUCLEAR PROLIFERATION, Princeton university press, 2022).
De seu turno, Dmitry Adamsky examinou a influência da religião na doutrina nuclear, estendendo sua análise além da Rússia (RUSSIAN NUCLEAR ORTHODOXY: RELIGION, POLITICS, AND STRATEGY, Stanford University Press, 2019).
John W. Lewis e Xue Litai escreveram uma obra clássica sobre as aspirações nucleares chinesas que ainda se mantém atual. (China Builds the Bomb, Stanford University Press, 1988).
Na literatura ficcional, Annie Jacobsen Dutton lançou uma obra de sucesso em 2024, “Nuclear War: A Scenario”, narrando com riqueza de detalhes um ataque nuclear norte-coreano contra o território continental dos Estados Unidos, descrevendo de forma realística a possibilidade de um apocalipse nuclear.
O enredo pós apocalíptico está presente também nas obras clássicas “Alas”, “Babylon” e “On the Beach”, lançadas no calor dos acontecimentos. A história de Nevil Shute é mais drástica, porque toda a humanidade sucumbe. Primeiro no hemisfério norte, depois no hemisfério sul, até os últimos habitantes do sul australiano e do submarino americano. A visão do autor de uma terceira guerra mundial nuclear é bastante tormentosa. Ele escreveu apenas uma década depois da Segunda Guerra Mundial.
Já o livro de Pat Frank é mais ameno, pois a humanidade sobrevive. Mas a sobrevivência é bastante penosa, sem eletricidade, remédios, sal ou antibióticos, numa época em que a febre tifóide se alastrava. A história foi escrita em 1959, dois anos depois do lançamento do satélite Sputnik, quando havia o temor de um ataque russo pelo espaço e a instalação de mísseis nucleares em Cuba. No final do livro, o autor sugere que a restauração de uma área saturada por radiação levaria mil anos, que ele chama de “Uma noite de mil anos”.
Em grande medida, essa tradição literária surgida na segunda metade do século XX faz uso do apocalipse nuclear como pano de fundo para debater temas sensíveis de cada década, como gênero, raça, ideologia política e religião.
O livro “Um Cântico para Leibowitz” toca na arrogância e no vazio gerado pelo avanço científico, que é substituído pela religião. O mesmo ocorre no livro “Um Presente na Costa”, da escritora MK Wren, que foi escrito na década de 1980, com os protagonistas salvando os livros que restaram em meio ao caos nuclear, e que também toca no tema da religião e do misticismo que imperam nas circunstâncias apocalípticas.
Da mesma forma, a famosa obra “Z de Zacarias”, de Robert O’Brien, é permeada de discussões relacionadas à igualdade de gênero. No enredo o autor criou o “Buden Valley”, um local com um microclima isolado da radiação, em meio a um mundo totalmente devastado pelo apocalipse nuclear, na forma de um enclave climático por inversão, onde o ar apenas sobe, sem descer.
De seu turno, o livro “Riddley Walker”, de Russell Hoban, foi publicado em 1980, retratando no título o nome do protagonista. É uma obra premiada, inspirada na lenda de Santo Eustáquio, que morreu queimado em um touro de bronze nas mãos dos romanos. O livro fez tanto sucesso na época que inspirou o filme Mad Max 3, lançado em 1985, contando com a atuação de Tina Turner no papel de vilã.
Já o livro “Propriedade Plena de Farnham”, lançado em 1964, no auge da guerra fria, narra a história da família Farnham, que é jogada dois mil anos no futuro através de um buraco no espaço criado pela explosão de uma bomba nuclear, tecendo um cenário “pós pós-apocalíptico”, cheio de canibalismo e escravidão.
Por fim, o livro “Esta é a Maneira Que a Terra Acaba”, de James Morrow, também se passa na guerra fria, com o enredo se baseando em previsões fictícias de Nostradamus e Leonardo da Vinci sobre o fim dos tempos causado por um apocalipse nuclear, que viria na forma de “Baleias de ferro autopropulsadas…Haverá milhares como ela, em muitas variedades…Esta lança satânica é um míssil soviético SS-60. Baseado em terra. Intercontinental. Múltiplas ogivas…Este peixe de ferro é um submarino de mísseis balísticos da frota".
Como mensagem final do livro, o autor afirma que não se pode ter dissuasão sem força, e que a força leva à escalada e à instabilidade, tocando no dilema mais impetuoso do século XX. De fato, toda a literatura que se formou em torno do fim da humanidade em decorrência da proliferação das armas nucleares em diferentes décadas teve como pano de fundo esse paradoxo explorado por James Morrow em 1986.
Além da literatura, o cinema também explorou esse dilema nuclear. O filme “O Fim ou o Princípio” começou a ser filmado já em 1945, ao término da guerra, e foi lançado dois anos depois. O filme contém cenas de enormes computadores cheios de lâmpadas piscando, mostrando o sofrimento dos pilotos dos aviões ao verem a devastação que haviam causado nas cidades japonesas, exibindo explosões que parecem saídas da boca de um vulcão em erupção.
O próprio presidente Truman escolheu o nome do filme, que foi criticado pelas cenas irrealistas, como o martírio do presidente por ter autorizado o bombardeio, bem como as baterias antiaéreas japonesas atirando contra os aviões B-29 que transportavam as bombas. Não à toa o filme foi um fiasco de bilheteria na época do lançamento.
Dois filmes mais recentes sobre as bombas no Japão concorreram em 1989: “Fat Man and Little Boy” e “Day One”. O primeiro se parece com um filme infantil, enquanto o segundo é mais realista, com diálogos que mostram os dramas e dilemas dos criadores da bomba atômica.
Muitos documentários também exploraram a temática nuclear, como “Chernobyl: o Filme - Os Segredos do Desastre”. Esse acidente causou uma explosão dez vezes maior que a bomba lançada em Hiroshima. Já “A Batalha de Chernobyl” mostra os esforços do governo para encobrir o desastre. Por fim, o polêmico “Pica Pau Russo” expõe a ideia de que o evento foi proposital, e não um acidente.
De uma maneira geral, J. Robert Oppenheimer foi bastante injustiçado por conta do projeto Manhattan, sendo retratado de forma negativa em filmes e livros. Mas foi um cientista brilhante, que deu contribuições importantes para a mecânica quântica, raramente lembradas. Ele foi pioneiro na elaboração de um modelo teórico de buraco negro. O filme “Oppenheimer” de 2023 fez justiça ao seu legado. Perdeu o Oscar de melhor filme, mas sagrou-se como o mais premiado pela academia, levando sete estatuetas.
A biografia de Oppenheimer foi intitulada American Prometheus. Na mitologia, Prometeu roubou o fogo da forja de Hefesto e entregou aos homens, simbolizando a busca por conhecimento e o salto evolutivo. Mas é preciso ficar atento ao alerta de Einstein: "Não sei com que armas a Terceira Guerra Mundial será disputada, mas a Quarta Guerra Mundial será com paus e pedras", que expressa a preocupação com as armas nucleares recém desenvolvidas.
Armas Defensivas
Nos tratados de não proliferação, as armas nucleares possuem o pomposo nome de armas estratégicas. Em geral, os tratados abrangem apenas as armas ofensivas, permitindo o emprego de armas defensivas. Contudo, o objetivo primordial é alcançar a desnuclearização integral, que compõe o núcleo duro do Direito Nuclear.
Essa medida não pode impedir o desenvolvimento de possíveis armas que desabilitem as armas nucleares, já que um dispositivo desta magnitude agiria em benefício do Direito Nuclear. Uma arma do gênero poderia ser hipoteticamente viável utilizando-se neutrinos energéticos, que varreriam todos os continentes, oceanos e atmosfera, desde as fossas marianas até o espaço suborbital, tornando o mundo livre de armas nucleares, liberando os países para “guerrearem em paz”.
Com efeito, os neutrinos são partículas fantasmas, porque não interagem com a luz nem com qualquer radiação eletromagnética. Os neutrinos estéreis não interagem com a força fraca, ao contrário dos neutrinos convencionais. Muito menos com a força forte e a força eletromagnética. Interagem apenas com a força gravitacional, e ainda assim de forma ínfima, quase imperceptível.
Quando neutrinos superenergéticos atingem um núcleo atômico, produz-se uma partícula carregada. Esse efeito pode desestabilizar o núcleo das bombas nucleares, levando-as à inativação.
Os neutrinos não têm carga elétrica e sua massa é insignificante, até mesmo em comparação aos elétrons. É a partícula mais abundante depois dos fótons. Existem três tipos de neutrinos: do elétron, do múon e do tau. Quando viajam do Sol à Terra, eles oscilam entre os três tipos, por meio do efeito quântico de superposição de três auto-estados.
A cada segundo, trilhões de neutrinos provindos do Sol atravessam a Terra. São partículas fantasmas, que não interagem. Mas equipamentos modernos instalados a quilômetros de profundidade conseguiram detectar alguns neutrinos.
Quando extremamente energéticos, os neutrinos podem espalhar os núcleos atômicos. Ao passar por núcleos de Urânio e Plutônio, neutrinos com grande potência podem teoricamente espalhar seus núcleos e desestabilizar uma bomba nuclear, evitando a reação em cadeia do material físsil.
Com efeito, uma arma com pulsos controlados de neutrinos energéticos poderia alcançar qualquer lugar da Terra, seja na atmosfera, em órbita ou no núcleo terrestre, atingindo todas as armas nucleares. Neste caso, os pulsos também atingiriam as reações em cadeia auto-sustentadas dos reatores de energia nuclear, afetando a geração de energia.
Os neutrinos são partículas bisbilhoteiras, penetrando em qualquer material. Paradoxalmente, os neutrinos são sua própria antipartícula, o que faz com que ambos tenham basicamente as mesmas propriedades quânticas. A única diferença está na helicidade, ou giro, já que neutrinos são canhotos e antineutrinos são destros.
Os antineutrinos podem ser produzidos em usinas que operam com fissão nuclear, resultando em decaimento beta negativo, formando um próton, um nêutron e um antineutrino. Na fusão, como no interior do Sol, por outro lado, ocorre decaimento beta positivo, produzindo neutrinos. Um neutrino com energia moderada pode penetrar mil anos-luz de chumbo.
Os antineutrinos já são usados para detectar o enriquecimento de Plutônio acima dos níveis de produção de energia pela Agência Internacional de Energia Atômica, com detectores que podem acusar o desenvolvimento de uma arma nuclear posicionados a centenas de quilômetros, dispensando a autorização de vistoria in loco dos técnicos da agência às instalações suspeitas.
Outra partícula que é cogitada para a mesma finalidade são os múons, que possuem massa 200 vezes maior que os elétrons. Eles estão presentes nos raios cósmicos que atingem a Terra e são capazes de penetrar na superfície até atingir minas profundas.
Os múons foram usados para mapear uma câmara oculta no interior da pirâmide de Gizé, porque são capazes de atravessá-la, como os raios X atravessam a pele. Estas partículas têm meia vida de pouco mais de um microssegundo, mas sua alta velocidade faz com que o tempo se dilate, conforme a relatividade especial, fazendo com que decaiam mais lentamente. Esse efeito faz com que a partícula se movimente a uma distância maior que a esperada.
Com efeito, a mudança de perspectiva do observador fez alguns cientistas cogitarem que os múons viajavam a velocidades maiores que a luz, gerando um paradoxo semelhante ao dos fótons.
De fato, segundo a relatividade especial, a massa aumenta conforme o aumento da velocidade. Para velocidades elevadas, é necessário mais energia para acelerar a massa, que também aumenta. Mas os fótons não possuem massa, o que fez os cientistas se questionarem como é possível que ele viaje do Sol à Terra sob as leis da relatividade.
Atualmente, sabe-se que a velocidade da luz não é um limite ou uma barreira, como a velocidade do som, mas uma condição de existência, aplicável a outros fenômenos, como as ondas gravitacionais. Logo, uma partícula sem massa, para existir, só pode viajar à velocidade da luz, formando uma imposição natural aos fótons. No caso dos múons, os experimentos mostram que eles não viajam a velocidades superluminais, e esse efeito relativo decorre da dilatação temporal da relatividade especial, facilitando sua detecção.
Mesmo que se consiga desativar as armas nucleares ofensivas, é preciso manter algumas armas ativas para pronto emprego no caso de ameaças à Terra. Com efeito, o sistema solar possui diversas aglomerações de corpos celestes, como o cinturão de asteroides, localizado entre Marte e Júpiter, e o cinturão de Kuiper, além da mais distante Nuvem de Oort. Apesar de a Terra possuir defesas naturais contra eventos de impacto, os riscos somados envolvendo asteroides, cometas e meteoros de maior porte podem chegar a até meio por cento neste século, uma probabilidade de impacto considerável, dado o estrago que podem causar. Essa previsão é suficiente para justificar a manutenção de um arsenal nuclear neutro para uso exclusivo na defesa terrestre.
Para além das armas nucleares, é possível que uma arma ofensiva utilize reações químicas com potência equivalente a uma bomba atômica. De fato, quase toda a química é baseada na troca e compartilhamento de elétrons entre os átomos, como as quatro ligações químicas. Se houver troca, a ligação é iônica. Se houver compartilhamento, a ligação é covalente. Essas transações de elétrons envolvem liberação de energia, se o estado energético for menor, ou ganho de energia, se o estado energético final foi maior.
Como exemplo, é preciso energia para quebrar as ligações entre os átomos na molécula de Hidrogênio e na molécula de Cloro, usando calor ou luz. Após a quebra dessas ligações, os elétrons estão livres para se rearranjarem em um estado energético menor, como o HCl, liberando energia.
A termodinâmica e a cinética das reações químicas são pouco conhecidas. Elas envolvem forças atômicas e nuvens de probabilidades de elétrons e núcleos, que podem algum dia ser direcionadas para a fabricação de armas de destruição em massa.
A energia química das substâncias, conhecida como entalpia, é calculada apenas por sua variação nos processos químicos, utilizando-se um calorímetro. Em termos de quantidade de energia, contudo, sua fórmula está muitas ordens de grandeza abaixo da fórmula de Einstein para a energia atômica.
A chamada energia livre de Gibbs mede o valor máximo de energia que pode ser retirado de uma reação química. A variação dessa energia depende da diferença entre as variações de entalpia e entropia, que é o grau de desordem no sistema.
Essas forças podem algum dia ser conduzidas a uma reação em cadeia que acumule energia suficiente para uma explosão similar a uma bomba nuclear modesta, na casa dos quilotons, mas sem os efeitos duradouros do decaimento radioativo.
Conclusão
O conceito de guerra total surgiu na Primeira Guerra Mundial, significando a mobilização de todos os recursos das nações beligerantes. Atualmente, é preciso novamente ponderar os alertas de cientistas renomados sobre um novo conflito mundial, como os de Einstein e Carl Sagan.
Os adeptos da teoria da paz nuclear argumentam que os países irão ponderar os benefícios estratégicos e econômicos de vencer uma guerra com as possíveis baixas em uma guerra nuclear moderna, prevalecendo o efeito dissuasório (deterrence).
Há outra corrente que entende que os valores democráticos e a dependência política e econômica entre as nações proporciona estabilidade e ordem. Essa teoria mescla o medo da destruição mutuamente assegurada com a dependência dos países na cooperação internacional.
É preciso compreender que o que beneficia o homem também pode aniquilá-lo. Pode-se recorrer a uma alegoria com o oxigênio, que tanto pode ser um gás vital, como uma toxina poderosa. Enquanto possibilita a respiração humana, também mata as células diariamente até a morte. Afinal, organismos anaeróbicos não crescem em atmosferas ricas em oxigênio. Da mesma forma, o sal é uma substância essencial à vida humana, mas quando separado em cloro e sódio, forma um veneno e um explosivo potentes.
Svalbard serve de alerta para as gerações atuais. Ela é conhecida como Cidade do Fim do Mundo, pois não há nada mais ao norte. Por isso sua base militar é única no mundo, devido à localização, sendo capaz de se comunicar com todos os satélites polares, em frações de oito e quinze minutos.
No local, o governo enterrou mais de cinco mil sementes em 2008, no interior de uma montanha bem protegida, ao fim de um corredor de cento e vinte metros, guardadas por cinco portas à prova de explosões, com o escopo de reconstruir a agricultura em um cenário de apocalipse.
Contudo, o futuro reserva o advento de armas tectônicas e sísmicas, cujo poder destrutivo provém do solo, ao lado de armas nucleares espaciais, cujo poder destrutivo provém do céu, surpreendendo as populações atingidas. E não haverá lugar seguro para perpetuar a humanidade, já que nenhum bunker, por mais fortificado e profundo que seja, escapará da destruição.
Daí a urgência de um novo tratado internacional que esteja acima das aspirações geopolíticas imediatas das potências nucleares, visando pôr fim às pretensões de nuclearização espacial.
Oficial de Justiça do TRT 7° Região.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: COELHO, LEONARDO RODRIGUES ARRUDA. FINISH! O Tratado Final de Desnuclearização Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 dez 2025, 04:42. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/coluna/3890/finish-o-tratado-final-de-desnuclearizao. Acesso em: 13 dez 2025.
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