RESUMO: O artigo "Inteligência Artificial nas Eleições 2024: Plataformas Digitais e o risco a Democracia no Brasil" debate o uso da inteligência artificial generativa em campanhas eleitorais e sua interação com as plataformas digitais. Fake news, deep fake entram como obstáculos a concretização do ideário democrático. O autor enfrenta desafios críticos e realistas levantando a possibilidade de comprometimento da democracia brasileira pelo uso abusivo das mais diversas plataformas digitais disponibilizadas aos eleitores e candidatos. É o enfretamento do pleito eleitoral nos mundos físico e virtual. A metodologia é dedutiva, com foco na legislação vigente. O estudo busca problematizar os desdobramentos da inteligência artificial na campanha eleitoral de 2024 e sua possível implicação no resultado desta, contribuindo com a discussão para a academia, para a ciência e para a sociedade. Trata-se da discussão entre a interferência das redes na conduta humana e na política do regime democrático brasileiro. Discute-se os danos, riscos da machine e sua importância para o futuro.
Palavras-chave: Inteligência Artificial Generativa; democracia; plataformas digitais;
ABSTRACT: The article "Artificial Intelligence in the 2024 Elections: Digital Platforms and the Risk to Democracy in Brazil" discusses the use of generative artificial intelligence in electoral campaigns and its interaction with digital platforms. Fake news and deep fakes are obstacles to the realization of democratic ideals. The author faces critical and realistic challenges, raising the possibility of Brazilian democracy being compromised by the abusive use of the most diverse digital platforms made available to voters and candidates. It is the confrontation of the electoral process in the physical and virtual worlds. The methodology is deductive, focusing on current legislation. The study seeks to problematize the consequences of artificial intelligence in the 2024 election campaign and its possible implications for the outcome, contributing to the discussion for academia, science and society. This is a discussion about the interference of networks in human conduct and in the politics of the Brazilian democratic regime. It discusses the damage and risks of the machine and its importance for the future.
Keywords: Generative Artificial Intelligence; democracy; digital platforms;
INTRODUÇÃO
O presente artigo denominado “Inteligência Artificial nas Eleições 2024: Plataformas Digitais e o risco a Democracia no Brasil” é uma discussão acerca do uso das plataformas digitais e sua integração com a inteligência artificial generativa na campanha eleitoral de 2024.
O artigo está estruturado em duas seções, a primeira delas denominada “A interação das plataformas digitais e a democracia no Brasil” e a segunda “Entre normas e regulamentos”.
Debater a interação das plataformas digitais, enquanto instrumento do Direito Privado, especialmente verificando sua interação com institutos do Direito Público, apontando um cruzamento que implica diretamente numa nova espécie de marketing político hibrido em que muitas vezes as ferramentas digitais ganham uma proporção estratosférica em detrimento das campanhas políticas tradicionais.
Discutir o uso da machine em campanhas eleitorais e sua implicância direta no resultado do pleito é algo fundamental para o cenário jurídico nacional principalmente quando está atrelada a preservação dos pilares e fundamentos do Estado Democrático de Direito. Questões como fake news e deep fake ganham uma nova perspectiva diante dos avanços tecnológicos mundiais.
Com propriedade o autor enfrenta esses obstáculos e desafios pondo-se na vanguarda do debate acadêmico sobre o assunto. O objetivo da presente pesquisa é levantar questionamentos sobre o uso de plataformas digitais e sua influência no campo político-eleitoral de 2024. A metodologia é dedutiva, a pesquisa é de natureza qualitativa, verificando-se a bibliografia, como foco exclusivo na Constituição da República Federativa de 1988. No tocante ao referencial teórico serão utilizados os seguintes doutrinadores: Ben Coppin,Manuel Castells, Robert Dall, Nuria López, Peter Novig e Stuart Russel.
Diante desse panorama buscaremos apresentar respostas adequadas a interação da inteligência artificial generativa, problematizando a questão do ponto de vista eleitoral. Expostos a contextualização do tema, problematização, justificativa, objetivo, metodologia passaremos a organização do desenvolvimento com a finalidade de lastrear a discussão do tema na sua própria natureza. Busca-se demonstrar a relevância do tema e a importância de discuti-lo academicamente, notadamente sob um novo enfoque, capaz de contribuir para a academia, para ciência e para sociedade.
1 A INTERAÇÃO DAS PLATAFORMAS DIGITAIS E A DEMOCRACIA NO BRASIL
A República Federativa do Brasil e a Constituição Federal de 1988 são objetos das ciências sociais aplicadas. Governo, democracia e poder são os fundamentos do Estado. A multidisciplinaridade do tema demonstra conexão com a ciência política, história, filosofia, sociologia e antropologia.
Estudar o Estado enquanto sua estrutura, seu funcionamento e sua relação com a democracia é identificar objetivamente o papel deste nas Eleições Municipais 2024.
Dentro dessa conjuntura temos por um lado o papel da sociedade enquanto agrupamento de cidadãos e sua interação com a tão moderna e afamada inteligência artificial generativa.
Por inteligência artificial entendemos a concepção de Ben Coppin (2010, p. 4) é:
Talvez um melhor ponto de partida seria perguntar ‘O que é Inteligência’. Esta é uma questão complexa, sem uma resposta bem definida, que tem intrigado biólogos, psicólogos e filósofos por séculos. No Capítulo 13 postulamos uma questão similar quando perguntamos ‘O que é vida?’ de modo a nos ajudar a entender o que é Vida Artificial, um ramo da Inteligência Artificial.
Poder-se-ia certamente definir inteligência pelas propriedades que ela exibe: uma capacidade de lidar com novas situações; a capacidade de solucionar problemas, de responder a questões, de engendrar planos e assim por diante. Talvez seja mais difícil definir a diferença entre a inteligência exibida por humanos e aquela exibida por golfinho e macacos.
Por ora nos limitaremos, então, à questão, de certa forma mais simples, que é postulada pelo título da seção: O que é Inteligência Artificial?
Uma simples definição seria como se segue:
Inteligência Artificial é o estudo dos sistemas que agem de um modo que a um observador qualquer pareceria ser inteligente.
Nessa linha são os ensinamentos de Stuart Russel e Peter Norvig (2004, p. 914):
Conforme mencionamos no Capítulo 1, os filósofos já existem há muito mais tempo que os computadores e vêm tentando resolver algumas questões que se relacionam à IA: Como as mentes funcionam? É possível que as máquinas ajam com inteligência, de modo semelhante às pessoas? Nesse caso, isso significaria que elas têm mentes? Quais são as implicações éticas de máquinas inteligentes? Durante os primeiros 25 capítulos deste livro, consideramos questões provenientes da própria IA; agora, vamos considerar em um capítulo o ponto de vista dos filósofos.
Primeiro, vejamos alguma terminologia: a asserção de que as máquinas talvez pudessem agir de maneira inteligente (ou, quem sabe, agir como se fosse inteligentes) é a chamada hipótese de IA fraca pelos filósofos, e asserção de que as máquinas que o fazem estão realmente pensando (em vez de simularem o pensamento) é a chamada hipótese de IA forte.
A maior parte dos pesquisadores de IA assume em princípio a hipótese de IA fraca, e não se preocupa com a hipótese de IA forte – desde que seu programa funcione, esses pesquisadores não se importam com a hipótese de IA forte – desde que seu programa funcione, esses pesquisadores não se importam se você o denomina simulação de inteligência ou inteligência real. Todos os pesquisadores de IA devem se preocupar com as implicações éticas de seu trabalho.
A utilização do ecossistema da web vem ganhando perspectivas nunca antes vista em processos eleitorais. Pleito a pleito o uso da machine ganha outras nuances, formas e ferramentas, alterando seu uso e seus resultados.
Notadamente temos nos perguntado se essa ferramenta tecnológica é capaz de alterar dados sobre a democracia do país, seja induzido por seres humanos ou até mesmo por autonomia própria. Grupos antidemocráticos têm utilizado a machine para hackear banco de dados e sítios eletrônicos, comprometendo a integridade do mundo digital.
Sabe-se que a inteligência artificial generativa tem que está alinhada ao respeito à moral social, a ordem pública e aos bons costumes, diante do impacto da tecnologia nas eleições.
O mundo digital tem propiciado ao eleitor uma aproximação direta com o político, por intermédio das redes sociais. Esse processo altera a distância entre o eleitor e o mandatário.
Segundo André Gualtieri e Núria López (2020, p. 148):
Desde a reeleição de Barack Obama como Presidente dos Estados Unidos, em 2012, as campanhas eleitorais passaram a utilizar o poder das redes sociais a fim de conectar os candidatos com seus eleitores. Eventos posteriores, como o Brexit e a eleição de Donald Trump, consolidaram a percepção de que as mídias sociais serão indissociáveis das eleições daqui pra frente.
Deste então, muito tem se falado no papel das redes sociais em eleições, e até em seu uso fraudulento por campanhas que teria manipulado o processo eleitoral. No entanto, é preciso ponderação para poder dimensionar corretamente o real efeito dessas tecnologias nas eleições.
A construção democrática no universo digital tem-se dado por resoluções do Tribunal Superior Eleitoral – TSE, diante da imperiosa necessidade de regulamentação da eleição digitalizada e tecnológica. As resoluções buscam em si orientar e regulamentar o uso correto da machine enquanto algo novo e punir seu uso de forma incorreta.
Devemos esclarecer diante do panorama das Eleições Municipais 2024 que grande parcela da população ainda não tem acesso a internet, é a chamada população “offline”.
Questões ligada à sociedade digital como a censura, redução das fakenews, cerceamento da liberdade, votação, apuração ganham outra dimensão quando pergunta-se se a tecnologia é auditável? Ela é uma forma segura de conduzir o processo eleitoral? Acelerar esse debate é medida que se impõe.
Questionar a credibilidade e confiabilidade do sistema de votação diante do papel da tecnologia na nossa democracia é algo palpável, por mais que a Justiça Eleitoral afirme que o sistema é perfeito e sem falhas.
Nessa linha são as lições de André Gualtieri e Núria López (2020, p. 149):
No Brasil, o marco do uso das redes sociais nas eleições foi a campanha que elegeu Jair Bolsonaro como Presidente, que utilizou quase que exclusivamente as mídias sociais, em vez dos métodos tradicionais de fazer política, preferidos por seus concorrentes. Bolsonaro foi eleito com apenas 8 segundos de programa eleitoral na televisão durante a campanha (BRASIL, 2018) e tendo gastado cerca de R$ 2.500.000 em sua campanha, enquanto Haddad teve 2 minutos e 30 segundos e gastou cerca de R$ 37.000,000, segundo dados oficiais (BRASIL, 2018,b).
Com o uso das redes sociais, Bolsonaro, um candidato sem máquina partidária, conseguiu alcançar os mais diferentes grupos da sociedade brasileira e foi escolhido por uma população desiludida com as instituições e que queria uma mudança social significativa. O resultado inesperado surpreendeu a quase totalidade dos analistas. Desde então, muito se escreveu e se especulo sobre as razões que teriam levado ao resultado da última eleição presidencial brasileira. Mas uma coisa é certa: a importância das tecnologias de informação e comunicação nos processos políticos democráticos veio para ficar.
A realidade é que nas Eleições 2018 o sistema da Justiça Eleitoral teve mais de 5.000 (cinco mil) tentativas de invasão por segundo, contudo sem nenhum êxito.
Outro ponto que merece relevância e uma discussão aprofundada são as plataformas digitais como Facebook, Instagram, Youtube, Whattsapp, Kwid, Tiktok, Spotify, entre outros. Costumeiramente essas plataformas estão sendo utilizada como mecanismos de fomento a desinformação, a criminalidade online e ataques a democracia.
A importância das mídias digitais é indiscutível enquanto gerou novos modelos de campanhas políticas, inclusive exclusivamente virtuais permeadas pela criatividade e inovação.
Nessa esteira são as preleções de André Gualtieri e Núria López (2020, p. 155):
Essa nova campanha eleitoral tecnológica, baseada na segmentação, gera problemas ético-políticos e jurídicos. Questões sobre privacidade e proteção de dados pessoais, haja vista que as pessoas que são alvo das mensagens personalizadas não sabem que suas informações foram tratadas e que elas foram classificadas em determinadas categorias.
Para além delas, existem ainda questões fundamentais do desenvolvimento democráticos, pois as discussões a respeito do bem comum de uma sociedade e de projetos que envolvam toda a nação ficam comprometidas na medida em que os cidadãos são levados a reagir a questões e preocupações de âmbito restrito [...]
As plataformas digitais, enquanto empresas privadas passaram a ser espaços públicos por onde trafegam informações, ideias e notícias; ainda propiciando a transparência da propaganda política eleitoral.
A proteção pela democracia no Brasil ganha exponencial importância no que tange a integridade das informações oficiais, combatendo o uso de informações falsas no pleito.
Nesse liame leciona Manuel Castells (2003, p.11):
Não é abstrato, não são elucubrações constitucionais, é o que passa na mente das pessoas. [...] Políticos viram-se expostos como corruptos e mentirosos. Governos foram denunciados. A mídia se tornou suspeita. A confiança desvaneceu-se. E a confiança é o que aglutina a sociedade, o mercado e as instituições. Sem confiança nada funciona. Sem confiança o contrato social se dissolve e as pessoas desaparecem, ao se transformarem em indivíduos defensivos lutando pela sobrevivência.
As plataformas digitais têm realizado ações de capacitação, programas de compliance e tem colaborado diretamente com o Governo.
A Justiça Eleitoral tem afirmado por intermédio do marketing que as eleições são limpas e seguras diante dos inúmeros ataques a nossa democracia. Deve-se mencionar a importância da atuação do Ministério Público Eleitoral por seus promotores e procuradores regionais.
O mundo digital é uma realidade sem volta e interfere diretamente no ambiente eleitoral seja pela propaganda, ou pelo abuso de poder. Fica para trás a propaganda tradicional escrita, de rádio e TV.
Ocorre que a violência, o discurso de ódio, o populismo digital (neopopulismo) e a desinformação ganha uma dimensão nunca antes visto na história e diante dessa realidade as resoluções do Tribunal Superior Eleitoral insurgem-se buscando manter a lisura das eleições num ambiente seguro, transparente e honesto.
Novos desafios podem ser identificados com o enfrentamento dessa realidade, explicitamente no tocante a abertura de canais para a democracia direta e com a preservação dos valores éticos, morais e legais. É a efetivação da ideia de cidadania requalificada no conceito de soberania.
Nessa linha são os ensinamentos de André Gualtieri e Núria López (2020, p. 158):
É nesse sentido que se pode afirmar que a tecnologia de filtragem compromete a saúde da democracia, pois cria separação, polarização, dificultando o diálogo necessário para o pleno funcionamento do regime democrático. Quando se pensa na nação entre novas tecnologias e eleições, quase sempre se enfatiza o problema das chamadas fake news, que degradam a qualidade da democracia, espalhando informações falsas com os objetivos de manipular os eleitores num ou noutro sentido. No entanto, tem passado despercebido pela maior parte dos autores a relevância que o fenômeno das echo chambers enquanto estrutura algorítmica tem para as eleições. Com efeito, pensamos que aí está um ponto central a ser abordado: os algoritmos que permitem o funcionamento das redes sociais realizam processos de filtragem, que ameaçam a razão pública – nos termos de Rawls – ou a esfera pública – nos termos de Habermas, do ambiente democrático. Isso porque as câmaras de eco minam a possibilidade do diálogo entre diferentes pontos de vista, que é uma condição necessária para o bom funcionamento da democracia.
O impacto do mundo digital nas eleições com a difusão e o engajamento das pessoas tem sido instrumento de manutenção da democracia, combatendo a desigualdade entre os candidatos.
Corrobora com esse entendimento Roberth Dahl (2012, p. 175):
Apesar de tudo, não creio que os cidadãos sejam tão bem qualificados quanto poderiam ser. Eles cometem enganos quanto aos meios para os fins desejados; também escolhem fins que rejeitariam se fossem esclarecidos. Concordo, portanto, que eles devem governar a si próprios mediante procedimentos satisfatórios de acordo com os critérios de um processo democrático, estritamente definido. Entretanto, vários procedimentos diferentes poderiam satisfazer os critérios igualmente bem; entre estes, porém, alguns têm maior probabilidade de levar a um demos mais esclarecido – e, por conseguinte, a melhores decisões – que outros. Certamente estes são procedimentos melhores e devem ser escolhidos, em vez de outros.
Essa percepção está ligada a ideia de liberalismo política seja pela participação e soberania popular, tão quanto a atuação dos partidos políticos na democracia da modernidade. Nesse sentido combatem a ideia de que o modelo político-democrático encontra-se em crise do sistema representativo e em crise econômica.
Esclarece Roberth Dahl (2012, p. 496):
O processo democrático não existe, e nem pode existir, como uma entidade descorporificada, à parte das condições historicamente condicionados. Suas possibilidades e seus limites dependem imensamente das estruturas e consciências sociais atuais e emergentes. Entretanto, porque a visão democrática é tão ousada em sua promessa, ela nos convida perpetuamente a olhar para além dos limites existentes nas estruturas e na consciência e a romper esses limites. A primeira transformação democrática rompeu os limites do tradicional governo de poucos, na forma da monarquia, da aristocracia, da oligarquia ou da tirania, e criou novas estruturas e crenças que sustentaram o governo de muitos nas cidades-estados democráticas ou republicanas. Dois milênios depois, a segunda transformação democrática rompeu os limites de todas as estruturas e crenças anteriores ao aplicar deliberadamente a ideia de democracia à esfera maior do Estado Nacional.
O uso da machine tem como prioridade o ganho e acesso aos recursos econômicos e a informação, sendo denominado como uma nova forma de ativismo partidário, assim denominado ativismo partidário digital.
A televisão perde o espaço para a internet. Os recursos econômicos são manipulados no conforto de um computador. Ocorre o aumento exponencial dos gastos com material digital levando um alerta as autoridades eleitorais. Até onde estão estabelecidos os limites da Inteligência Artificial?
Segundo Stuart Russel e Peter Norvig (2004, p. 930):
O sucesso da IA poderia significar o fim da raça humana. Quase toda tecnologia tem potencial para causar danos em mãos erradas; porém, no caso da IA e da robótica, temos um novo problema, pois as mãos erradas podem pertencer à própria tecnologia. Incontáveis histórias de ficção científica advertiram sobre robôs ou ciborgues (robôs humanos) que causam devastação. Exemplos antigos incluem o livro de Mary Shelley, Frankenstein, or the Modern Prometheus (1818), a peça de Karel Capek, R.U.R (1921), em que os robôs conquistam o mundo. No cinema, temos The Terminator (1984), que combina os clichês de robôs que conquistam o mundo com a viagem no tempo, e Matriz(1999), que combina robôs que constaram o mundo com cérebro em cuba.
De fato, que a mentira na política sempre existiu era apenas mais difícil difundi-la, as plataformas digitais permitiram que vertiginosamente elas ganhassem uma notoriedade ímpar. Como controlar a má-fé, a impostura e a inverdade? Os crimes contra a honra, especialmente a injúria, a calúnia e a difamação, crescem no ambiente eleitoral minando a hombridade do certame.
Nessa linha são os riscos da desinformação e do ataque desenfreado as entidades estatais e a sociedade, comprometendo a integridade do processo eleitoral. Trata-se da massificação do contra conhecimento.
2 ENTRE NORMAS E REGULAMENTOS
As Eleições Municipais 2024 serão reguladas por 12 (doze) normas aprovadas pelo Tribunal Superior Eleitoral, as quais foram publicadas no dia 1 de março de 2024. Os instrumentos normativos estabelecem as regras do jogo para o pleito que se avizinha no dia 6 de outubro de 2024.
Foram alteradas algumas normas bases utilizadas em pleitos anteriores para atualização da matéria. As resoluções são o desdobramento do estabelecido na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e não invadem a seara criação de normas jurídicas (ato de legislar) função típica do Poder Legislativo.
A Resolução n. 23.600, de 12 de dezembro de 2019 dispõe sobre as pesquisas eleitorais e disciplina os procedimentos relativos ao registro e à divulgação de pesquisas de opinião pública, realizadas para conhecimento público, relativas às eleições ou às candidatas e aos candidatos.
A Resolução n. 23.605, de 17 de dezembro de 2019 que estabelece diretrizes gerais para a gestão e distribuição dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha.
A Resolução n. 23.607, de 17 de dezembro de 2019 dispõe sobre a arrecadação e os gastos de recursos por partidos políticos e candidatas ou candidatos e sobre a prestação de contas nas eleições.
A Resolução n. 23.608, de 18 de dezembro de 2019 a qual dispõe sobre representações, reclamações e pedidos de direito de resposta previstos na Lei nº 9.504/1997 para as eleições.
A Resolução n. 23.609, de 18 de dezembro de 2019 que dispõe sobre a escolha e o registro de candidatas e candidatos para as eleições.
A Resolução n. 23.610, de 18 de dezembro de 2019 que dispõe sobre a propaganda eleitoral e estabelece seu início a partir do dia 16 de agosto de 2024.
A Resolução n. 23.673, de 14 de dezembro de 2021 que dispõe sobre os procedimentos de fiscalização e auditoria do sistema eletrônico de votação.
A Resolução n. 23.677, de 16 de dezembro de 2021 a qual dispõe sobre os sistemas eleitorais majoritário e proporcional, a destinação dos votos na totalização, a proclamação dos resultados, a diplomação e as ações decorrentes do processo eleitoral nas eleições gerais e municipais.
A Resolução n. 23.735, de 27 de fevereiro de 2024 que dispõe sobre ilícitos eleitorais notadamente em relação a abuso de poder, fraude, corrupção, arrecadação e gasto ilícito de recursos de campanha, captação ilícita de sufrágio e aponta as condutas vedadas aos agentes públicos em campanha com a finalidade de combater e controlar a desinformação.
A Resolução n. 23.736, de 27 de fevereiro de 2024 que dispõe sobre os atos gerais do processo eleitoral para as eleições municipais de 2024 como os atos preparatórios, o fluxo de votação, a apuração, os procedimentos relacionados à totalização, a diplomação e os procedimentos posteriores ao pleito relativos às eleições municipais de 2024.
A Resolução n. 23.737, de 27 de fevereiro de 2024 a qual dispõe sobre o cronograma operacional do Cadastro Eleitoral para as Eleições 2024.
Finalmente a Resolução n. 23.737, de 27 de fevereiro de 2024 que estabelece o Calendário Eleitoral das Eleições 2024.
O processo eleitoral agora é visto no âmbito das fakenews e da desinformação, diante de uma interação entre eleitor, candidato e máquina nunca antes pensada. Essas novas tecnologias, especialmente as plataformas digitais, têm proporcionado uma revolução nos moldes tradicionais das disputas eleitorais.
A arquitetura da inteligência artificial passa a ser preponderante na condução e no resultado das eleições.
Nesse sentido legisla o Congresso Nacional por iniciativa do Senador Rodrigo Pacheco (PSD/MG), Projeto de Lei n. 2338, de 2023, apresentado em 3 de maio de 2023. Referido projeto busca disciplinar e estabelecer normas gerais de caráter nacional para o desenvolvimento, implementação e uso responsável de sistemas de inteligência artificial (IA) no Brasil, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais e garantir a implementação de sistemas seguros e confiáveis, em benefício da pessoa humana, do regime democrático e do desenvolvimento científico e tecnológico.
O artigo 4º do Projeto de Lei n. 2338/2023 (2024, online) apresenta a definição legal de sistema de inteligência artificial, a saber:
Art. 4º Para as finalidades desta Lei, adotam-se as seguintes definições: I – sistema de inteligência artificial: sistema computacional, com graus diferentes de autonomia, desenhado para inferir como atingir um dado conjunto de objetivos, utilizando abordagens baseadas em aprendizagem de máquina e/ou lógica e representação do conhecimento, por meio de dados de entrada provenientes de máquinas ou humanos, com o objetivo de produzir previsões, recomendações ou decisões que possam influenciar o ambiente virtual ou real;
O texto é divido em nove capítulos e ainda conceitua: o fornecedor de sistema de inteligência artificial, operador de sistema de inteligência artificial, agentes de inteligência artificial, autoridade competente, discriminação, discriminação indireta e mineração de textos e dados.
O projeto ainda cria a Estratégia Brasileira de Inteligência Artificial e tem por justificativa o impacto que a inteligência artificial provocará num futuro próximo, especialmente no tocante as mudanças sociais e econômicas. A Consultoria Legislativa do Senado Federal levou em consideração estudos sobre a regulamentação da inteligência artificial em mais de trinta países componentes da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), objetivando salvaguardar a pessoa natural diante do impacto da inteligência artificial, ou seja da relação entre humano e máquina. Trata-se da necessidade de tolher prejuízos aos titulares de direitos.
Como dito anteriormente o projeto de lei foi autuado no dia 3 de maio de 2024. No dia 16 de agosto de 2024 a matéria vai ao exame da Comissão Temporária sobre Inteligência Artificial no Brasil, tendo como Relator o Senador Eduardo Gomes (PODEMOS/AL). No mês de outubro de 2023 são realizadas uma série de audiências públicas para discutir a matéria.
O projeto continua em tramitação e até a presente data recebeu mais de 103 (cento e três) emendas. Depois da aprovação no Senado Federal o projeto de lei deverá ser encaminhado para casa revisora (Câmara dos Deputados) e para a sanção da Presidência da República.
Finalmente discutir fake news, deep fake e o uso da inteligência artificial nas Eleições Municipais 2024 põem-se no momento como algo extremamente necessário uma vez que se avizinha o pleito de 6 de outubro de 2024.
Trata-se da oportunidade do povo brasileiro manifestar sua soberania diante na possível manipulação pelas plataformas digitais. Trata-se da luta incansável da democracia brasileira em por no seu centro o cidadão enquanto detentor originário do poder. Trata-se da busca incansável pela mudança da realidade brasileira. O constitucionalismo brasileiro assegura isso.
A Teoria da Democracia é antagônica uma vez que o governo do povo, pelo povo e para o povo não consegue ou tem sérias dificuldades para cumprir efetivamente com o texto constitucional. Não se trata de uma escolha forçada e sim da imposição dos fundamentos e pilares do Estado Democrático de Direito.
Acerca da Teoria da Democracia discute John Keane (2010, p. 787):
[...] reconhecer que a tarefa de entender o passado, o presente e o futuro da democracia é, por definição, uma jornada interminável, uma odisséia permanente sujeita a revisões produzidas por novas evidencia, eventos inesperados, interpretações diferentes e modo diferentes de fazer história alegados por pessoas com novas idéias sobre democracia.
Complementa Simone Goyard-Fabre (2003, p. 348):
[…] As democracias, para governar, devem refletir pensar, prever, mas também escutar o povo, adaptar-se as suas exigências, escolher entre suas reivindicações. Antigas ou modernas, elas repousam sobre o mesmo princípio antropológico intangível que constitui ao mesmo tempo sua força e sua fragilidade, sua grandeza e sua mediocridade e que explica tanto as esperanças que elas fazem nascer como as desilusões que engendram. Sob a ambivalência que as caracteriza, o humanismo em que se inspiram todas as democracias implica a imperfeição.
Segregar boa parte ou fração da população brasileira a margem da sociedade é demonstrar que o sistema constitucional é falho ou não atinge seus objetivos legais. A resposta que paira essa discussão é sempre a necessidade de mais tempo para concretude material da democracia. Para onde caminha o regime político ideal?
A internet acabou com a supremacia do rádio e da televisão no fornecimento de informações a sociedade brasileira. O número de dados que o cidadão passou assimilar cresceu vertiginosamente. Diante dessa realidade também veio à dificuldade de filtrá-los e identificar o que é verdade ou mentira; e o que está sendo utilizado para manipular o povo. As informações além de serem exponenciais, são instantâneas, podendo causar danos de caráter irremediáveis a lisura do processo eleitoral.
Nessa esteira leciona Manuel Castells (2003, p.12):
Não foram apenas a pobreza, a crise econômica ou a falta de democracia que causaram essa rebelião multifacetada. Evidentemente, todas essas dolorosas manifestações de uma sociedade injusta e de uma comunidade política não democrática estavam presentes nos protestos. Mas foi basicamente a humilhação provocada pelo cinismo e pela arrogância das pessoas no poder, seja ele financeiro, político ou cultural, que uniu aqueles que transformaram medo em indignação, e indignação em esperança de uma humanidade melhor.
A rebelião, ou melhor, a revolução é feita com armas. E na democracia a arma é o título de eleitor. Conjecturar sobre o futuro da Inteligência Artificial é especular no incerto. A tecnologia pode e dever ser utilizada com a finalidade de manter a lisura do pleito e não o contrário. Longe de nós queremos acreditar que será permitido o uso da machine para corromper e comprometer o certame. O Estado tem buscado regular e delimitar o uso desta ferramenta em prol de um uso sério e consciente.
Ocorre que como sempre visto na história o uso da tecnologia pode cair em mãos erradas e ganhar novas feições diferentemente da utilizada nas eleições anteriores. A perspectiva de seu uso nesse pleito é totalmente divergente do já acontecido. A machine tem servido com eficiência e rapidez o eleitor e os candidatos apresentando um paradigma a ser enfrentado pelos políticos na construção de um Brasil melhor.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
É do pleito eleitoral que decorrem nossos governantes. A transparência e a lisura das eleições devem ser mantidas a qualquer custo. O Brasil do coronelismo, do clientelismo e da corrupção generalizada resta ultrapassado e esquecido no passado.
O Brasil atual é o que assegura a soberania do povo pelos fundamentos da democracia representativa e dos mecanismos de participação da democracia direta.
A Inteligência Artificial tem evoluído assustadoramente e ganhando espaço estratosfericamente no mundo. Delimitar seu uso como regulamentá-la é algo imperioso e inevitável.
A forma como os computadores se relaciona com os seres humanos ganharão uma perspectiva impensada, muitos mais além do que foi especulado ao longo da história em obras de ficção científica. Notadamente verifica-se que estamos caminhando para o chamado transumanismo onde não haverá mais distância entre seres humanos e computadores, esse é um movimento social já previsto no passado para o nosso futuro. O desafio para a sociedade será discutir questões éticas, morais e regular os direito civis dos robôs.
REFERÊNCIAS
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Advogado, Membro da Comissão Especial de Estudo para o Porte de Armas dos Advogados da OAB/CE, Membro da Comissão de Acompanhamento de Licitações e Contratos da OAB/CE, Ex assessor parlamentar junto a Assembleia Legislativa do Estado do Ceará, Ex docente do ensino superior, Pesquisador e Bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Tecnológico – CNPq (2007), Especialista em Processo Penal pela Universidade de Fortaleza, Mestrando em Direito pelo Centro Universitário 7 de Setembro
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: OLIVEIRA, Luis Augusto Correia Lima de. Inteligência Artificial nas Eleições 2024: Plataformas Digitais e o risco a Democracia no Brasil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 nov 2025, 04:46. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/69885/inteligncia-artificial-nas-eleies-2024-plataformas-digitais-e-o-risco-a-democracia-no-brasil. Acesso em: 18 nov 2025.
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