RESUMO: O presente artigo tem como objetivo apresentar de forma sucinta a questão da dissolução da sociedade limitada , focando-se nas inovações trazidas pelo Código Civil de 2002. Ao contrário de esgotar o tema , esse pequeno estudo visa apresentar alguns pontos controvertidos que envolvem a matéria , não se aprofundando em nenhum deles, porém dando caminhos a serem observados nas questões práticas do dia a dia. Desta feita, estamos diante de um texto mais pragmático do que essencialmente teórico , razão pela qual é objetivo e livre no que tange às regras técnicas dos textos jurídicos. A análise abrange as definições da sociedade limitada, suas formas de constituição, as modalidades de dissolução total e parcial, e aprofunda-se na complexa e controversa questão da apuração de haveres do sócio retirante.
Palavra-chave: Sociedade Limitada, Dissolução Parcial, Apuração de Haveres, Direito Empresarial.
ABSTRACT: This article aims to present briefly the question of the dissolution of the limited liability company , the innovations brought forward by the Civil Code of 2002. Unlike exhaust the subject , this small study aims to present some controversial matter involving , not delving into any of them, but giving paths to be followed in practical day to day. This time, we face a more pragmatic text that essentially theoretical , reason why free and objective regarding the technical rules of legal texts.
Key-Words: Limited Partnership, Partial Dissolution, Verification of Assets, Business Law.
A Sociedade Limitada é uma sociedade contratual de caráter plurilateral , uma vez que sua finalidade é regular o interesse de diversos agentes, os sócios, com uma finalidade única, que é o objeto social. Este tipo contratual não apresenta todos os elementos constantes nos contratos de forma geral. A título de exemplo, a alteração de cláusulas, que nos contratos "lato sensu" depende da anuência de todos, na sociedade limitada isso não é verdadeiro, sendo possível a alteração desde que obedecido determinado quórum de aprovação. Embora alguns autores adotem teorias anticontratualistas , a melhor compreensão foi apresentada por Tullio Ascarelli, ao afirmar que a sociedade limitada é constituída por um contrato com características próprias, plurilateral, onde os interesses antagônicos dos contratantes são coordenados pelo escopo comum. Como o próprio nome indica, a responsabilidade dos sócios é limitada , conforme o artigo 1.052 do Código Civil. A responsabilidade de cada sócio é restrita ao valor de suas quotas , mas todos respondem solidariamente pela integralização do capital social. Enquanto não integralizada a totalidade do capital por todos, os sócios são solidariamente responsáveis pelo valor faltante. É importante diferenciar o capital social subscrito, que é aquele que os sócios se comprometeram a formar , da integralização, que ocorre quando o valor é efetivado pelo sócio, seja por dinheiro, crédito ou bem. Importante notar que, nas sociedades limitadas, não é possível a subscrição e integralização do capital social com serviços, conforme veda o parágrafo segundo do artigo 1.055 do Código Civil. Para sua constituição, é necessária a elaboração de um contrato social , que deve ser necessariamente escrito e contar com no mínimo dois sócios, respeitando a pluralidade. O Código Civil, contudo, autoriza a existência de uma sociedade limitada unipessoal temporária, por um prazo máximo de 180 dias após sua constituição. Uma vez elaborado, o contrato deve ser levado a registro no Órgão de Registro Público de Empresas Mercantis, a cargo das Juntas Comerciais , no prazo máximo de 30 dias. O registro dentro do prazo gera efeitos desde a data da constituição; fora do prazo, somente a partir da concessão. Com a inscrição do ato constitutivo, a sociedade passa a ter personalidade jurídica própria, distinta da personalidade de seus sócios. Essa personalidade jurídica gera três consequências principais: a titularidade negocial, permitindo à sociedade realizar negócios jurídicos em seu próprio nome ; a titularidade processual, dando à pessoa jurídica a capacidade de demandar e ser demandada em juízo ; e a titularidade patrimonial, pela qual a sociedade terá patrimônio próprio, incomunicável com o dos sócios, respondendo com ele por suas obrigações.
2.A DISSOLUÇÃO PARCIAL
A possibilidade de dissolução da sociedade limitada tem sido objeto de estudo por muito tempo, sem que haja unanimidade entre os autores. A dissolução pode ser classificada, primeiramente, como total ou parcial. Estaremos diante de uma dissolução total quando o objetivo for pôr fim à sociedade, procedendo-se à sua liquidação e extinção. O Código Civil de 2002 elenca diversas hipóteses de dissolução total. Uma delas é o decurso do prazo de duração, previsto no artigo 1.033, inciso I. Se a sociedade for constituída por prazo determinado, ao término deste, ela deverá ser dissolvida ; contudo, o mesmo inciso estabelece que, se vencido o prazo e não havendo oposição de sócio, a sociedade poderá ser prorrogada por prazo indeterminado. Outra causa é a vontade dos sócios, seja pelo consenso unânime (inciso II) ou por deliberação dos sócios que representem a maioria absoluta, quando o contrato for por prazo indeterminado (inciso III). A dissolução total também ocorre pela ausência de pluralidade de sócios, caso a sociedade permaneça unipessoal por mais de 180 dias, exceto se o sócio remanescente requerer a transformação do registro para empresário individual. Pode-se requerer judicialmente a dissolução quando verificada a inexequibilidade do objeto social, nos termos do artigo 1.034, inciso II. O contrato social também pode prever outras causas de dissolução, as quais, se contestadas, deverão ser verificadas judicialmente. Por fim, a falência é seguramente uma forma de dissolução total da sociedade limitada empresária, como determina o artigo 1.044 do Código Civil.
Distinta do total, a dissolução parcial é uma criação da doutrina e da jurisprudência, tendo como objetivo principal a preservação da empresa. Ela significa que a dissolução se operará apenas em face ao sócio que não mais fará parte da sociedade, mas sem pôr fim a esta última. O Código Comercial anterior nada previa sobre esse tipo, apenas sobre a dissolução total, o que acabava por militar contra a vida da sociedade quando os demais sócios tinham interesse na sua manutenção. A doutrina, então, caminhou no sentido de preservar a empresa. A teoria da preservação da empresa contrapõe os interesses individuais do sócio à função social que a empresa exerce, considerando outros interesses relevantes, como a preservação de empregos, a arrecadação de impostos e os interesses dos consumidores. O Código Civil de 2002 inovou ao disciplinar algumas hipóteses de dissolução parcial, tratando-as sob o tema "Resolução da Sociedade em Relação a um Sócio", nos artigos 1.028 a 1.032 e 1.085 a 1.086. O próprio termo "dissolução parcial" foi objeto de críticas, pois se afirmava que, sendo dissolução, não poderia ser parcial, e se parcial, não era dissolução.
A dissolução também pode ser classificada como extrajudicial ou judicial. A dissolução extrajudicial total ocorre quando todos os sócios, de comum acordo, resolvem pôr fim à sociedade por meio de um distrato social. A dissolução extrajudicial parcial opera-se pela saída de um sócio, feita por meio de uma alteração contratual; na prática, porém, é mais comum que a saída ocorra por meio de cessão das quotas aos demais sócios, procedendo-se a uma mera redistribuição das quotas entre os remanescentes. Já a dissolução judicial pode ser total, quando há litígio sobre uma causa de extinção, como a impossibilidade de atingir o objeto social, ou parcial, quando um ou mais sócios saem da sociedade em decorrência de uma sentença judicial, mantendo-se a sociedade com os sócios remanescentes.
Quando ocorre a dissolução parcial, judicial ou extrajudicial, o passo seguinte é a apuração de haveres, que importa na constituição de crédito, em favor do sócio desligado (retirante) ou de seu sucessor, perante a sociedade. O critério para essa apuração depende fundamentalmente do motivo que levou à dissolução. No caso específico de expulsão de sócio remisso, o crédito será apenas as entradas que tiver realizado, descontadas a indenização devida à pessoa jurídica, não tendo o remisso direito à participação na sociedade. Nas demais hipóteses, o crédito denomina-se reembolso e tem por base o valor patrimonial da participação societária, se o contrato social não estabelecer outro critério, conforme o artigo 1.031. É neste ponto que reside uma infindável controvérsia. Em face dos interesses antagônicos, o sócio retirante sempre desejará valorizar suas quotas, enquanto os sócios remanescentes desejarão reduzir ao máximo o valor de reembolso. A discussão decorre dos bens que compõem o patrimônio e do critério de avaliação, que pode ser o valor real ou patrimonial, e se deve incluir bens imateriais como marcas, patentes, know-how, clientela e o fundo de comércio.
A regra geral, mas que deve ser vista com cautela, é aquela que na apuração de haveres o sócio não pode receber valor diverso do que receberia, como partilha, na dissolução total. A apuração de haveres seria, portanto, uma simulação de uma dissolução total, para mero efeito de realizar o pagamento da parte do retirante. O ativo seria avaliado a valor presente de venda, como se a sociedade estivesse fechando as suas portas. Este critério merece críticas, pois trabalha com uma situação irreal. Não é possível querer avaliar uma sociedade que está em pleno funcionamento como se estivesse sendo liquidada, pois o valor de uma sociedade que gera riquezas e está ativa no mercado é bem diferente daquela que está vendendo seu patrimônio. Imaginando uma sociedade no ramo de restaurantes, seu ativo (mesas, cadeiras, fogão, etc.), se avaliado pelo critério de dissolução total a preço de venda de mercado de usados, teria um valor completamente diferente do que se fosse considerado o restaurante em pleno funcionamento. É inegável que a empresa possui um valor de mercado deveras superior ao que se consegue obter numa simples análise contábil como se dissolução total fosse. Como mencionado por Alfredo Rocco, a partir do momento em que "a organização dos vários elementos da produção atinge um certo grau de eficiência, o valor do complexo organizado é superior ao da soma dos diferentes elementos que o compõem".
Por tais motivos, a apuração deve ser sempre da forma mais ampla possível, levando em conta o fundo de comércio, os bens corpóreos e incorpóreos, e o goodwill da empresa. É necessário que o aplicador da Lei volte os olhos para outros critérios de avaliação que representem o valor real e justo da sociedade, como o critério de avaliação de empresa com base no Fluxo de Caixa Descontado (FCD) trazido a valor presente. Este critério é tido como aquele que melhor revela a efetiva capacidade de geração de riqueza e é considerado uma tecnologia científica contábil. O FCD atende à regra legal, tendo em vista que a Resolução nº 1.121/08 do Conselho Federal de Contabilidade (CFC) estabelece que podem ser utilizados modelos que permitam demonstrar a realidade econômica e financeira da empresa. A mesma Resolução do CFC determina que o ativo da empresa deve ser reconhecido pelo valor que possui de geração de benefícios futuros (fluxo de caixa). O Fluxo de Caixa pode ser utilizado para a apuração dos haveres, pois aponta o valor da empresa da forma mais justa possível, permitindo ao perito buscar um valor econômico justo e evidenciar o goodwill não adquirido.
O valor apurado tomará por base a situação patrimonial da sociedade no momento em que se deu a dissolução, nos termos do caput do artigo 1.031 do Código Civil. Em uma dissolução judicial parcial, que pode demorar anos, o momento correto para a apuração não é o da sentença, que apenas declara a dissolução, mas sim o momento em que ocorreu a ruptura fática do sócio em relação à sociedade, ou seja, quando o sócio manifestou vontade de se retirar. A sentença, nesse caso, gera efeitos ex tunc. Quanto ao prazo para o pagamento, o parágrafo 2º do artigo 1.031 determina que a quota liquidada será paga em dinheiro, no prazo de 90 dias a partir da liquidação, salvo acordo ou estipulação contratual em contrário. O objetivo desse prazo é não impor à sociedade uma descapitalização abrupta. Contudo, a jurisprudência tem entendido que se o prazo da demanda judicial for superior ao prazo estabelecido no contrato para o pagamento (ex: 12 parcelas), o pagamento deve ser exigível de imediato, em uma única vez. Cláusulas contratuais vagas, como "será pago na medida do possível" ou "dentro das possibilidades da sociedade", têm como única finalidade dificultar o recebimento pelo sócio retirante, sendo consideradas abusivas e, portanto, devem ser afastadas, impondo-se o pagamento nos termos do Código Civil.
Por fim, alguns aspectos processuais da dissolução parcial judicial merecem menção. A matéria processual continua disciplinada pelo Código de Processo Civil de 1939 (Decreto-Lei nº 1.608/39), em seus artigos 655 a 674, que permanecem em vigor por força do artigo 1.218, inciso VII, do CPC de 1973. O juízo competente para processar questões envolvendo mais de um réu de diferentes domicílios poderá ser no foro de qualquer deles, seja a sede da sociedade ou o domicílio de qualquer um dos sócios, ficando a opção a critério do Autor da demanda. Possuem legitimidade ativa para ingressar com a ação qualquer um dos sócios. A legitimidade passiva deve ser frente à Sociedade e aos demais Sócios, em litisconsórcio passivo necessário, já que todos serão diretamente afetados pela dissolução parcial, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça. O pedido da ação poderá ser de dissolução total com pedido alternativo de dissolução parcial, ou apenas de dissolução parcial combinado com apuração de haveres. O valor da causa deve corresponder ao valor da apuração dos haveres, mas, como esse valor dependerá de determinação judicial, no momento da propositura ele será meramente estimativo. Quanto ao prazo de contestação, existem dois entendimentos: o primeiro é de que o prazo é de 05 (cinco) dias, nos termos do artigo 656 do Código de Ritos de 1939; o segundo afirma ser de 15 (quinze) dias, pois o rito da ação de dissolução é ordinário.
3.CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante de todo o exposto, esperamos ter contribuído com o estudo relativo à sociedade limitada, em especial à questão dos critérios para a apuração dos haveres do sócio retirante. A preocupação central, frente ao caso concreto, deve ser a de não causar um verdadeiro enriquecimento injusto a nenhum dos sócios, seja o retirante ou o remanescente. Como enfatizado por Martins, o valor de uma empresa depende primordialmente dos benefícios líquidos que se poderá extrair no presente e no futuro. Ninguém venderia uma empresa em funcionamento por menos do que obteria se a fechasse; e ninguém cerraria as portas de uma empresa se ela pudesse ser vendida por valor melhor em pleno funcionamento. Logo, o valor econômico de uma empresa é dado pelo maior dos montantes alcançados nessas duas alternativas: em liquidação ou em marcha. Conclui-se, assim, que na avaliação da empresa para a apuração dos haveres deve sempre se buscar o valor justo, utilizando-se para tanto o critério que mais se aproxime da real situação da sociedade, aplicando-se o critério que melhor avaliar a sociedade, seja o de dissolução total ou o de fluxo de caixa.
graduando em Direito. Assistente jurídico .
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SAMPAIO, GABRIEL CANNIZZA PELLON. Sociedade limitada: causas de dissolução parcial e apuração de haveres Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 nov 2025, 04:24. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/69880/sociedade-limitada-causas-de-dissoluo-parcial-e-apurao-de-haveres. Acesso em: 13 nov 2025.
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